sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Nas trincheiras, há 100 anos

Estima-se, por baixo, que a I Guerra resultou em 10 milhões de mortos e 20 milhões de feridos.

Por Carlos Ávila*

Há cem anos tinha início a Primeira Grande Guerra que ensanguentou as terras europeias, e mesmo outras partes do mundo.  De 1914 a 1918, os aliados, tendo à frente a Inglaterra e a França, enfrentaram a Alemanha e o Império Austro-Húngaro (aos quais se juntaram a Turquia e a Bulgária) num conflito de grandes proporções e violência que, na visão do historiador britânico Eric Hobsbawm (1917/2012), marcou o verdadeiro início do século 20.

Estima-se, por baixo, que a guerra resultou em 10 milhões de mortos e 20 milhões de feridos; nela foram usados de forma inteiramente desumana gases venenosos e, pela primeira vez, tanques e aviões de combate, além de submarinos, entre outras novidades da tecnologia bélica. Foi também a guerra das trincheiras (longas valas abertas na terra, verdadeiros buracos fétidos onde homens e lama se misturavam), que evoluía lentamente com tiros de lado a lado, até que um dos grupos avançava sobre o outro, provocando uma carnificina sem paralelo.

“Chove meu casaco está encharcado e enxugo às vezes a cara/Com a toalha-esfregão que está dentro da sacola do cavalo atrelado/Vejam os soldados de passos pesados e pés de lama/A chuva fura-os com suas agulhas segue-os a mochila” – assim descreveu em versos uma das cenas da guerra o poeta franco-italiano Guillaume Apollinaire (1880/1918), um vanguardista que esteve no front (seu amigo Picasso o desenhou uniformizado). Em 1916, Apollinaire teve o capacete perfurado por um estilhaço de obus que atingiu sua têmpora. Teve que passar por uma cirurgia complicada, com perfuração de osso do crânio.

Outros escritores também participaram do conflito: Hemingway dirigiu ambulância na frente italiana e Gertrude Stein fez o mesmo na França; o poeta e. e. cummings acabou preso num campo de concentração acusado de espionagem; Brecht e Rilke também foram recrutados: o primeiro foi enfermeiro num hospital militar em Augsburg, o segundo foi soldado no Arquivo de Guerra em Viena. É de se pensar no efeito do conflito sobre a sensibilidade desses grandes criadores...

A Primeira Guerra foi um “ensaio”, sim, um trágico ensaio para a Segunda, que elevou a violência à sua máxima potência, com o holocausto e a bomba atômica sobre Hiroshima. Rios de sangue e de dinheiro (empregado em armamentos) correram nas duas guerras; outras, localizadas, se seguiram a elas. Cem anos depois ainda continuamos, infelizmente, assistindo à irracionalidade e à crueldade extrema na Ucrânia e na Faixa de Gaza.

Segundo o poeta mineiro Murilo Mendes (1901/1975), “acima das igrejas, dos partidos, das fronteiras, todos os homens conscientes, em particular os escritores, devem unir-se contra a guerra, a massificação e a bomba atômica”.
 
*Carlos Ávila é poeta e jornalista. Publicou, entre outros, Bissexto Sentido e Área de Risco (poesia); Poesia Pensada (crítica) e Bri Bri no canto do parque (infantil). Foi, por quatro anos (1995/98), editor do “Suplemento Literário de Minas Gerais”. Trabalhou também na Rede Minas de Televisão e foi editor do caderno de cultura do jornal “Hoje em Dia”. Participou de mais de vinte antologias no país e no exterior.

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