sábado, 29 de novembro de 2014

Pontes no lugar de muros - Marcelo Barros*

  domtotal.com - 
Nesse mês de novembro, o mundo acompanhou pela televisão as comemorações do 25o aniversário da derrubada do muro de Berlim. A queda do muro significou liberdade para a população da parte oriental, mas também sinalizou o fim de um mundo dividido. No entanto, desde então, surgiram novos muros para dividir o mundo. O governo dos Estados Unidos construiu em toda a fronteira com o México uma imensa muralha eletrificada, guardada por homens armados, dispostos a atirar em qualquer latino-americano que tente invadir o tal paraíso da democracia no mundo. Do mesmo modo, o Estado de Israel também ergueu um muro que divide o que resta do território palestino ainda não totalmente ocupado e as terras já tomadas militarmente pelo exército israelita.

Nesse novembro, também começam as celebrações dos 20 anos do assassinato do ministro israelita Ytzhak Rabin, morto por um judeu extremista, contrário ao projeto de paz com os palestinos que o ministro favorecia. Desde a morte de Rabin, o Estado de Israel invadiu militarmente uma parte sempre maior dos territórios que a ONU havia reconhecido ser dos palestinos. Além disso, a construção do muro só gerou mais violência e ódio de parte a parte. As pessoas de boa vontade, tanto da comunidade judaica, como dos palestinos, sabem que, através da repressão armada e da colonização forçada, nunca se alcançará a paz. Atualmente, o processo de paz entre Israel e os palestinos seria um importante degrau para a paz naquela região e em todo o mundo. Desde 2011, a Palestina é membro normal da UNESCO. Em 2012, se tornou Estado observador na ONU. Atualmente, desde que, a partir de 30 de outubro, o parlamento da Suécia votou favorável ao reconhecimento oficial da Palestina como Estado soberano,  entre os 193 Estados membros da ONU, 135 países já reconhecem a Palestina como Estado e propõem que Israel e Palestina convivam lado a lado como países irmãos.

Como em todas as guerras, os interesses que estão por trás dos conflitos se desenvolvem em lugares distantes. São os impérios de hoje que mantêm erguidos muros altos e intransponíveis, não de cimento ou tijolos e sim projetados pela discriminação social e construídos com ódio e violência. Infelizmente, os meios de comunicação teimam em manter preconceitos e em propagar as notícias a partir do interesse dos grandes. Basta notar, por exemplo, que, no Brasil, a imprensa propagou o risco da epidemia de Ebola na África. No entanto, quando, há duas semanas, a Organização Mundial da Saúde (OMS), organismo internacional da ONU, declarou que a Nigéria e o Senegal conseguiram vencer a epidemia e controlar a propagação da doença, as agências norte-americanas de notícias, das quais a maioria de nossos jornais depende, não julgaram importante divulgar a boa nova. Do mesmo modo, a ONU declarou que, de 2013 a 2014, os países da África subsaariana tiveram uma taxa de crescimento econômico de 5, 8%, bem superior ao 3, 5% do resto do mundo.  Mesmo se nem sempre as taxas de crescimento dos Estados significam melhores condições de vida para seus povos, existe na África atual um processo novo de democratização e um movimento pela justiça que ninguém pode ignorar. Para esse processo, meios de comunicação, atrelados aos interesses de famílias multimilionárias e não preocupados com o bem comum, se constituem como novos muros que dividem e não como pontes que unem.

Em algumas religiões antigas, das quais a tradição bíblica é herdeira, o ministro que liga a humanidade com Deus se chama “pontífice”, aquele que faz a ponte. Conforme a fé cristã, de tal forma, Deus faz sua moradia permanente no íntimo de cada pessoa que o acolhe que nem precisa mais de pontes para se comunicar conosco.  No entanto, é bom sim que, no lugar de muros, as pessoas por ele amadas sejam sinais da comunhão entre Deus e a humanidade, dos seres humanos uns com os outros, para além de quaisquer divisões e sejam pontes de amor e relação entre nós e a natureza que precisa do nosso cuidado.

*Marcelo Barros é monge beneditino e teólogo especializado em Bíblia. Atualmente, é coordenador latino-americano da Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo (ASETT). Assessora as comunidades eclesiais de base e movimentos sociais como o Movimento de Trabalhadores sem Terra (MST). Tem 45 livros publicados dos quais está no prelo: "O Evangelho e a Instituição", Ed. Paulus, 2014. Colabora com várias revistas teológicas do Brasil, como REB, Diálogo, Convergência e outras. Colabora com revistas internacionais de teologia, como Concilium e Voices e com revistas italianas como En diálogo e Missione Oggi. Escreve mensalmente para um jornal de Madrid (Alandar) e semanalmente para jornais brasileiros (O Popular de Goiânia e Jornal do Commercio de Recife, além de um jornal de Caracas (Correo del Orinoco) e de San Juan de Puerto Rico (Claridad). 

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