Quem leva a sério o Evangelho é provocado a mudar sua mentalidade e suas ações
Contemplar os santos é admirar a beleza do Evangelho feito carne e sangue na vida de tantos irmãos e irmãs que dedicam sua vida ao cuidado para com o próximo (Unsplash/ Mateus Campos Felipe)
Francisco Thallys Rodrigues*
Santo Antônio é bastante popular entre o povo brasileiro, sendo conhecido como o "santo casamenteiro". Em torno de sua figura misturam-se diversas tradições populares que atravessam gerações, reunindo elementos familiares, culturais e religiosos. Entretanto, para além da dimensão popular e cultural da fé, é importante refletir sobre o sentido que Antônio deu à sua vida como seguidor de Jesus e por que o consideramos como um santo, destacando o modo como viveu o Evangelho, sobretudo, no cuidado para com os pobres e os sofredores.
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O ser humano anseia por Deus e seu coração é inquieto enquanto não encontra nele o sentido para sua vida. Na busca por Deus, o jovem Antônio torna-se cônego regular de Santo Agostinho, destacando-se por sua grande capacidade intelectual. Contudo, a grande virada de sua vida acontece quando conhece os frades franciscanos e decide viver de modo mais radical o Evangelho, colocando toda a sua energia e intelecto a serviço dos mais necessitados. Pode-se dizer que este momento marca uma ruptura radical no modo como anunciará o Evangelho. Dom Helder Câmara, santo de nossos tempos, após o encontro com o cardeal Gelier, manifestou um sentimento parecido. Eis suas palavras: "Este é um momento de virada em minha vida. O senhor poderá ver minha consagração aos pobres". Quem leva a sério o Evangelho é provocado a mudar sua mentalidade e suas ações, visto que já não são compatíveis com o "homem velho".
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Na vivência do Evangelho, dentro do espírito da ordem franciscana, Antônio destaca-se por sua missionariedade, capacidade de ir além das fronteiras estabelecidas a fim de que a Boa-Nova possa ser anunciada. Dentro deste contexto missionário é que acontece o encontro entre Francisco (fundador da ordem franciscana) e Antônio. O jovem Antônio solicita permissão para pregar o Evangelho em Marrocos (norte da África). Porém, durante a viagem, ele adoece e tem de retornar a Portugal. Na viagem de volta, os ventos conduzem seu barco para a Itália, terminando por parar na Sicília num grande encontro de franciscanos. O encontro com Francisco marca profundamente a sua vida, uma vez que a partir deste momento será encarregado da formação dos frades mais jovens.
O anúncio da Boa-Nova se torna concreto no cuidado com os pobres e necessitados. Santo Antônio era um exímio pregador do Evangelho; destacava-se por sua grande eloquência. Entretanto, o seu arcabouço intelectual não era motivo para vanglórias pessoais, sendo colocado a serviço do Reino na ordem franciscana. O cuidado para com os pobres ocupou um lugar central na sua vida, levando o povo a identificar-se com ele, aclamando-o santo logo após sua morte. Pode-se dizer que a causa dos pobres é bussola fiável para a concretização do Evangelho. "Em verdade vos digo: cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes" (Mt 25,40). Não se pode pensar no anúncio da Boa-Nova sem considerar os pobres e necessitados.
Contemplar os santos é admirar a beleza do Evangelho feito carne e sangue na vida de tantos irmãos e irmãs que dedicam sua vida ao cuidado para com o próximo, seguindo a esteira do mestre Jesus, animados pela força de seu Espírito. É compreender que a vivência do Evangelho é caminho possível para todos dentro das possibilidades de cada um. As palavras do papa Francisco animam os cristãos a trilharem este caminho: "Gosto de ver a santidade no povo paciente de Deus: nos pais que criam os seus filhos com tanto amor, nos homens e nas mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa, nos doentes, nas consagradas idosas que continuam a sorrir" (Gaudete et exsultade, 7). A vida dos santos é sinal do Evangelho de Jesus presente na vida do povo, é testemunho concreto da possibilidade real de seguir os ensinamentos do mestre.
A grande nuvem de testemunhas formadas pelos santos reconhecidos e não reconhecidos publicamente inspira todos os cristãos a engajar a vida no anúncio da Boa-Nova do Reino de Deus. A fé cristã só pode ser compreendida na relação com o próximo, no cuidado com a vida por meio de autêntico testemunho que atravesse as fronteiras religiosas, étnicas e linguísticas. Neste sentido, o tempo da pandemia é uma oportunidade para repensar a vida e as atitudes. Nas palavras de Aquino Junior, "somente o testemunho autêntico dos cristãos e de suas comunidades pode recuperar o potencial salvífico-libertador da fé cristã e seu poder de conversão das pessoas e de transformação da sociedade". Oxalá o testemunho de Santo Antônio inspire os batizados na busca por tornar as suas vidas um Evangelho vivo!
*Presbítero da Diocese de Crateús. Especialista em Sagradas Escrituras (EST), bacharel em Filosofia (FCF) e Teologia (FAJE), licenciado em História (UNOPAR). Trabalha na Paróquia Nossa Senhora do Rosário em Tauá?"CE e no Colégio Antônio Araripe como professor de história no Ensino Médio
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