quinta-feira, 7 de maio de 2020

Uma prece na pandemia

Se não quiser rezar a oração inteira, eleve à Virgem um pedido apenas em forma de jaculatória
A imagem da mulher que me indicou o caminho formou-se para sempre na minha mente com as feições suaves de Nossa Senhora de Fátima
A imagem da mulher que me indicou o caminho formou-se para sempre na minha mente com as feições suaves de Nossa Senhora de Fátima (Santuário de Fátima)
Afonso Barroso*

Ave Maria gratia plena, Dominus tecum, benedicta tu in mulieribus et benedictus fructus ventris tui Jesus. Sancta Maria, mater Dei, ora pro nobis peccatoribus, nunc et in hora mortis nostrae. Amen.

Foi no Colégio São João, da congregação salesiana, que aprendi a rezar a Ave Maria em latim. Fazia isso pelo menos cinco vezes ao dia. Ao acordar, na missa da manhã, antes do almoço, antes do jantar e à noite, ao deitar. Não sei por que, sempre achei que a oração em latim chegava mais depressa e com mais força às forças do Céu. Sim, sou católico-apostólico-romano-jacuriense.

Hoje eu acordei com uma doce lembrança da minha adolescência salesiana, e é por isso que resolvi rezar com você essa Ave Maria. A lembrança é de um dia em Cachoeira do Campo, onde passávamos as férias. (Explico: como éramos internos no colégio de São João del-Rei, não podíamos ir pra casa nas férias, nem nas de julho nem nas de janeiro. Éramos levados de trem para o Colégio Dom Bosco, de Cachoeira do Campo, que ficava vazio porque lá era semi-internato).

Fecho parênteses para continuar contando o que aconteceu. Estávamos todos os menores garimpando topázios num córrego da região. Sempre acontecia de colhermos as pedras semipreciosas nas expedições. Colhíamos e entregávamos depois aos padres, não sei o que faziam com elas. Naquele dia eu estava com a pequena sacola cheia de topázios, alguns bem grandinhos. Entusiasmado com a fartura do garimpo, eu me afastei um pouco pelo córrego acima e me distraí. De repente, quando olhei para trás, vi que não havia mais ninguém. Todos haviam ido embora e me esqueceram, o que era coisa rara, porque Seu Torga, o clérigo que nos acompanhava, sempre ficava atento à turma. Meio com medo, comecei a caminhar por uma trilha, mas a esmo. Me sentia perdido, por isso comecei a rezar baixinho: Ave Maria, gratia plena, Dominus tecum...

De repente, surgiu do nada uma mulher que parecia camponesa, carregando um cesto de vime, e me perguntou se eu era aluno do colégio. Eu disse que sim, e ela então me disse que eu estava indo na direção errada. É por ali, mostrou. Eu agradeci, meio assustado, peguei o caminho que ela indicou e saí correndo. Algum tempo depois, acho que uns dez minutos, alcancei a turma. Ninguém havia notado minha ausência.

Já no colégio, quando entregava a sacola cheia de topázios ao Seu Torga, contei a ele o que havia acontecido. Nossa Senhora te guiou, ele disse com ar sereno e convicto. Não duvidei. E a imagem da mulher que me indicou o caminho formou-se para sempre na minha mente com as feições suaves de Nossa Senhora de Fátima. Passaram-se os anos, e eu me lembro com frequência desse episódio, cada vez mais convencido, por conveniência misturada com fé, de que foi mesmo Nossa Senhora que me guiou naquele dia. Um pequeno milagre.

Hoje, diante desse cenário de quase terror em meio à pandemia causada por um vírus desconhecido e mortífero, sinto que estamos perdidos como eu aos onze anos naquela beira de córrego. E quando a gente está sem rumo, meu caro amigo e minha amantíssima amiga, meu conselho é que reze, ao menos de vez em quando, uma Ave Maria. De preferência, em latim. Se não quiser, pode fazer um pedido mais curto com esta jaculatória: Maria auxilium cristianorum, ora pro nobis. O vírus passará, creia.

*Afonso Barroso é jornalista, redator publicitário e editor

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