segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Albert Camus em busca da felicidade

O mundo celebra os 100 anos de Albert Camus e de sua obra iluminadora



Albert Camus: os homens morrem e não são felizes (Foto: Arquivo)
Por Marco Lacerda*

Albert Camus (1913-1960) foi um escritor, romancista, ensaísta, dramaturgo e filósofo francês nascido na Argélia há exatamente um século. Foi também jornalista militante engajado na Resistência Francesa e nas discussões morais do pós-guerra. Na sua terra natal viveu sob o signo da guerra, fome e miséria, elementos que, aliados ao sol, formam alguns dos pilares que orientaram o desenvolvimento do pensamento do escritor.
Camus foi agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura de 1957 por sua importante produção literária (na qual se inclui o célebre ‘O estrangeiro’), que, com seriedade lúcida, ilumina os problemas da consciência humana em nossos tempos. Camus morreu num desastre de carro em que também perdeu a vida o editor Michel Gallimard. Este ano comemoram-se os 100 anos do seu nascimento.
Houve um tempo em que seus detratores o chamavam de “filósofo de universitários”, rótulo que ainda vigora entre não poucos acadêmicos. De fato, como salientou Jean-Paul Sartre antes mesmo de conhecê-lo, “Camus mostra uma certa malícia ao citar textos de Jaspers, Heidegger e Kierkegaard quando, na verdade, seque entendia bem esses autores”. Em ‘O mito de Sísifo’ ele citava trechos picantes de Schopenhauer ao discorrer sobre o suicídio em jantares de intelectuais burgueses.
A verdade, porém, é que Schopenhauer nunca defendeu o suicídio, muito pelo contrário. Esse tipo de erudição não era própria dele, como esclarece o Sartre dos bons tempos: “Seus verdadeiros mestres são outros. O contorno dos seus argumentos, a clareza de suas idéias, seu estilo de ensaísta e um tipo raciocínio ordenado, cerimonioso e desolado, tudo nele tem as características de um clássico mediterrâneo”.
Filósofo ou espontâneo?
Mais tarde foi influenciado também por Czeslaw Milosz, a quem sempre foi agradecido ter sido um dos pouquíssimos intelectuais que o acolheram quando fugiu do comunismo, além de defendê-lo da acusação de que carecia de um doutorado em Filosofia. Em primeiro lugar, o que se entende por Filosofia. Para alguns, como Camus, a Filosofia exige uma alimentação quase carnal.
Porque você escreve romances e peças de teatro, perguntavam-lhe os filósofos. “Para viver melhor”, respondia.
Afinal, Albert Camus era ou não um filósofo? Para muitos ele foi ‘um espontâneo’ que passou pela filosofia sem levar nada mais além da vergonha de aceitar uma existência sem reflexão. O elemento que utilizou para dar seus primeiros passos na improvisação foi o absurdo, mais que palavras e menos que conceitos.
O absurdo não é o sentido do mundo, mas a falta de sentido em um mundo que nós – os inventores e órfãos do sentido – reclamamos que o mundo tenha. O homem se encontra diante do irracional. Sente em si mesmo o desejo de felicidade e razão. O absurdo nasce dessa confrontação entre o grito humano e o silêncio sem razão do mundo. O absurdo não é um dado fundamental, mas um divórcio: a demanda dos homens e a recusa do universo em responder – um amor impossível.
Beco-sem-saída
Para Camus, a democracia – depreciada pelos revolucionários, inclusive Sartre – tem o grande mérito de solicitar modéstia: ninguém pode fazer tudo sozinho, precisa do conselho de outro e de acordo. Intelectualmente, o absurdo é um beco-sem-saída, embora a vida consista precisamente em fazer-nos crer que tem.
O muro que nos impede de seguir é de fato intransponível, mas pintamos voluntariosamente uma porta nele e a porta se abre ou pelo menos nos permite imaginar que abre e por ela saímos. É dessa porta pintada no muro da realidade que fala ‘O homem rebelde’, onde pela segunda vez o espontâneo Camus se mete uma vez mais na Filosofia.
O ser humano se rebela e ao fazê-lo descobre a humanidade que o vincula aos demais. Os dogmáticos da revolução compreenderam que ela forma parte do muro da realidade contra a qual se insurge o rebelde. “Os homens morrem e não são felizes”, resume Calígula. Cada homem pode rebelar-se contra o que impõe a morte e a infelicidade, descobrindo assim seus laços com os demais. E essa rebelião não é simples grandiloqüência, mas busca der soluções políticas, ou seja, contra o estado de guerra que insiste em manter-nos no ódio.
Rebelar-se contra a infelicidade do terror exige evitar o absolutismo decapitador dos princípios e muitas vezes ater-se aos matizes, às meias-tintas. Qão bem compreendemos, hoje, depois das contradições das primaveras árabes, a atitude flutuante de Camus ante o conflito na Argélia no final dos anos 1950?
Uma entrevista com Albert Camus. Veja o vídeo.

*Marco Lacerda é jornalista, escritor e Editor Especial do DomTotal

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