Pesa-me a indiferença política dos jovens, ou o risco de uma política sem diálogo, projeto, utopia.
Sinto-me envolvido num clima depressivo. Ressaca? Não percebi muita alegria pelo carnaval. Menos ainda, com a perspectiva da Copa. Nem sei se as eleições vão mexer muito com o povo. Seria interessante ver quantos votariam se o voto fosse livre...
Pesa-me a indiferença política dos jovens, ou o risco de uma política sem diálogo, sem projeto, sem utopia (digo isto consciente de que uma utopia não é para ser executada, mas para dar inspiração). Política sem perspectiva é chão propício para dar o poder a quem não está a fim de dialogar.
Pesa-me a sensível piora do ambiente natural e o pouco que se faz para salvar o que nós, humanos, poderíamos salvar, mesmo que o aquecimento seja natural e cíclico, como pretendem os céticos.
Pesa-me o retrocesso que penso ver na educação e cultura. Minha cabeça de velho pode estar enganada – o homem do futuro talvez tenha de ser um androide cibernético, dispensado de pensar por si mesmo –, mas não consigo me alegrar com o fato de que, nas escolas públicas de nossas metrópoles, a metade dos alunos passa (ou é passada) para o quinto ano sem saber ler.
E o conhecimento geral? Ao ensinar textos na faculdade, não posso apelar a conhecimentos elementares de análise gramatical e sintática nos meus alunos (muitos dos quais já fizeram outro curso superior). Pior, nem compreendem que, ao se tratar do período antes da era comum, a sequência dos anos desce em vez de subir.
E as escolas consideradas boas porque particulares e pagas? Um diretor de colégio particular me diz: “Os alunos vivem em bolhas. E os pais são seus motoristas particulares e promotores para reclamar contra os professores e a direção”. Crianças europeias, em intercâmbio nos colégios de Belo Horizonte, estranham a superproteção (e alienação) a que seus coleguinhas, e, portanto, elas mesmas, estão sendo submetidos. Em parte por causa da segurança, nesta sociedade que não pratica uma urbanização social. E em parte porque os pais não sabem como usar a riqueza que têm à disposição.
A chegada do papa Francisco me injetou um pouco de ânimo. Compensou a perda de Mandela. Francisco assume sua função de dizer as coisas como são e de mexer com as coisas que não devem continuar como estão, pelo menos, dentro da Igreja. Rezo para que seu exemplo seja seguido também pelos líderes políticos. E por todos nós, nas coisas que são de nossa alçada.
Sobretudo, não pensemos que a culpa é dos outros – dos comunistas, da ditadura, dos traficantes, da Google, de Obama... Agora também Putin entrou na lista dos diabos. A culpa é nossa. Estamos todos no mesmo barco. Os traficantes combinam com as imobiliárias a “disponibilização” de terrenos favelados, com a ajuda de providências políticas locais. Padres deixam estofar suas obras sociais sem perguntar muito de onde vem o dinheiro. Tudo está entrelaçado. Se não começarmos a mexer em nossa própria horta, o mato toma conta de tudo!
Que assim não seja.
Johan Konings nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colegio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Foi professor de exegese bíblica na Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre (1972-82) e na do Rio de Janeiro (1984). Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (jesuítas) e, desde 1986, atua como professor de exegese bíblica na FAJE - Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte, onde recebeu o título de Professor Emérito em 2011. Participou da fundação da Escola Superior Dom Helder Câmara.
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