Ele disse que decretos que são alvo de contestação respeitaram a lei.
Nelson Barbosa deu explicações à comissão que analisa o impeachment.
Nathalia Passarinho
Do G1, em Brasília
Chamado a falar em defesa da presidente Dilma Rousseff na comissão do impeachment, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou nesta quinta-feira (31) que o governo fez o “maior corte da história” em 2015 e não pode ser acusado de cometer crime de responsabilidade nem “irresponsabilidade fiscal”. O ministro foi escalado para falar em defesa de Dilma no colegiado que dará parecer pela instauração ou não do processo de afastamento.
“No ano passado, o governo fez o maior contingenciamento da história. Não há que se falar de flexibilidade fiscal, de irregularidade fiscal ou de crime de responsabilidade fiscal no momento em que o governo fez o maior contingenciamento da história”, disse.
comissão na câmara
Nelson Barbosa afirmou ainda que a comissão do impeachment deve se ater a denúncias relacionadas ao atual mandato da presidente Dilma Rousseff. O pedido de abertura de impeachment leva em conta atos cometidos em 2014, último ano do primeiro mandato, e 2015, primeiro ano do segundo mandato.
“Essa comissão deve averiguar fatos decorrentes do atual mandato. Dentre os fatos apontados no atual mandato as indagações dizem respeito a dois temas principais: uma suposta edição de decretos de crédito suplementar em desacordo com a legislação vigente e a realização ou não de alguns atos fiscais ao longo de 2015 que estaria em desacordo com o entendimento do Tribunal de Constas da União”, disse Nelson Barbosa, para logo acrescentar que, na visão dele, os decretos respeitaram a legislação e os “atos fiscais” estavam de acordo com o entendimento do TCU vigente na ocasião.
“Vou mostrar que esses atos estavam de acordo com o entendimento do TCU na época em que eles foram praticados. Uma vez mudado o entendimento, também mudaram os atos”, completou.
Nelson Barbosa afirmou ainda que a edição de decretos de crédito suplementar pela petista, sem autorização do Congresso, respeitou a Leo Orçamentária de 2015. De acordo com ele, os créditos extras não aumentaram o “limite global” de gastos do governo.
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Uma das principais denúncias do pedido de afastamento da presidente é de que ela teria editado decretos para liberar R$ 2,5 bilhões em crédito extra, no ano passado, sem aval do Congresso Nacional. A justificativa para liberar o dinheiro foi “excesso de arrecadação”, mas o país terminou o ano com déficit de mais de R$ 117 bilhões.
“Nenhum dos seis decretos mencionados no processo de impeachment modificou a programação financeira de 2015. Nenhum modificou o limite global de gasto do governo. Sobre os decretos em si gostaria de esclarecer que a edição desses decretos está em acordo com a legislação vigente e a LOA de 2015. No inciso 4º da LOA há uma série de especificações e regras para abertura de crédito suplementar. E todos os decretos foram amparados por pareceres técnicos do Ministério do Planejamento”, disse o ministro da Fazenda.
Ele destacou ainda que parte dos recursos liberados por Dilma atenderam a outros Poderes, principalmente ao Judiciário.
“Algumas dessas suplementações decorrem de pedidos feitos por outros poderes, principalmente do Poder Judiciário. Há um da Justiça Eleitoral para realizar concursos públicos para analistas e técnicos judiciários, com base em excesso de arrecadação em inscrições em concursos públicos. Houve uma receita maior na arrecadação do Poder Judiciário e o Poder Judiciário pediu para utilizar.”
Nelson Barbosa também dedicou tempo para explicar as chamadas “pedaladas fiscais”- prática que consistia em atrasar os pagamentos do Tesouro Nacional a bancos públicos, para melhorar temporariamente a situação fiscal do país. Por causa do atraso nos repasses, BNDES e Caixa Econômica Federal tiveram que desembolsar recursos próprios para pagar programas sociais, como o Bolsa Família.
Para Nelson Barbosa, essa prática estava de acordo com o entendimento do Tribunal de Contas da União que vigia na época. O ministro da Fazenda também destacou que o atraso no pagamento foi implementado, segundo ele, “corretamente”, no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
“O governo questionou o posicionamento do TCU nos trâmites legais. A partir do momento em que o posicionamento ficou final, o governo pagou todos os valores de exercícios anteriores do TCU. Com base nesses fatos, considero não haver base legal para o pedido de impedimento da presidente da República.”
Professor da UERJ
Após a fala de Nelson Barbosa, o professor de Direito Financeiro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Ricardo Losi Ribeiro começou sua exposição. assim como o ministro da Fazenda, ele também foi chamado a falar pelo governo.
O professor afirmou considerar que a comissão do impeachment não pode tratar de acusações referentes ao primeiro mandato de Dilma, porque o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ao autorizar o início do processo, se baseou apenas nos pontos da denúncia que se referem a 2015.
“É preciso lembrar que a decisão do presidente da Câmara limitou a decisão da comissão ao atual mandato de 2015. Portanto, está fora desse processo outras condutas indicadas na peça do jurista. Certamente essa decisão não se trata mais de uma discussão sobre se o mandato anterior deve ou não ser considerado, mas do escopo da decisão do presidente da Câmara. Se esta Casa tratar de fatos anteriores, estará julgando em desacordo com a Constituição, em desacordo com a lei do impeachment”, disse.
O professor afirmou que o descumprimento da meta fiscal inicial do governo para 2015 e a edição de créditos suplementares não podem ser considerados crimes, porque o Congresso Nacional aprovou no final daquele ano revisão da meta e autorizou rombo de R$ 119, 9 bilhões. Para ele, o Congresso convalidou os atos fiscais do Executivo.
“No momento em que ela manda para o Congresso [e o Congresso aprova] mudança na meta, aquela condição está convalidando todos os decretos editados no ano de 2015. Se não considerássemos essa atuação como válida, estamos considerando que a lei que o Congresso Nacional aprovou tem os mesmos vícios que o decreto que ela convalidou. Não quero crer que essa Casa tenha sido chantageada, para aprovar qualquer norma nesse sentido. Quero crer que o Congresso cumpriu com sua responsabilidade”, disse o professor.
Bate-boca
No início da exposição do professor, o deputado Júlio Lopes (PSB-RJ) questionou se ele era professor titular ou adjunto da UERJ. O questionamento gerou um princípio de bate-boca com deputados petistas que defenderam respeito a Ricardo Losi Ribeiro.
Em seguida, o professor afirmou que não estava na comissão para falar em defesa de Dilma e que isso cabe à Advocacia-Geral da União, o que gerou novos protestos de Júlio Lopes, para quem a AGU defende a “União” e não a presidente.
A manifestação do deputado do PSB gerou novo bate-boca em plenário. O deputado Wadih Damous (PT-RJ) e o presidente da comissão do impeachment, Rogério Rosso (PSD-DF), destacaram que o professor tem direito de dar sua opinião livremente, como convidado do colegiado.
Sobre as "pedaladas fiscais", o professor da UERJ afirmou que o pedido de impeachment é evasivo quanto à ocorrência dessa manobra em 2015.
“A parte da denúncia que fala de pedalada em 2015 não diz muita coisa. A parte da decisão do presidente da Câmara sobre pedalada em 2015 também não diz muita coisa. Diz que teve pedalada em 2015, mas não descreve minimamente a ação da presidente da República. E não descreve porque esse ato não é da competência da presidente da República.”
Ricardo Losi encerrou a fala dizendo que o Congresso Nacional “não está autorizado” a afastar Dilma, porque não houve, segundo ele, crime de responsabilidade. Para o professor, “falta de apoio parlamentar, impopularidade, ou o conjunto geral da obra, não alicerça pedido de impeachment, como bem esclareceu o ministro Marco Aurélio Mello no dia de ontem”.
“Nos dois casos, tanto nos decretos quanto nas pedaladas, temos uma virada jurisprudencial do TCU. Ainda que considerássemos que a virada foi positiva, evidentemente que o novo entendimento só pode ser adotado em relação ao futuro. Me parece que nenhum dos atos apontados na peça dos juristas e que foi admitido pelo presidente da Câmara dos Deputados constitui crime de responsabilidade. Por essas razões, não está autorizado o parlamento a destituir o mandato da presidente da República”, disse.