sexta-feira, 27 de junho de 2014

Da mesmice ao trem-fantasma

Candidatos à presidência são oficializados, mas ainda faltam propostas concretas para o país.

Por David Paiva*

Está quase no fim a temporada das convenções partidárias, conforme o calendário eleitoral. Primeiro foi Aécio Neves (PSDB), que agitou as mesmices de sempre. Gritou por mudança, repetiu o velho slogan do seu avô, “Muda Brasil”, como se mudanças fossem o resultado mágico do ato de repetir a palavra. Proposta mesmo, nenhuma. Isso apenas dá provas de que seu partido, e ele próprio, acham que o país pede mudanças mas não sabe o que está falando. É a certeza da velha política de que povo existe para ser enganado.

Já a presidente da Republica, ao ser oficializada como candidata à reeleição, anunciou um tal Plano de Transformação Nacional. Com uma surpresa atrás da outra, tem o cheiro adocicado de palpite de marqueteiro. ´Trata-se de programa tão novo que setores do próprio PT nunca ouviram falar dele e protestaram por não terem sido consultados. O Plano inclui desburocratização, ampliação do acesso à internet, investimentos em educação, melhora dos serviços públicos (em especial nas grandes cidades) e reforma política. Para ser mesmo o anúncio de uma transformação radical, só faltou a reforma tributária.

Portanto, na Convenção do PT não faltou discurso. Muito provavelmente, porém, faltou sinceridade. Para ficar só em dois pontos cruciais: desburocratização e reforma política.  O dia 1º de janeiro de 2003 era a data certa para o PT começar a desfazer esses dois nós, que envolvem interesses diretos dos carreiristas políticos. Temas que envolvem conflitos e dependem de apoios frágeis e venais só vão em frente no momento de máximo prestígio de um governo. Quase sempre no início. Passaram-se os dois períodos de Lula, depois passou o Governo Dilma 1.  Não é agora, no segundo e último mandato, que a presidente vai arrancar da sua base parlamentar qualquer reforma minimamente relevante. E menos ainda quando se sabe que a base de Dilma tem lugar para predadores como Newton Cardoso. (Não esquecer jamais que esse bizarro personagem foi adulado durante os dois mandatos de FHC.)

Se grupos petistas não foram consultados sobre o Plano, o fato não deixa mal os grupos, mas o Plano. Sinal de que é pura conversa.  A reforma política é a versão atual das famosas Reformas de Base que emperraram os três anos do Governo João Goulart. Alvo de uma vasta conspiração para derrubá-lo, Jango amarrou-se às Reformas de Base. Para governar, dependia da aprovação das Reformas, mas jamais conseguiu sequer encaminhá-las ao Congresso, nem parte delas.  No fundo, seu programa destinado a “transformar o país” estava a serviço da conspiração porque reforçava o argumento contra “o governo inoperante”.  A reforma política de hoje não tem o mesmo apelo popular e é assunto que só interessa, a princípio, aos setores  mais escolarizados. Mas o “esquecimento” da mudança nas regras da representação política, melhorando sua qualificação e aprimorando sua legitimidade, foi um dos golpes mais sérios na credibilidade do petismo. Sua inclusão no Plano, a essa altura dos fatos, converte o projeto de “transformação” tanto em pretexto para não se fazer nada quanto em argumento de que se está tentando o máximo.

Eduardo Campos e sua companheira de chapa, a “sonhática” Marina, serão oficializados amanhã. O que esperar dessa dupla? Até agora, muito pouco. Não é para mais: em Minas, seu partido apoia os tucanos, no Rio o PT e, em São Paulo, a moça recusou-se a apoiar o PSDB, discordando de Eduardo. Em todos os passos essa candidatura tem dado sinais preocupantes de sonambulismo.  Nesse fracasso previsível, vamos constatando que a terceira via no Brasil, com a exceção de Cristóvam Buarque, em 2006, sempre está mais para o Enéas do que para uma alternativa real.
*David Paiva cursou História na UFMG, foi redator publicitário e é autor do livro "Memórias dos ‘abitantes’ de Paris".

Nenhum comentário:

Postar um comentário