segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Cristãos, vítimas indiretas dos islamitas

Habitantes afirmam que Boko Haram incendiou igrejas, escolas e prédios religiosos cristãos.

Por David Esnault

Os cristãos do nordeste da Nigéria vêm pagando um preço alto para viver em meio à insurreição islâmica do Boko Haram, ainda que o conflito não seja especificamente contra eles.
Há várias semanas, os combatentes desse grupo decretaram a criação de um "califado islâmico", apoderando-se de extensos territórios em três estados de maioria muçulmana: Borno, seu reduto, Yobe e Adamawa. Inúmeras testemunhas acusam-nos de cometer atrocidades contra os cristãos.
"Vários cristãos foram agredidos e decapitados; as mulheres, obrigadas a se converter ao Islã e a se casarem com terroristas" em Madagali, uma cidade de maioria cristã do estado de Adamawa, controlada pelo Boko Haram no final de agosto - afirmou o padre Gideon Obasogie, porta-voz da diocese de Maiduguri, capital de Borno.
Outros habitantes afirmam que o Boko Haram incendiou igrejas, escolas e prédios religiosos cristãos nos últimos anos.
Em um vídeo divulgado em agosto, o líder do movimento, Abubakar Shekau, declarou um "califado islâmico" na cidade de Gwoza, em Borno.
"Tanto os cristãos quanto os muçulmanos são vítimas do conflito, já que uma bomba não distingue ninguém", diz o bispo de Maiduguri, Oliver Dashe, em entrevista à AFP.
"Nas recentes ondas de ataques, vê-se claramente, porém, que os cristãos são os mais afetados", completa.
Segundo ele, "há um êxodo em massa de cristãos das zonas afetadas", de onde "mais de 90 mil católicos foram deslocados".
'Território entrincheirado'
De acordo com a ONU, pelo menos 650 mil pessoas tiveram de deixar suas casas, em função da insurreição do Boko Haram e também da violenta repressão das forças de segurança. A denúncia foi feita por ONGs de defesa de direitos humanos, como a Anistia Internacional.
Desde o início dessa insurreição no mais populoso país da África, em 2009, pelo menos dez mil pessoas foram mortas, informam as autoridades locais. Esse número ainda não foi verificado por fontes independentes.
O pesquisador Marc-Antoine Pérouse de Montclos, especialista em Nigéria, garante que não se trata de um conflito "inter-religioso".
"É, antes de tudo, uma guerra entre muçulmanos, uma insurreição de islamitas contra o que consideram maus muçulmanos", explica.
"O Boko Haram existe há 15 anos e ataca os cristãos há quatro, ou cinco anos, mas a maioria das vítimas é muçulmana", esclarece o pesquisador.
Esses fundamentalistas islâmicos costumam tomar como alvo autoridades muçulmanas, acusando-as de trair a religião por se submeterem ao governo nigeriano.
Em Gamboru Ngala, cidade do estado de Borno fronteiriça com Camarões, os islâmicos executaram o principal líder muçulmano local. O emir de Gwoza morreu em maio em um ataque a seu comboio. O Boko Haram também tentou matar dois dos mais influentes chefes religiosos do país: o emir de Kano e o shehu de Borno. O sultão de Sokoto foi outra figura ameaçada.
"A agenda do Boko Haram não mudou desde seu início, em 2002", insiste Pérouse de Montclos. "A insurreição tem como objetivo estabelecer um califado, onde se aplique a 'sharia' (lei islâmica), um território entrincheirado frente a um mundo muçulmano corrupto", completa o especialista consultado pela AFP.
AFP

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