Quando o contato atrapalha o lazer e descanso do empregado são devidas horas extras.
A preocupação do momento é com o WhatsApp.
Por André Ribeiro Molhano Silva*
Não raro os ramos do Direito precisam se adaptar às mudanças ocorridas no mundo. Por ser uma ciência ligada à realidade fática, os estudos jurídicos devem se adequar aos valores dos novos tempos, ao progresso social, cultural, econômico, tecnológico, não deixando de caminhar, independentemente dos velhos paradigmas, ainda que, por causa deles, a passos mais lentos do que necessário.
O Direito do Trabalho, por exemplo, teve origem em um momento de crise humanitária, como contraponto aos problemas sociais trazidos pela Revolução Industrial. Naquele momento histórico, dada a empolgação com os avanços tecnológicos da época, o alto índice de acidentes do trabalho, os salários miseráveis e as excessivas jornadas, foram inevitáveis. Fez-se, portanto, urgente a quebra de paradigma, com mudanças a fornecer melhores condições de trabalho.
Essa discussão é mais atual do que parece. Vivemos mais uma era da revolução tecnológica. Carros que se dirigem sozinhos1 (possivelmente eliminariam o seguimento empregatício de transporte privado de passageiros) e óculos de realidade virtual2 (extinguiria a necessidade da presença física no estabelecimento) são novidades que, embora previstas há muito na ficção científica, começam a tomar forma e devem, em médio prazo, ser objeto de regulamentação jurídica. A preocupação do momento, contudo, no que diz respeito ao teletrabalho, é principalmente com os serviços de mensagens instantâneas, como o WhatsApp .
O teletrabalho é espécie de trabalho a distância, prevista no artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), sendo executado por meio da informática ou telecomunicação. Portanto, se fora dos limites da corporação, o empregado trabalhar utilizando-se de tais recursos tecnológicos, em tese estará configurado o teletrabalho, contando este ínterim como tempo de serviço.
Recentemente, o Ibope3 revelou que o WhatsApp é o aplicativo mais popular do país, contando com 93% dos brasileiros conectados à internet. Nesse sentido, é natural que este aplicativo tenha reflexos no âmbito do mercado de trabalho, como verdadeira reprodução do espaço físico da empresa.
De fato, a utilização do WhatsApp, bem como de outros meios instantâneos de comunicação, é de grande valia, visto que corta gastos e economiza tempo. Conversas individuais ou em grupos entre empregados e empregadores, cujo conteúdo abrange reclamações, elogios, ordens, regulamentos empresariais, e notícias diversas de interesse da empresa são uma realidade imutável.
Todavia, quando a facilidade de se comunicar atrapalha momentos de lazer e descanso do empregado é possível, em tese, o recebimento de horas extras, uma vez que é exigido o desempenho de atividade laboral fora da jornada normal de serviço. Tal conclusão é inevitável, principalmente naqueles casos em que a própria remuneração do empregado depende disso, uma vez que as conseqüências de não responder o empregador podem ser desastrosas para a carreira do indivíduo.
No tocante às horas extras e horas de sobreaviso, é importante ressaltar que sua configuração depende, é claro, do caso concreto. Aliadas a outras provas, é possível se chegar à conclusão de que nas situações não eventuais em que o empregado continue sob subordinação do empregador por meio do WhatsApp, realizando tarefas típicas de sua jornada, haveria a incidência de horas extras. Há, inclusive, decisão do TRT da 3ª Região neste sentido4. Contudo, estas mesmas decisões ressaltam que conversas de teor informal, nas quais reste demonstrada ausência de controle do empregador não dão direito a qualquer acréscimo, nos termos do que dispõe a Súmula 428, do TST.
Outro ponto que merece atenção é a suposta obrigatoriedade que tem, o empregado, de responder às mensagens de seu empregador. A princípio, não havendo qualquer previsão contratual em sentido contrário, entende-se que o trabalhador pode se negar a responder a mensagem quando lhe for exigida a realização de atividade fora do horário normal de trabalho. Em razão disso, o recomendável é que a comunicação por estes meios seja acordada o mais breve possível.
Por fim, já existe jurisprudência5 afirmando ser possível a dispensa de empregado, a configuração de dano moral, assédio moral e assédio sexual, a depender do conteúdo das mensagens trocadas pelo aplicativo. Assim sendo, é prudente adotar a mesma cautela e respeito com que se porta fisicamente na empresa, visto que o Judiciário tem reafirmado a tese de que o WhatsApp passou a ser, de fato, uma extensão do ambiente de trabalho.
1) http://goo.gl/skglOn
2) http://goo.gl/l2hqC7
3) http://goo.gl/3uMHBL
4) Processo nº 00457-2015-038-03-00-5
5) http://goo.gl/2pmOiN
*André Ribeiro Molhano Silva é advogado graduado pela Escola Superior Dom Helder Câmara.
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