quarta-feira, 27 de abril de 2016

A indissolubilidade do casamento e o defensor do vínculo

O santo padre, ao editar as mudanças no processo de nulidade, teve em mira apenas agilizar o procedimento judicial. No entanto, a salvaguarda da indissolubilidade sempre foi um cuidado pastoral constante, evidenciado em vários pontos da nova legislação
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As recentes alterações do código canônico não implicam uma desvalorização do princípio da indissolubilidade do matrimônio válido e consumado. O apanágio da indissolubilidade do vínculo nupcial consiste em um ensinamento que deve ser crido com fé católica ou divina.
O santo padre, ao editar as mudanças no processo de nulidade, teve em mira apenas agilizar o procedimento judicial. No entanto, a salvaguarda da indissolubilidade sempre foi um cuidado pastoral constante, evidenciado em vários pontos da nova legislação.
Uma das inovações mais importantes do processo de nulidade diz respeito à extinção do recurso de ofício, exatamente para tornar mais ágil a prestação jurisdicional. Com efeito, o tribunal de primeira instância, após declarar a nulidade do matrimônio, não submete mais o veredicto automaticamente à craveira da corte superior. A eventual análise da idoneidade da sentença pela segunda instância dependerá de uma apelação, interposta quer por uma das partes (os cônjuges) quer pelo defensor do vínculo.
Está ainda em pleno vigor, é claro, o princípio de que o matrimônio sub judice goza do favor do direito (cânon 1060), ou seja, se o demandante (autor da ação) não conseguir provar a invalidade do conúbio, a presunção relativa (juris tantum) pesa a favor da cabal higidez do sacramento.
No que toca à garantia da indissolubilidade do casamento canônico, o defensor do vínculo desempenha um papel conspícuo. A propósito, a própria locução “defensor do vínculo”, por si só, denota o múnus desse operador do direito: defender ou proteger o vínculo inquebrantável, de direito divino, que se estabelece entre os nubentes, quando o himeneu deles é válido e consumado.
Em face do processo de nulidade ora vigente, com as modificações do papa Francisco, creio que o mister do defensor do vínculo se torna nimiamente relevante, pelo simples fato de que se derrogou o recurso ex officio ou automático. Quem velará pelo casamento válido? É óbvio que todos os operadores do direito canônico, grosso modo,  têm a obrigação de zelar pelo princípio da indissolubilidade. Em primeiro lugar, os juízes, aos quais incumbe avaliar o caso concreto. Haja vista as idiossincrasias do processo canônico, até mesmo os advogados ou patronos possuem esta celsa missão, como bem evidenciou o ínclito canonista pe. dr. Manoel Arroba Conde, aquando de brilhante palestra proferida no Simpósio Internacional de Direito Canônico, ocorrido em fevereiro de 2016 no Rio de Janeiro. Deveras, declarou o professor Arroba: “É sobretudo na preparação da causa onde com maior clareza se apresenta a corresponsabilidade institucional que caracteriza a deontologia da advocacia canônica nas causas de nulidade, conjugando sua função de serviço à verdade e as teses da parte assistida.”
Assim como assim, a incumbência de abroquelar, digamos, com unhas e dentes, o casamento válido, porfiando impavidamente contra qualquer sentença judicial que vulnere o sacramento, corresponde, de ofício, ao defensor do vínculo. Daí a imperiosidade de esse profissional exercer seu cargo com garantias institucionais. As referidas garantias não são personalíssimas, isto é, não pertencem à pessoa física que exerce a defensoria do vínculo. Trata-se, destarte, de garantias com vistas na incolumidade do sacramento e, em última análise, em benefício do povo de Deus.
Que garantias são estas? No âmbito do direito eclesial, penso, principalmente, na inamovibilidade do defensor do vínculo. Este profissional deverá ser nomeado pelo bispo moderador do tribunal e não poderá ser destituído, salvo na hipótese de cometimento de algum delito grave. Este dispositivo visa a conferir tranquilidade ao defensor do vínculo, que não estará sujeito a qualquer interferência no exercício de sua função. O defensor do vínculo há de atuar sem respeito humano ou mesmo temor de perder o cargo, em outras palavras, desempenhará seus altos serviços com independência total.
Infelizmente, sabemos que existe um número enorme de casamentos írritos ou só aparentemente válidos. Esta vicissitude se atribui a diversos fatores da sociedade pós-moderna. Nada obstante, para que uma sentença de nulidade de casamento seja prolatada com respaldo  na verdade real e arrimada em provas robustas, o processo não pode prescindir de um defensor do vínculo assertivo e independente. Um profissional desse nível, dessa qualidade, só existirá na prática se houver as devidas garantias do exercício desembaraçado e eficaz da defensoria do vínculo.
Zenit

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