Surreal

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O surrealismo presava pela expressão plena do pensamento, sem preocupação com ordenamento lógico, uma espécie de emergência do inconsciente.

O encontro entre Dali e Freud é matéria prima para a comédia de Terry Johnson.

Por Gilmar Pereira

​Aspiramos uma libertação. Sim, queremo-la. Estamos presos, você e eu, nos velhos hábitos, nos velhos costumes, nos velhos trajes daquilo que nos ditaram aqueles que passaram.  Quem são os antigos? Perguntava à minha mãe quando criança. Dizia-me que diziam que isso não era bom, que aquilo outro trazia mau agouro. No disse-me-disse se ia assumindo tradições.

“Não. Isso não pode. É absurdo” – censuram a impossibilidade de pensar diferente, de romper com o estabelecido. O novo quer emergir e a história (dos vencedores) sufoca o presente e só faz repetir o mesmo. Por isso o revival, por isso o vintage, por isso o retrô. E apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos primeiros pais. Somos Adão e Eva e nosso pecado permanece o mesmo. O eterno retorno é o inferno.

Desculpa se não tenho lógica, tenho fome. Quero comer minha própria carne e ficar cheio de mim. Toda saciedade vem de dentro e o eremita do tarot nunca vai encontrar a luz que busca e que, diante dos próprios olhos, deixa-o cego. Agostinho também buscava fora o que ali estava, a Luz Imutável. Todos buscamos, menos os loucos. Sua ausência de sentido é sentido em si mesmo, não aponta para lugar nenhum. Isso porque nos fizeram crer que havia uma linha e tudo era ponto. Não caminhamos na história, não vamos para lugar nenhum. Estamos numa dízima periódica, que é um número que não se acaba, que vai avançando sem sair do lugar.

Decifra-me e me devore. Dou-te passagem para o labirinto do Minotauro. E se quiseres vencer essas linhas desconexas sobrevoando pelas palavras, o sol de tua razão derreterá tuas asas. Dédalos não teve melhor sorte do que Ícaro. A verdade está no entre, na brecha, na fissura, na fronteira. Que espaço sem definições claras, que abrange sem poder ser abrangido. Quem aí penetra morre e pela morte vive. Lugar de passagem onde ninguém pode viver. Experimenta-se a verdade num entra e sai de pequenas mortes, passagens para a vida.

Quando Dali encontra Freud

O surrealismo presava pela expressão plena do pensamento, sem preocupação com ordenamento lógico, uma espécie de emergência do inconsciente. O movimento artístico-literário foi muito influenciado pela psicanálise de Freud e teve como um de seus maiores expoentes Salvador Dalí. Imagine, então, um encontro entre os dois. Pois bem, isso aconteceu de verdade. No final de sua vida, fugindo da dominação nazista, o pai da psicanálise partiu para Londres e lá conheceu o pintor espanhol. O encontro em si foi muito estranho, dado que Dali não falava nem alemão, nem inglês. Freud, por sua vez, não era muito simpatizante dos surrealistas, mas se encanta com o artista que estava conhecendo, apesar da estranheza. Deste encontro histórico, e algo inusitado, surge a matéria prima para Histeria, comédia escrita pelo aclamado dramaturgo inglês Terry Johnson.

Com elenco formado por Pedro Paulo Rangel, Cassio Scapin, Erica Montanheiro e Milton Levy, o espetáculo Histeria desembarca em Belo Horizonte para duas apresentações no Palácio das Artes, nos dias 26 e 27 de novembro. Escrita em 1993, a comédia de Terry Johnson ganhou direção de John Malkovich e sua montagem foi aclamada por diversos países da Europa, com grande sucesso de público e crítica. Depois de assistir e se encantar com a montagem em Paris, Jô Soares traduziu o texto e dirige a versão brasileira da comédia consagrada pelo mundo. Ingressos à venda pelo site Ingresso.com.

Histeria

Classificação: Livre – Menores de 12 anos somente acompanhados de pais ou responsáveis

Local: Grande Teatro do Palácio das Artes

Data: 26 e 27 de Novembro | 20h30 e 18h30, respectivamente

Ingressos à venda nas bilheterias do teatro ou pelo site Ingresso.com www.ingresso.com/belo-horizonte/home/.

Informações: (31) 3236-7400

Gilmar Pereira

Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, graduado em Filosofia pelo CES-JF, graduando em Teologia pela FAJE. Apaixonado por arte, cultura, filosofia, religião, psicologia, comunicação, ciências sociais... enfim, um "cara de humanas". Escreve às sextas-feiras.