quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Um meio para melhorar o social

Marcus Eduardo de Oliveira

Das políticas econômicas esboçadas para atingir elevadas taxas de crescimento, estendendo essa conquista aos domínios daquilo que se convenciona comumente – e equivocadamente - chamar de progresso, duas tendências antagônicas ao longo do tempo podem ser verificadas: ou se busca esse progresso a qualquer custo, usando todo e qualquer meio para isso; ou se busca esse progresso com moderação, ou seja, numa linguagem mais aceitável, trata-se de buscar um crescimento com equilíbrio e parcimônia no trato e uso de recursos vindos da natureza.

Dessas opções, advêm algumas contextualizações importantes. Vejamos que o resultado da primeira escolha é previamente conhecido: a partir da busca de um progresso a qualquer custo abrem-se possibilidades concretas de se gerar mais custos (ambientais) que benefícios (econômicos e sociais).

Com isso, cria-se potencialmente o que se chama de caos ambiental; ainda que parcela significativa de economistas opte por desconsiderar, na essência, que crescimento econômico, em algum momento, irá inevitavelmente causar algum tipo de agressão ao meio ambiente.

Quanto à segunda opção, trata-se essencialmente do único caminho possível para se obter no decorrer do tempo ganhos sociais e econômicos substanciais. Nesse caso, os ganhos podem ser estendidos para todos, pois não há perdedores – nem o homem, nem a natureza e muito menos o sistema econômico apresenta algum tipo de perda.

Essa segunda opção está vinculada à corrente de pensamento da economia ecológica que considera que ao interagir com o meio ambiente o sistema econômico provoca alterações irreversíveis.

O professor Charles Mueller pontua, a esse respeito, que essa linha de raciocínio “rejeita a ideia que é ilimitada a capacidade do meio ambiente de fornecer recursos naturais e de absorver resíduos e poluição emanados pelo sistema econômico. Considera que, embora o meio ambiente seja dotado de resiliência, que o permite regenerar-se em resposta a impactos externos moderados, se a intensidade dos impactos se ampliar muito, essa resiliência poderá vir a ser comprometida”.

Ainda sobre a escolha dessa segunda opção, é importante pontuar uma evidência que tem sido muito comum escapar das páginas dos manuais econômicos: o homem precisa se manter em equilíbrio com a natureza, uma vez que é parte dela. Logo, é sensato ressaltar a relação biológica existente entre a economia e o meio ambiente. Por esse raciocínio, o sistema econômico pode ser visto como um “ser vivo” que faz o intercâmbio entre energia e matéria com o meio externo.

Todavia, não se pode conceber um modelo econômico que eleva o homem a uma condição superior em relação ao meio natural. Somos apenas uma parte da natureza. E, uma vez que somos apenas uma parte da natureza, é imperioso tratar as coisas da natureza com parcimônia, principalmente na extração de recursos para a promoção desse tal crescimento erroneamente confundido pela economia tradicional como sinônimo de progresso.

Não por acaso, a economia tradicional evoca ainda outro aspecto crucial: tenta promover uma pretensa “alegria” das sociedades – principalmente das sociedades pautadas pelo consumismo desenfreado – quando avaliza políticas que “valorizam” o ter, em detrimento do ser.

Essa falsa alegria está assentada na obtenção de qualquer coisa: é necessário ter (consumir, comprar) assim recomenda as “forças mercadológicas”.

Conquanto, reside aí outro ponto nevrálgico: a economia está para atender aos ditames de sociedades consumistas ou para promover, ad infinitum, a melhoria das condições de vida das pessoas? Cabe aos sistemas econômicos satisfazer os interesses sociais da maioria ou apenas de uma minoria privilegiada, por meio do consumo sem limites como tem sido prática comum?

Atentemos, antecipadamente, para um fato notório que envolve esse último comentário: no que tange à economia brasileira, tem se verificado a incidência de um sistema antissocial patrocinado pela economia que defende apenas interesses de uma minoria privilegiada pela condição financeira da qual essa é portadora. Nesse sentido, só uma coisa tem valor: o poder de compra; a demanda efetiva.

Ora, tal constatação fere essencialmente o princípio básico da “criação” de uma ciência social que floresceu no campo teórico sobre a crítica das condições desfavoráveis de vida da maioria das pessoas. Essa última condição que vem se perpetuando com força destrutiva sobre qualquer outra possibilidade de ascensão dos mais necessitados, faz desvirtuar a própria condição da economia de exercer, de fato, seu devido papel; qual seja: atuar como um meio para melhorar o social.

A participação do capital humano

Essa tradicional teoria econômica vai empurrando para debaixo do tapete o “papel exercido pelas pessoas” dentro do próprio ambiente econômico, incluindo aí também as organizações comprometidas com o processo de mudança.

Por isso, dos quatro tipos de capitais conhecidos – financeiro, material, humano e natural – os dois últimos estão completamente esquecidos, não ocupando o centro das análises econômicas.

Nesse sentido, a economia tradicional insiste em enaltecer as pré-condições para a obtenção de crescimento, realçando as variáveis produtividade e lucratividade - bases dos capitais financeiro e material.

À medida que enaltece os capitais financeiro e material, faz por outro lado vistas grossas aos capitais que realmente deveriam ser valorizados numa possibilidade de prosperidade social: o capital humano (intelectual) e o natural (o meio ambiente e seus recursos).

É lamentável que uma ciência social como a Economia por diversas vezes não reconheça a influência e a qualificação das pessoas e de suas competências que podem ser usadas largamente para transformar, para prosperar e para fazer avançar à condição humana. 
Nesse aspecto, o tipo de economia mais social e humana aqui defendido deverá aprender a fazer bom uso dessas capacidades (humana e natural), até mesmo porque é transformando pelo uso da inteligência humana (as competências propriamente ditas) que se galgará os postos mais avançados na escala da vida, voltada para a obtenção do bem-estar coletivo.

Para ilustrarmos esse assunto, é oportuno atentar-se para algumas ponderações. Uma delas afirma que o conhecimento é gerado e operacionalizado pelo ser humano, acumulado e administrado pela sociedade para satisfação de suas necessidades.

Outra vertente aponta que as empresas e demais instituições quando de posse de objetivos bem definidos exercem o papel de reunir e operacionalizar especialidades de conhecimento e, com isso, conseguem maior eficiência e eficácia na gestão do conhecimento.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo | prof.marcuseduardo@bol.com.br

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