sexta-feira, 25 de abril de 2014

Os deuses deram um banquete

Padre Augusto Menezes Vale*

"Diotima: Quando Afrodite nasceu, os deuses deram um banquete e, com ele, também Recurso, o filho da Esperteza. Quando então a refeição chegou ao fim, a Pobreza veio para estimular no festim e ficou em pé à porta. Inebriado de néctar (não havia ainda vinho), Recurso havia entrado no jardim de Zeus e caído em profundo sono ali. Uma vez que não entrava nem saía, Pobreza tomou a decisão de deixar que Recurso lhe gerasse um filho; assim, ela deitou-se a seu lado e concebeu o Eros. E Eros tornou-se acompanhante e escudeiro de Afrodite pelo fato de haver sido gerado na festa de nascimento dela e de sua essência o impulsionar para o belo, pois que Afrodite é bela. 

A Eros, enquanto filho de Recurso e Pobreza, ocorre sempre o seguinte: de um lado ele é sempre pobre, nada delicado e belo, como geralmente se pensa, mas, duro e desgrenhado, descalço e sem morada; ele dorme o tempo todo sobre a terra sem coberta, pernoita diante da porta e na rua, ao ar livre; nisto ele é como como sua mãe, e a carência habita sempre junto a ele. Porém do pai ele tem o fato de sempre estar à espreita do belo e do bom, viril, ousado e persistente, como grande caçador, sempre tramando astúcias, um buscado do conhecimento e encontrado de caminhos, amando a sabedoria ao logo de sua vida, um feiticeiro poderoso, mestre de bruxaria e sofista. 

Ele não é como um imortal nem como um mortal: logo ele floresce e vive assim que encontra seu caminho, ao modo de seu pai, porém sempre de novo ele perde o caminho. Assim, Eros nunca é pobre e nunca é rico, também entre sabedoria e tolice ele está no meio. Isto Acontece assim: nenhum deus é filósofo e deseja tornar-se sábio - ele já o é. Também quem, de outro modo, é sábio não aspira à sabedoria. Mas também tolos não praticam sabedoria, também não querem tornar-se sábios. Justamente por isto a tolice é algo tão mau, pois que, sem ser nobre e sensata, ela está satisfeita consigo. E quem aqui crê que não lhe falta nada também não almeja aquilo de que não sente falta.

Sócrates: Quem então anseia pelo saber, Diotima, se não o fazem nem os sábios nem os tolos?

Diotima: Mas isto qualquer criança vê: os que estão no meio; e entre eles está também Eros: pois para o mais belo conta a sabedoria; e Eros é amor e impulso para o belo, de modo que Eros tem de ser filósofo e, enquanto filósofo, tem de estar entre os sábios e tolos. Também isto é a herança de seus pais; pois ele provém de um pai sábio e engenhoso, porém de uma mãe que sempre está perdida e nunca é sábia (O banquete, 23, 203-204; tradução para o alemão: B. Snell)". Arno Anzenbacher, Introdução à filosofia ocidental, 11.


*Estudante na Universidade Gregoriana de Roman, mestrando em Filosofia 

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