sexta-feira, 28 de março de 2014

A doutrina ou o caos, diz cardeal



Por Matteo Matzuzzi


"É evidente que a falta de clareza sobre o genuíno ensino católico por parte dos bispos, pregadores, catequistas e principalmente dos professores de teologia moral é a principal causa do caos atual." Em conversa com o jornal Il Foglio, o cardeal Walter Brandmüller, eminente historiador da Igreja medieval e moderna, e por muitos anos presidente do Pontifício Comitê de Ciências Históricas, intervém no debate sobre o matrimônio e a família que será objeto dos dois Sínodos programados para o próximo outubro e para o ano que vem. 

Um "caos" alimentado também por aqueles que, nas fileiras do episcopado mundial, disseram que o ensino da Igreja Católica em matéria de moral não é mais adequado aos tempos e que agora só cria confusão entre os fiéis, mais ou menos assíduos às missas dominicais e à confissão. 

É o caso, por exemplo, do jovem bispo de Trier, Dom Stephan Ackermann. "Mas o que isso significa?", interroga-se, perplexo, o cardeal Brandmüller: "A afirmação do excelentíssimo bispo de Trier levanta questões, e me parece que é preciso fazer uma distinção. O prelado fala simplesmente de ´ensino´, e ele poderia ter razão se estivesse se referindo ao modo de motivar, explicar e ensinar a doutrina da Igreja. No entanto, ele teria se equivocado se tivesse querido dizer que a doutrina da Igreja não é mais adequada aos tempos. De fato, mudam as perguntas e as questões de acordo com as mudanças socioculturais, mas a resposta da Igreja em todos os momentos da história não pode tocar o depositum fidei válido uma vez e para sempre". Afinal, trata-se do "tesouro do qual o bom chefe de família tira coisas nova et vetera". 

Para responder às "fortes expectativas enraizadas entre os fiéis" que desejam atualizações em matéria de ensino moral católico, o cardeal Walter Kasper propôs uma solução que reafirme a intangibilidade da doutrina, mas que permita intervenções sobre a práxis pastoral. Doutrina e práxis sobre dois trilhos separados, portanto, esquema já criticado pelo prefeito do ex-Santo Ofício, o cardeal Gerhard Ludwig Müller, e com o qual o nosso interlocutor também não concorda. 

Certamente, "é necessário distinguir entre a doutrina de fé e a práxis pastoral. Distinguir sim, mas não dividir. Toda práxis pastoral que queira ser autêntica deve se inspirar e se sustentar sobre a verdade de fé. É verdade – observa ainda o estudioso criado cardeal por Bento XVI em 2010 – que a realidade sociológica da família não é mais a dos nossos avós. Mas o que nunca pode ser submetido à mudança histórica é a própria natureza, a substância da família que nasce do matrimônio sacramental entre homem e mulher." 

A pastoral, diz ainda Brandmüller, "deve responder à pergunta sobre como explicar melhor essa realidade para fazer com que ela seja vivida mais autenticamente nas circunstâncias de hoje". 

Também há dúvidas sobre a corrente de pensamento segundo a qual a Igreja, ao longo da sua história, sempre defendeu que, mantendo firme o princípio una fides, há muitos modos de vivê-la e experimentá-la: é verdade, explica o presidente emérito do Pontifício Comitê de Ciências Históricas, "existem muitos modos de viver e experimentar a fé. Mas estes são legítimos apenas na medida em que não contradizem a doutrina da fé formulada pela Igreja. É sempre essencial a convergência entre doutrina e vida".

O problema é a falta de clareza sobre o significado do ensino católico, observa o purpurado: "Em mais de 25 anos de trabalho pastoral – paralelamente à minha carreira universitária – eu fui pároco no interior". Pois bem, "depois do fatídico ano de 1968, eu não tive mais que pronunciar a até então costumeira carta pastoral sobre o ´sagrado sacramento do matrimônio´ prescrita para o segundo domingo depois da Epifania". Ela não estava mais prevista, não foi mais preparada, "e isso é emblemático para compreender a situação".
Il Foglio, 27-03-2014.

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