terça-feira, 27 de setembro de 2016

Papa e Patriarca não irão rezar juntos na Geórgia

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Igreja Católica mostra vontade de restaurar a plena comunhão com as igrejas ortodoxas.

Por Gianni Valente

O Patriarca Ortodoxo da Geórgia e o Papa Francisco trocarão cumprimentos cordiais e falarão um ao outro. No dia 1º de outubro, acenderão velas juntos na catedral patriarcal de Svétitskhovéli, em Mtskheta. Mas, na programação oficial,  não contam com um momento de oração conjunta durante a visita a Geórgia. 

Fontes ligadas ao Patriarcado Ortodoxo da Geórgia, citadas pela agência austríaca Khatpress, quiseram deixar clara esta informação, dois dias antes que o Bispo de Roma chegar em visita ao país. O papa irá receber a mesma acolhida de um “chefe de Estado”, segundo a hospitalidade tradicional da Igreja da Geórgia. Diferenças doutrinais, no entanto, entre a ortodoxia georgiana e as igrejas católicas fazem com que seja impossível o patriarca rezar em público com o papa.

Na verdade, estas declarações vindas da parte do Patriarcado Ortodoxo da Geórgia não devem surpreender aos que estão familiarizados com o tema e, muito menos, com o Vaticano: a programação da visita publicada pela Sala de Imprensa do Vaticano no dia 12 deste mês não inclui uma sessão pública de oração trazendo Elias e Francisco juntos.

A Igreja Ortodoxa Georgiana é conhecida pela sua interpretação rigorosa dos cânones pertencentes à sua própria tradição eclesial, o que sempre causa turbulência nas relações com o movimento ecumênico e com igrejas irmãs do mundo ortodoxo. Somente uma coisa pode explicar a sua participação inicial – em 1948 – no Conselho Mundial de Igrejas: o fato de que, na época, este organismo representava uma oportunidade preciosa para abandonar a Cortina de Ferro e comunicar-se com as igrejas ortodoxas de todo o mundo.

Mas na Assembleia Geral de Vancouver em 1983, a Igreja Ortodoxa Georgiana parou de participar ativamente nas iniciativas do Conselho Mundial de Igrejas e, mais tarde, retirou-se desta rede de igrejas e comunidades de igrejas. Ela igualmente se ausentou do Concílio Pan-Ortodoxo celebrado em Creta, em junho de 2016. No entanto, acabou participando da sessão realizada pela Comissão para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e a Igreja Ortodoxa em Chieti, de 15 a 22 de setembro: aí, eles assinaram um documento sobre primazia e sinodalidade, que acabou recebendo uma aprovação unânime quando exigiram que o documento emitido ao final do encontro incluísse a referência ao “desacordo” deles com relação a alguns pontos contidos no texto então aprovado.

A Igreja Ortodoxa Georgiana demostrou a mesma reação rígida para o ecumenismo quando João Paulo II visitou o país em novembro de 1999. O Papa e o Patriarca não realizaram uma sessão conjunta de oração naquela ocasião. O que cimentava a visita papal era a ênfase no período pós-1989 e a queda do Muro de Berlim, cujo 10º aniversário estava sendo celebrado na época.

Na ocasião, o papa polonês foi recebido pelo ex-presidente georgiano Eduard Shevardnadze, que fora o ministro de Relações Exteriores de Mikhail Gorbachev na fase final da União Soviética. A vista papal aconteceu numa atmosfera de celebração à luz destes eventos políticos. Wojtyla descreveu essa visita como o “resultado de circunstâncias extraordinárias” e um “evento que simbolizou o início de uma vida nova em muitos países”. O próprio Shevardnadze estava bastante interessado na visita do papa, o que via como uma parte necessária de sua estratégia política de reaproximação com o Ocidente. Até mesmo o Patriarca Elias, no discurso de recepção que fez a João Paulo II, referiu-se à visita como “um evento político importante”.

O contexto em que a visita do Papa Francisco à Geórgia está para acontecer é bem diferente. A amizade fraterna entre ele e o Patriarca Ecumênico Bartolomeu e o encontro dele com o Patriarca Kirill, da Rússia, ocorrido em Cuba, são os dois sinais mais óbvios da vontade da Igreja Católica de restaurar a plena comunhão com as igrejas ortodoxas. Essa viagem deve ser feita em conjunto, sem forçar o ritmo ou exercer pressão. Ela deve acontecer sem se tentar organizar cenários litúrgicos forçados apenas para se sair bem na foto.

O Papa Francisco está ciente disso tudo e respeita as dificuldades enfrentadas por muitas igrejas ortodoxas que estão sendo pressionadas pelos “talibãs ortodoxos”, conforme referiu o Metropolita Ioannis Zizioulas – teólogo cristão vivo de maior destaque. Estes são grupos organizados que fazem muito barulho e distorcem referências em prol da fé ortodoxa, apresentando-a como uma ideologia identitária. Estes indivíduos são rápidos em estigmatizar traidores: patriarcas, bispos e teólogos mais inclinados a reconhecer e a praticar a unidade em Cristo com outros cristãos. É por isso que é necessário ter paciência, para que se possa esperar por todos e evitar deixar alguém para trás numa caminhada que ninguém tem condições de completar sozinho, sem a intercessão do Espírito Santo.

Vatican Insider / IHU - Tradução: Isaque Gomes Correa.

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