Os intérpretes parecem capazes de ir a fundo na alma desses personagens
Por Alysson Oliveira
Alguns apelidaram "Clube de Compras Dallas" de "Erin Brockovich - Uma mulher de talento" da Aids, uma referência ao filme de 2000 que rendeu a Julia Roberts um Oscar de melhor atriz. É uma comparação que até certo ponto faz sentido - ambos baseiam-se numa história real, protagonizados por uma pessoa comum que driblou o sistema e promoveu o bem-estar para desconhecidos.
Mas aqui o diretor canadense Jean-Marc Vallée ("C.R.A.Z.Y.") não tem a mesma sagacidade ou energia de Steven Soderbergh, ao menos na época do filme de 14 anos atrás.
Ainda assim, "Clube de Compras Dallas" tem bastante a dizer, além de contar com duas performances que realmente merecem ser premiadas. Matthew McConaughey e Jared Leto estão irreconhecíveis - o primeiro, mais magro e frágil, enquanto o segundo, vestido de drag queen. Mas, obviamente, os prêmios não se devem apenas por se transformarem fisicamente.
Em suas atuações, os intérpretes parecem capazes de ir a fundo na alma desses personagens, e trazer à tona aquilo que os move. Os dois ganharam o Globo de Ouro, como ator principal e coadjuvante, respectivamente, e são favoritos no Oscar nessas categorias. O longa ainda concorre em outras quatro modalidades - entre elas, melhor filme e roteiro original.
McConaughey é Ron Woodroof, eletricista e eventual participante de rodeios, cuja vida toma caminhos inesperados quando é diagnosticado com Aids, em meados dos anos de 1980, quando a doença era tão mais perigosa e desconhecida, se comparada a hoje.
Machão arrogante e cheio de si, vemos o personagem pela primeira vez com duas mulheres nas coxias de um rodeio. Mas esse é apenas o começo de uma jornada.
Como "Erin Brockovich", este é um filme sobre o descaso do Estado, e o cidadão comum tomando as medidas para assegurar seus direitos. O inimigo de Ron - quase até mais que a doença - será o sistema de saúde e seus meandros. Sempre batendo de frente com seus médicos, como a Dra. Eve Saks (Jennifer Garner), o protagonista burla leis, compra AZT roubado (na época, o remédio usado no tratamento).
Quando ela muda de lado e se torna uma aliada - também por interesses científicos sobre os efeitos da droga -, os dois percebem que altas doses do remédio podem ser mais prejudiciais do que benéficas no controle.
A mudança radical acontece quando Ron cruza a fronteira com o México, onde procura um médico norte-americano expatriado (Griffin Dunne), que lhe sugere uma combinação de outras drogas e uma dieta específica para aumentar a imunidade.
Em pouco tempo, Ron se torna um tipo de traficante, receitando a mesma combinação a pessoas com Aids - obviamente, ele é o fornecedor das drogas. O negócio é tão lucrativo que, com a ajuda da travesti Rayon (Leto), monta e administra um escritório num quarto de hotel. Logo uma fila gigantesca se forma - uma evidência do vulto que a epidemia estava assumindo naquela época.
Também o setor do governo responsável pela fiscalização dos medicamentos está batendo na porta de Ron. E aí que o filme mostra a omissão do Estado que, aliado à indústria farmacêutica, parece mais interessado na burocracia do que na corrida para salvar vidas, sem demonstrar nem ao menos compaixão.
Isso tudo, no entanto, está mais nas entrelinhas, pois Vallée, a partir de um roteiro de Craig Borten e Melisa Wallack, está mais interessado no processo de transformação de um indivíduo homofóbico e machista, como Ron, que, ao longo de sua jornada, alia-se àqueles que ele mais desprezava - deixando de lado o momento histórico, e como a trajetória desse homem comum o reflete. Elementos, aliás, que só acrescentariam ao filme.
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Reuters
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