quinta-feira, 29 de maio de 2014

Potencial da biodiversidade é pouco aproveitado

Iniciativas na região amazônica esbarram na falta de infraestrutura, logística difícil e burocracia.

Por Andrea Vialli

São cerca de 30 mil espécies vegetais conhecidas pela ciência, o que equivale a 10% das plantas do mundo todo. Cada hectare da Floresta Amazônica pode abrigar entre 40 e 300 espécies diferentes de árvores e plantas e, quando se fala da fauna, os números são igualmente robustos. Tamanha riqueza poderia representar oportunidades econômicas para os Estados da Amazônia Legal e para o Brasil como um todo – mas o uso sustentável dos recursos da biodiversidade amazônica ainda está longe de representar uma fração expressiva do PIB da região.
 
As empresas que apostaram nas riquezas naturais para empreender na região precisaram enfrentar a burocracia, a logística difícil e estruturar do zero as cadeias de fornecimento. É o caso da Beraca, que produz insumos para a indústria cosmética e farmacêutica a partir de ingredientes como açaí, andiroba, babaçu, pracaxi e muru-muru. Com uma fábrica em Ananindeua (PA), a empresa começou a empreender na região em 2000, quando comprou a Brasmazon, startup incubada na Universidade Federal do Pará (UFPA) que produzia óleos com plantas amazônicas.
 
“Foi um passo visionário começar a trabalhar com as matérias-primas da Amazônia. Mas foi um investimento alto, tanto na cadeia produtiva quanto nos testes de segurança desses ativos”, diz Ulisses Sabará, presidente da Beraca.
 
Ao todo, a empresa investiu US$ 15 milhões nos últimos 15 anos no projeto da Amazônia. Desenvolveu cadeias produtivas da Ilha do Marajó ao interior do Acre, e construiu uma rede de fornecedores formada por 1.600 famílias em 105 núcleos comunitários em todo o Brasil. Com filiais na França e nos EUA, vende diretamente para gigantes da indústria de cosméticos (L’Occitane e L’Oreal são alguns dos clientes) e os extratos dos produtos amazônicos são exportados para 30 países. Apesar do sucesso da empreitada, Sabará ressalta que o caminho para ser bem-sucedido no ramo da biodiversidade não é fácil, apesar do potencial. “Tudo isso foi resultado de muita teimosia”, diz o empresário. Segundo ele, faltam recursos para pesquisa científica aplicada e visão de governos para incentivar uma indústria em bases sustentáveis. “Temos um verdadeiro pré-sal na biodiversidade brasileira, mas falta estímulo econômico. A burocracia para se acessar o patrimônio natural também é grande”, diz.
 
A Natura foi uma das pioneiras no uso das matérias-primas da biodiversidade amazônica no início da década de 2000, quando lançou sua linha Ekos, que utiliza ingredientes como açaí e castanhas e mantém mais de 30 comunidades como fornecedores – 25 só na Amazônia. De lá para cá, a empresa vem ampliando sua atuação na região e, este ano, inaugurou o complexo industrial Ecoparque, em Benevides (PA), um investimento de R$ 200 milhões.
 
Além de uma fábrica de sabonetes, a estrutura foi planejada para receber outras empresas que trabalhem com a biodiversidade e que tenham o objetivo comum de fortalecer a economia local mantendo a floresta em pé. “O objetivo, com esse projeto, é gerar um impacto territorial mais significativo e levar desenvolvimento para a região amazônica como um todo, não apenas nas comunidades com as quais já trabalhamos”, afirma Renata Puchala, gerente de sociobiodiversidade do Programa Amazônia da Natura.
 
A Symrise, empresa alemã do ramo de matérias-primas para a indústria de cosméticos, foi a primeira companhia a se associar à Natura no Ecoparque, onde pretende produzir óleos essenciais de plantas como cupuaçu, cacau, buriti e maracujá, que virão de uma parceria comercial com 2.000 famílias. A Natura também traçou metas para aumentar de 10% para 30% o consumo de matérias-primas amazônicas até 2020 e quer movimentar R$ 1 bilhão na economia da região até essa data.
Valor Econômico, 27-05-2014.

Nenhum comentário:

Postar um comentário