EUA: espionagem aleatória, ilegal e inconstitucional.
Por Lev Chaim*
“Abra a porta, polícia!”. Quem já não ouviu uma história parecida? E também a resposta do dono da casa: “Têm ordem judicial para uma busca?”. Mas quando agentes secretos norte-americanosda NSA (National Security Agency ou Agência Nacional de Segurança) fazem o mesmo ilegalmente, milhões e milhões de vezes, via computador e escutas telefônicas privadas, ninguém protesta.
Por que mesmo agora,depois das revelações do agente norte-americano dissidente, Edward Snowden, 50% da população norte-americana pesquisada não dá importância para o fato e acha que ainda tudo está certo? E olhe que entre aqueles que aprovaram a espionagem ilegal na pesquisa de opinião, realizada recentemente nos Estados Unidos, muitos eram democratas, do partido do presidente Obama.
Acredito que seja mesmo falta de informação mais precisa. Todos estes que aprovaram ainda não sentiram o bafo da espionagem em suas nucas e pensam que a NSA esteja apenas à caça de terroristas. Mas graças ao bom Deus e à honestidade do jovem agente secreto norte-americano, refugiado na Rússia, Snowden, a coisa está mudando.
Mesmo porque, quando as autoridades norte-americanas alegam “que ninguém é escolhido especificamente para essas escutas ilegais, que são escolhas aleatórias, não acopladas a endereços e identidade pessoais;que espiona-se cada cidadão, cada casa; e que se for encontrado alguma coisa intrigante, aos olhos da NSA, otal suspeito será informado”, nada disto justifica esta espionagem massificada, aleatória, ilegal e inconstitucional.
Para medir o efeito disto tudo entre membros da braço norte-americano da Associação de Escritores PEN Internacional**, realizou-se uma sondagem. No resultado, denominado de “ChillingEffects”(Efeitos Arrepiantes) ficou bastante claro:88% dos entrevistados não vêm a coisa com bons olhos e 24% evitam mencionar certos assuntos em seus e-mails e telefonemas.E o que é pior: 16% dos pesquisados disseram ter deixado de lado certos projetos, com medo da controvérsia toda.
O fenômeno de um escritor não mencionar algum assunto em seus artigos por conta desta espionagem secreta é preocupante e tem um nome: autocensura e intimidação. Isto me fez lembrar a velha Alemanha Oriental e sua famigerada polícia secreta, a Stasi. Até o momento, nenhum escritor foi preso. Mas o sentimento com que se vive atualmente,sob o regime de escutas ilegais digitais e não digitais, que possam ser usadas contra a própria pessoa, acabou por constranger a maioria dos escritores pesquisados.
Muitos deles argumentaram que isto só vem enfraquecer a democracia, já que as pessoas acabam não podendoemitir livremente suas opiniões.Tanto é preocupante que já estão surgindo oposições sérias à esta vigilância massificada de informações roubadas às pessoas.
Uma petição, “Escritores Contra Vigilância Digital Massificada”, principalmentea do governo norte-americano, já foi assinada por cerca de 562 escritores em todo o mundo. Sem dúvida, um primeiro passo para a criação de uma “Constituição Internacional Digital”, que poderá um dia impedir essas ações ilegais deespionagem internacional.
Após Snowden, acredito que essas agências internacionais de espionagem estejam com a barba de molho e com trabalho dobrado, apenas para vigiar os passos de seus próprios funcionários que lá trabalham e evitar mais dissidências problemáticas. Segundo peritos, em 2014, mais dissidentes éticos irão aparecer e denunciar essas espionagens ilegais.
Mas enquanto isto não acontece, muitos ainda terão que viver sob o regime do “medo”de que todos os seus telefonemas e escritos digitais estejam mesmo sendo guardados, até que possam ser usados contra si próprios.
A pesquisa realizada pela sucursal norte-americana da Associação Internacional dos Escritores, PEN, não pode, de forma alguma, ser considerada um barômetro da opinião pública. Mas, sem sombra de dúvidas, já é um primeiro passo para o alerta dos cidadãos comuns, para o perigo que isto tudo representa.
Para a advogada da faculdade de direito da Universidade de Nova Iorque, Rachel Levinson-Waldman, a privacidade é importantíssima para o funcionamento da própria democraciae a troca livre de informações. Estas palavras foram publicadas em um artigo do jornal londrino “The Guardian” e reproduzidas pelo jornal holandês “NRCHandelsblad”.
Ao compararmos os atos da agência norte-americana de espionagem, NSA, com os da antiga polícia secreta da Alemanha Oriental, a Stasi, esta última, ao contrário de sua versão aperfeiçoada norte-americana, tinha um ponto a seu favor: seus atos eram do conhecimento público que viva em um silêncio letárgico.
Já a população ocidental de hoje, principalmente a norte-americana, não está nada consciente do perigo que tudo isto representa para a democracia e liberdade de expressão, já que a caça é geral e não apenas de supostos terroristas. Com a história se aprende a se evitar os mesmo erros. É bom lembrar que a Alemanha Oriental se sucumbiu aos anseios de liberdade de seu próprio povo.
*Lev Chaim é jornalista, colunista, publicista da FalaBrasil e trabalhou 20 anos para a Rádio Internacional da Holanda, país onde mora. Escreve às terças-feiras para o Domtotal. **PEN International: associação internacional de escritores fundada em Londres, em 1921, para promover a amizade e cooperação intelectual entre os escritores em qualquer lugar. Um de seus principais objetivos é a promoção da liberdade de expressão.
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