sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Fugindo de gente chata

06/11/2014  |  domtotal.com
O que é o chato? A palavra nos remonta à forma plana e esplanada, rasa, de pouca espessura e maior extensão. Às vezes a gente desconecta as palavras “achatada” e “chata”, mas uma está referida à outra. E isso pode ajudar a entender melhor o chato como aquele que é raso ou como aquele que nos chateia ou achata.

O chato aborrece por sua pouca profundidade. Não se encontra nele mais do que aquilo que já aparece. Corrijo-me; pode até haver mais, mas aquilo que oferece é sempre do mesmo. Sua insistência sobre um único tema, fato ou ação é algo que cansa. Pela pouca profundidade, o chato não tem mistério, torna-se desinteressante e cansativo. Uma segunda caracterização é sua insistência em tratar os outros unicamente por determinado modo que por ele fora percebido. É plano em sua concepção do outro, reduzindo as pessoas ao que considera central, à simples caracterizações. Sabe aquele indivíduo que só rememora um único evento da sua história que já não lhe tem muita significação? Você olha e já se cansa: “Lá vem Fulano! Sempre fala daquele fato.”. E antes de sua chegada, uma desculpa para fugir já foi criada. Se alguém lhe chateia é porque lhe reduz a um aspecto raso de sua vida. Há ainda uma terceira feição da chatice, baseada em sua maneira de operar. Para o achatamento, faz-se necessário exercer peso sobre algo afim de que se lhe reduza a espessura, tal como faz um rolo compressor. O chato é alguém pesado, que não encontrou a leveza da vida e, por isso, macera a vida alheia, fazendo sentir seu peso por onde passa.

Desculpa-me se vou ser chato, mas faça-se estas três perguntas: Sobre o que você insiste, isto é, quais ações ou temas são mais repetitivos em sua relação com os outros? Sua imagem sobre eles está fixa em algum evento passado ou consegue perceber sua evolução, aquilo que têm de novo? Consegue equilibrar profundidade de percepção com leveza de ser? Dessas perguntas pode resultar a resposta para a questão de você ser um chato ou não. É claro que não se vai agradar todo mundo. Aliás, há pessoas que, por não ouvirem de fato o que os outros dizem, considerem todo mundo chato; sua escuta rasa “rasifica” o mundo. É o tipo de gente que só sabe reclamar porque não experimenta nada com profundidade, não encontra gozo na vida pois não sabe degustá-la.

Para deixar de ser chato:

Renove seu repertório e sua visão de mundo. Leia coisas novas e aprofunde-se nas que mais gosta. Usufrua de arte e deixe-se afetar por experiências estéticas. Isso ajuda a se reinventar, a se tornar minimamente interessante. Tome cuidado, é claro, para não ser pedante, do tipo que quer pesar o próprio conhecimento sobre os outros, o que seria chateador. Bons livros e boa arte são transformadores. Por isso, a dica da semana para quem mora na região metropolitana de Belo Horizonte é a Bienal do Livro de Minas Gerais, de 14 a 23 de Novembro, no Expominas. Dos nomes mais conhecidos da grande mídia, constam Adriana Calcanhotto e Gregório Duvivier (15/11) e Edney Silvestre e Miriam Leitão (22/11), ambos participando do café literário. Já para quem mora em São Paulo, a 31ª Bienal de Arte, no Ibirapuera, que começou dia 6 de Setembro e vai até o dia 7 de Dezembro, com o tema “Como falar das coisas que não existem”, pode ser uma boa pedida. Algumas temáticas que costumam ser polêmicas – porque tratadas de forma rasa por gente chata – são abordadas nas obras, tais como gênero, sexualidade e religião. São duas oportunidades para sair da boçalidade e chatice que rondam as redes sociais. Saia do raso e deixe de ser chato.

Gilmar P. da Silva SJMestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pesquisa em Signo e Significação nas Mídias, Cultura e Ambientes Midiáticos. Graduação em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Possui Graduação em Filosofia (Bacharelado e Licenciatura) pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Experiência na área de Filosofia, com ênfase na filosofia kierkegaardiana. 

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