Em entrevista concedida nesta sexta-feira (13), o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, afirmou que as reivindicações das ruas são legítimas e que é preciso “ouvir”. O ministro defendeu o diálogo com quem é da oposição e disse que não pode haver “ódio” nem “intolerância”. Em relação à política fiscal, Mercadante reconheceu que houve excessos. Ele, no entanto, disse que os fundamentos da economia brasileira são sólidos, mas que é preciso mudar de rumo.
Veja trecho da entrevista no vídeo abaixo:
Cristiana Lôbo - Ministro, há uma manifestação nesta sexta-feira, organizada pelas centrais sindicais, que são aliadas históricas do governo. E no próximo domingo, dia 15, outra manifestação de protestos ao governo. Como o governo está acompanhando essa manifestação da sociedade?
Aloizio Mercadante - Olha, Cristiana, acho que tem um lado bonito das manifestações, que é a conquista da democracia. É o direito de se manifestar, de se organizar, de protestar, de reivindicar. Isso é vitalidade. Não tem que ser visto com inquietação. O que não pode é ter violência, não pode ter radicalismos, não pode ter intransigências, não pode ter uma cultura golpista, porque a democracia não é só o direito de se manifestar. E outro dia disse: eu sou de uma geração que, na juventude, a gente só conhecia a democracia pelo livro da história. A gente nunca tinha vivido uma eleição presidencial. A primeira que eu vivi foi em 1989. Meus filhos só conhecem golpe, regime de exceção, pelo livro de história. E minhas netas, eu espero também, que só venham a conhecer pelo livro de história.
Então, a democracia é o direito de se manifestar, mas é também o reconhecimento do resultado das urnas. Não tem terceiro turno na eleição brasileira. Acabou a eleição, acabou. Quem ganhou ganhou, quem perdeu perdeu. Nós perdemos três eleições sucessivas presidenciais. Eles perderam quatro. Então, faz parte reconhecer o resultado e houve uma tentativa insistente no reconhecer o resultado. Primeiro que a urna tinha que ser auditada, porque só pra presidente ela tinha errado. Pra governador, senador, deputado, governador, não... Mas, pra presidente, podia ter uma suspeição. Depois, uma suspeição sobre a prestação de contas da presidenta, uma devassa completa. E foi aprovada por unanimidade. Depois, a tentativa de associá-la às investigações de corrupção da Petrobras, que nunca houve qualquer indício.
Não há o que arquivar [em relação ás investigações da Lava jato] porque não há qualquer sinal de participação da presidente. Eu tenho absoluta convicção do que estou dizendo. Essa cultura não pode ser estimulada. Então, quem é oposição tem que ser oposição, tem direito de reivindicar, mas tem que ter diálogo, tem que ter negociação. Não pode ter ódio, intolerância, isso não constrói uma cultura democrática, que é a grande conquista da nossa geração.
Cristiana Lôbo - O senhor fala que não pode ter violência, ódio. A própria convocação dessa manifestação dessa sexta-feira foi muito em cima de uma reação própria... O ex-presidente Lula disse que iria convocar o “exército do Stédile”. O líder do MST, o João Pedro Stédile, também fala em que as elites querem tomar o poder. O presidente do PT disse que os petistas, a militância, não devem baixar a cabeça. O senhor acha que essa convocação está sendo contaminada com um tom a mais de um lado e de outro, de parte a parte?
Aloizio Mercadante - Eu estou vendo agora no início da tarde as manifestações. Até agora não tiveram qualquer incidente. É um pessoal que está acostumado a se manifestar. Assim como a oposição tem também uma tradição de manifestação... Manifestação menos, mas de capacidade de convocação, de mobilização. Só espero que não prevaleçam grupos que são radicalizados, que tem como proposta o protesto violento. Isso aconteceu em várias manifestações desde 2013. E há um setor claramente golpista, defendendo por vários mecanismos uma política de golpe, o não reconhecimento do resultado da eleição. Isso não é bom pra democracia brasileira. Mas eu acho que eles não minoritários, serão derrotados.
Cristiana Lôbo - O senhor sabe quem é exatamente?
Aloizio Mercadante - Tem várias manifestações públicas nessa direção e várias manifestações que já aconteceram contra...
Cristiana Lôbo - Não na oposição, não na oposição institucional.
Aloizio Mercadante - Entre as oposições...
Criatiana - Não a oposição partidária.
Aloizio Mercadante - Espero que não. Eu acho que tem um setor da oposição que vem também da luta democrática, uma cultura democrática e tem que claramente ter uma posição firme na defesa desses valores. Agora, eu acho que isso tudo passa. Eu acho que nós estamos num momento de ajuste da economia. Houve uma alteração no cenário internacional forte. A China teve a pior taxa de crescimento dos últimos 25 anos no ano passado. A economia chinesa continua desacelerando. As commodities que o Brasil exporta caíram muito fortemente no final do ano passado pra cá.
Isso tem impacto na economia brasileira. A Europa não conseguiu se recuperar. Acho que é única economia importante que vem se recuperando são os Estados Unidos. E o Brasil não tem como levar adiante a politica anticíclica que nós fizemos. Não dá pra continuar desonerando impostos como nós fizemos, fomos longe demais no ano passado. Essa é a essência das medidas que estão sendo feitas.
Tem que corrigir algumas políticas, evitar excessos, distorções, mas isso é uma coisa passageira. Os fundamentos da economia brasileira são sólidos. Nós somos uma economia diversificada, esse câmbio mais competitivo vai alavancar as exportações da indústria, da agricultura. Compensa um pouco a queda de preços nos produtos agrícolas. E a economia do segundo semestre pro final do ano retoma seu crescimento. Então temos uma transição, tem um sacrifício a ser feito. Mas tem que saber que isso faz parte da vida. Às vezes a gente precisa ajustar pra poder sair mais forte, com mais perspectiva de crescimento.
Cristiana Lôbo - Qual mea culpa o governo faria em relação à condução econômica, por exemplo? Porque os especialistas dizem que esse ajuste está sendo mais duro do que se imaginava porque ele está atrasado, porque ele deveria ter sido feito três anos atrás. E agora, pra ter credibilidade, ele tem que ser mais vigoroso. Qual o mea culpa que o governo faz em relação à política econômica do ponto de vista doméstico? O senhor já falou do ponto de vista externo.
Aloizio Mercadante - A crise começou em 2008, 2009, e a maior crise econômica internacional desde 1929. A estratégia do Brasil de fazer uma política anticíclica, ou seja, alavancar o investimento, o gasto, reduzir impostos, estimular produção, preservar o mercado de emprego, o emprego e a renda da população, foi uma estratégia absolutamente exitosa. Você veja que nós crescemos nesse período de 2009 a 2013 em torno de 17%. Os Estados Unidos, em torno de 7,5%. A Europa cresceu -1%, e o Japão, teve uma taxa negativa de crescimento. E a China caiu para um patamar muito abaixo, porque ela crescia 11, 12, 13% e caiu para 7% ao ano.
A estratégia do Brasil foi exitosa. O que é que aconteceu? É que nessa segunda rodada da crise ela não atingiu primeiro pela queda das commodities - minério de ferro, soja, produtos que o Brasil exporta. Segundo, por uma seca muito forte prolongada e agora atingindo o Sudeste. Não só o Nordeste, que está há três anos. Atingiu os reservatórios de água, obrigou o governo a fazer um grande esforço para manter a oferta de energia. E só foi possível pelos investimentos que foram feitos antes com termelétrica, usando principalmente o gás. É uma energia muito mais cara. Isso tem que ser passado pro consumo em algum momento. E nós estamos repassando. Isso pesa no orçamento das pessoas, mas não tem saída, porque água o custo é zero. O gás, o custo é elevado. Gás ou óleo diesel e óleo combustível. Nós tivemos aí um aumento do custo da energia.
E no ano passado, o esforço anticíclico foi longe demais. Por exemplo, nós desoneramos as folhas de pagamento. Estava correto. Por quê? Começou em quatro setores da indústria muito atingidas por um câmbio muito apreciado. O real estava muito forte. Depois disso, foi se estendendo para todo o setor de serviço, comércio, indústria, agricultura. Aí começou a pesar muito nas finanças. Nós estamos perdendo R$ 25 bilhões de receita. Então, tem que ter uma correção. Não retirar todo esse incentivo. Ele foi importante, é importante pra manter empregos, desonerar as empresas, mas alguma correção tem que ser feita. A mesma coisa a Cide. No ano passado, o petróleo chegou a US$ 120 o barril. E a oposição falava: "tem que reajustar". Nós não reajustamos. Esse ano, que caiu para US$ 50, nós também não reduzimos. Eaí é possivel...
Cristiana Lôbo - Aumentou...
Aloizio Mercadante - Não, por quê? Porque você corrigiu um pouquinho, 3% no final do ano e você introduz a Cide. Por que a cide? Porque é uma receita tributária. Como não há perspectiva de aumento no preço do petróleo internacional ao longo desse ano, você consegue fazer esse reajuste, melhorar a receita, dividir o sacrifício por toda a economia, sem precisar fazer um aumento de petróleo, que ficou contido ano passado. O preço do petróleo no Brasil é muito estável na ponta, no consumidor. E isso é uma politica também inteligente, como Estados Unidos, alguns países que tem capacidade de produção conseguem fazer.
Um outro fato que está presente nesta conjuntura não é uma crise de corrupção como alguns tentam mostrar. O que nós temos no Brasil é o fim da impunidade. A corrupção existe há muito tempo. Mesmo essa da Petrobras, está evidente que existia há décadas anteriores.
Cristiana Lôbo - Mas ela foi institucionalizada nos últimos anos...
Aloizio Mercadante - É a palavra de um delator, que não conta o que aconteceu antes, né? Esse delator... são todos funcionários de carreira que dizem que roubavam há muitos anos na empresa. Então, havia um esquema de corrupção na empresa. Não em todas as diretorias, não em todos os setores. Mas eram responsabilidades especificas. É grave? Muito grave. Está sendo combatida? Com toda a energia. A Polícia Federal tem autonomia, o Ministério Público, a CGU. Todos os organismos de estado estão apurando, estão investigando. E as pessoas que estão sendo investigadas... Que não é uma condenação, é outra coisa. Aparece um nome de um homem público, parece que já é uma condenação final. Eles não foram nem ouvidos, não teve direito de defesa. É o inicio de um processo de investigação. Agora, o que choca a sociedade? É que isso não acontecia. Jogava tudo pra debaixo do tapete...
Cristiana Lôbo - O volume, o volume de recursos...
Aoizio Mercadante - O volume é muito grande. Para o tamanho da Petrobras, não é significativo. Mas é muito grande, é inaceitável, absolutamente inaceitavel. Então as empresas que praticaram isso terão que ser punidas. A CGU, o TCU, os órgãos de controle, Ministério Público, vão identificar quais são os ganhos indevidos. Elas terão que pagar isso em multas elevadas pelo que fizeram. Os gestores e diretores terão que ser punidos criminalmente. Agora, que que é fundamental? Que haja um termo de ajustamento de conduta. E que a gente não caminhe na direção de quebrar as empresas, como aconteceu com a Delta. Você investiga e quebra uma empresa. Uma empresa, muito bem... É possível absorver. Um setor inteiro, que tem décadas de engenharia, você não pode tratar com essa leviandade, essa irresponsabilidade. Então, vamos punir as empresas, elas serão punidas.
Cristiana Lôbo - Na época da delta, foi uma decisão de governo torná-la inidônea.
Aloizio Mercadante - Não, porque a legislação nova anticorrupção, ela torna inidônea a empresa que não fizer um acordo de leniência. A empresa tem que ir na CGU, e dizer: olha, eu quero colaborar com a investigação. Dois: estou disposto a calcular os ganhos indevidos e pagarei tudo que eu tive indevidamente do estado brasileiro. Três: farei um termo de ajustamento de conduta para que isso não se repita. E inclusive tem uma regulação que está sendo concluída que tudo isso é equilibrado, o tamanho da multa que vai ser paga. Então, nós não tínhamos esse instrumento antes. O Brasil só tinha a lei de licitações, que o único caminho era a inidoneidade. Agora, tem uma lei mais moderna, que é uma lei muito parecida com o que existe na Europa e nos Estados Unidos, que a empresa é punida, mas a essência é preservar a empresa. A mesma coisa [ocorre com] a lei de falência. Nós tínhamos uma lei que a empresa está com dificuldade e fale. Não, agora não. Alei é de recuperação das empresas. Então, tem que manter o emprego e a produção.
Cristiana Lôbo - A questão da Petrobras foi tão... números e cifras tão gigantes que a própria companhia não conseguiu até hoje fazer seu balanço e identificar o que houve de corrupção, o que houve de propina e o que houve de má gestão. Já tem uma perspectiva pra companhia ter o seu balanço?
Aoizio Mercadante – O Ministério Público já lançou aí uma estimativa do que pode ter acontecido ao longo das ultimas décadas.
Cristiana Lôbo - E aí é esse valor que a companhia vai registrar como balanço?
Aloizio Mercadante - Não, isso quem está cuidando é a diretoria da Petrobras. Ela está levantando os dados, ela está consultando a comissão de valores imobiliários, a SEC americana, que é uma empresa de capital aberto. Agora, houve uma barbeiragem ali naquela discussão de valor de mercado. Aquilo não tem nada a ver com corrupção. O valor justo de mercado é valor dos ativos nesse momento. Se você fizesse com o barril de petróleo a 120 dólares, os ativos valem totalmente diferente do que valem com os ativos a cinquenta dólares. O valor justo de mercado só se justifica quando você quer comprar ou vender um ativo. Não é o caso. Então aquilo ali foi trabalhado como uma informação enviesada, como se fosse alguma coisa... e não tem, associada a corrupção. A corrupção é uma parte pequena. Ela é relevante, mas é pequena para os desequilíbrios de ativos que existem em função sobretudo da flutuação do câmbio e do preço do petróleo. Aquilo ali está descartado.
Quer dizer, você pega o Bendine, presidente da Petrobras. Tem 37 anos de serviço publico num banco que tem 200 anos de historia, que é o Banco do Brasil. Então é um homem que tem uma carreira publica. Mas é um homem que tem vivência de mercado. A graça é uma mulher íntegra, até agora não tem uma única acusação em relação a ela. Isso também a imprensa foi muito injusta em relação a uma mulher integra, séria, nunca fui acusada por quem quer que seja até este momento. E tenho certeza que será assim até o final. Mas ela não tinha a vivencia de mercado numa empresa complexa, com uma crise de confiança, como a Petrobras. Então, eu acho que jogando no balanço o prejuízo, resolvendo esse passivo, e a empresa esta batendo recorde de produção, recorde no pré-sal, é a empresa que mais produz petróleo no mundo, de capital aberto, tem reservas estratégicas... é a empresa absolutamente estratégica para o Brasil. Acho que ela vai sair fortalecida dessa depuração, dessa mudança, porque ela foi vítima de um esquema. E todos aqueles que praticaram, pessoas físicas ou empresas, terão que ser punidas.
Cristiana Lôbo - Ministro, voltando às manifestações, pra encerrar, qual vai ser a reação do governo a partir da semana que vem, a partir dessas manifestações? O governo vai tomar algumas medidas, vai anunciar, por exemplo, o pacote anticorrupção? Já há alguns dias e até hoje não saiu. É esse o caminho que o governo vai?
Aloizio Mercadante - Eu acho que nós temos que primeiro ouvir as ruas, como fizemos em 2013. Ouvir quais são as reivindicações legítimas. Uma parte não quer negociar, não quer dialogar, mas uma parte mais significativa da sociedade quer o melhor pro brasil. Não tá no "quanto pior, melhor". As pessoas sabem que nós estamos todos... dependemos, pro emprego, pra renda, pra vida das pessoas, ter responsabilidade com a nação. Então, tem que ouvir quais são as reivindicações, quais são os temas. E buscar avançar na agenda do país. Nós precisamos fazer o ajuste fiscal. Isso vai manter o grau de investimento do país. Isso vai dar investimento. Como nós fomos prudentes ao longo de todos esses anos do ponto de vista da nossa dívida publica, que ela vem caindo consistentemente, isso vai atrair muito investimento externo. Tem muita liquidez internacional. Nós temos uma agenda muito positiva de novas concessões: aeroportos, portos, estradas, rodovias, setor elétrico. Tem muita coisa pra gente fazer parceria público-privada.
Além das concessões, eu diria que nós temos uma agenda de desburocratização do estado. Por exemplo, fechamento de empresa hoje é online. Nós vamos fazer, pra abertura de empresa, facilitar a relação do cidadão e das empresas pro estado brasileiro.
Cristiana Lôbo – Por que o senhor acha que as pessoas ficaram com, vou usar uma palavra que está sendo usada... com esse mau humor a ponto de convocar uma manifestação, irem pra rua protestar contra o governo?
Aloizio Mercadante - Já houve isso no passado, em 2013. Foram manifestações espetaculares pelo tamanho. Isso faz parte do processo democrático. Eu acho que.... dizer o seguinte: "não, a presidenta não fez o que disse". Nós temos quatro anos de governo. Nós só temos dois meses de governo. Então, é preciso que se dê um tempo para que as coisas aconteçam e elas vão acontecer.
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