Crescer é difícil, embora necessário (Foto: Reprodução) |
Estudar longe de casa é extremamente complexo. A maior parte dos dias é marcada por muito cansaço. Longe de casa, da família, da comida caseira, do conforto. E foi em um destes dias de muito cansaço que, ao passar na padaria, como de costume, uma situação bem delicada me aconteceu. Estava reclamando com minha amiga que meus livros estavam muito pesados, que estava tão cansada que não aguentava dar um passo a frente. Nesse momento, a moça (uma menina) que pesava os pães disse com um sorriso trêmulo: “Melhor carregar um peso como este nas mãos do que um peso como este na barriga. Eu daria tudo para carregar o peso de um livro.” Sabe aquele momento em que você não sabe o que dizer ou fazer? O máximo que consegui foi dar um sorriso hipócrita e ir pagar meu pão.
Crescer é difícil, embora necessário. E mesmo com toda a estrutura que sua família proporcione, chega um momento que é com você. Não tem jeito, a vida literalmente nos lança no mundo e temos que nos virar. Nesse momento começamos a nos entender, a tentar criar nossos fundamentos – porque a pós-modernidade nos possibilita isso. E foi tratando deste assunto em meu último texto que fui questionada por um amigo no que tange a falta de um fundamento posto – e que para ele, essa falta é o mais interessante: “Não importa bíblia, ciência ou o que for. Podemos até descobrir o ‘como’, mas o ‘porquê’ é impossível. E eu sinceramente acho isso a parte mais legal de tudo. Cada um pode inventar o sentido que quiser.”
Concordei com meu amigo em alguns aspectos. É de fato muito instigante poder dar o sentido que se quer na vida, sem uma religião que te obrigue a seguir seus preceitos, sem um Estado absoluto que te impeça de ser ‘livre’ (embora este conceito ainda continue sem definição). Mas será que todos nós estamos preparados para isso? Será que sabemos lidar com todo esse poder? Será que aquela menina da padaria, com um sorriso de criança e um bebê na barriga vai conseguir dar seu próprio fundamento à vida? Será que todos estes estudantes conseguirão? Ouso dizer que não.
O pensador alemão Hans Blumenberg desenvolveu todo um estudo sobre o fenômeno do moderno, e chegou à conclusão de que o vazio pós-moderno é preenchível sim: pelo próprio ser. Contudo, as pessoas ainda não se deram conta disso e, mesmo que percebam, vai ser saudável para a humanidade a posse de todo esse poder? Já não basta o constante conflito de gerações atual, a constante perda de parâmetros, o constante choque de realidades? Como ainda conseguiremos conviver com a ideia de que podemos dar nosso próprio sentido à vida? Não nos tornaremos mais individuais do que somos? Não perderemos ainda mais nossa noção do que é viver em sociedade sem um fundamento geral que nos una?
Talvez o texto possa parecer muito abstrato, mas é que muitas pessoas não conseguem perceber como determinados assuntos, por mais distantes que possam parecer da realidade, estão em tudo que vivemos e em todos os conflitos atuais. O individualismo exacerbado que quase beira ao egoísmo é a origem dos grandes problemas sociais da sociedade como um todo. Os conflitos com os outros surgem dos nossos conflitos internos, e é por isso que discorrer sobre as particularidades humanas é o primeiro passo para entender o mundo atual.
Podemos falar das manifestações ou dos conflitos da Síria, podemos discutir sobre a revolta da classe médica com o programa do governo, podemos dissertar sobre a seca no Nordeste ou da crescente vinda dos haitianos para o Brasil, podemos discutir assuntos que hoje são pautas nas mesas de bar e simplesmente chegar a lugar algum. Mas quem se atreverá a realmente discutir a maior e mais complexa crise de todas?
Brígida Rodrigues Coelho é graduanda em Direito pela Escola Superior Dom Helder Camâra. Começou a escrever com 15 anos no jornal filosófico Conhece-te a ti mesmo e, atualmente, tem uma coluna no jornal o Baruc, de Congonhas e região. Vencedora de muitos concursos literários nacionais e internacionais gosta de focar em assuntos críticos os quais possa relacionar à filosofia.
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