Por Matteo Matzuzzi
Por certo é somente quando estiver posta preto sobre branco a reforma da cúria romana que passará outro Natal (e talvez também outra Quaresma). Fez entendê-lo o padre Federico Lombardi, diretor da Sala de imprensa vaticana, no termo da manhã de confronto consistorial na Aula nova do Sínodo (160 presentes sobre 227; 25 enviaram a justificação escrita, precisou o decano, Angelo Sodano): “Não é que já estejamos com horizontes de finalização iminente deste documento. Ele deve ser amadurecido, muito bem estudado, também do ponto de vista teológico e canônico, bem finalizado em todos os particulares. Portanto o tempo a isso destinado é bastante consistente, suficientemente longo”. Também porque o documento tão esperado, o esboço, a proposta final que deveria revolucionar o governo vaticano, como foi solicitado em alta voz pelos cardeais durante as congregações gerais do pré Conclave, não existe.
Na quinta-feira, dia 12, o cardeal Rodriguez Maradiaga, coordenador do conselho da coroa, que ajuda o Papa no governo da igreja universal e estuda a nova constituição apostólica, se limitou a ilustrar a obra desenvolvida pelos nove purpurados em quase dois anos de encontros. Foi o secretário do organismo, D. Marcello Semeraro, que delineou os pressupostos teológicos e eclesiásticos que envolvem o projeto no qual se trabalha. Ao estado, as únicas duas novidades são aquelas já há tempo conhecidas: a instituição de uma congregação que conecte caridade, justiça e paz (mas os eminentíssimos não estão de acordo entre si sequer sobre o fato de dar precedência à caridade antes do que à justiça na definição do novo organismo) e uma que compreenda leigos, família e vida (onde por vida se entende a Academia pela Vida).
Uma posição de relevo terá a ecologia, à qual com toda probabilidade será dedicado um escritório criado ad hoc. Nada é dito, ao invés, a propósito da idéia do cardeal Gianfranco Ravasi de criar um maxi-dicastério que conecte cultura, biblioteca, arquivo, educação católica, museus, academia das ciências sociais e até o Observatório astronômico. Desde os primeiros debates emergiu o verdadeiro objeto da discussão: a possível devolução de poder e competências da cúria romana às conferências episcopais nacionais. É neste terreno que se joga a partida-chave, que vai bem além de um mero restyling [apoio] à estrutura de governo vaticana.
Nada de novo: trata-se da reproposição do choque fraterno entre os cardeais Joseph Ratzinger e Walter Kaspersobre o peso e o papel a dar às igrejas particulares, com o segundo que solicitava uma reforma que desse vida “a um governo horizontal da Igreja para sair das dificuldades do centralismo romano”.
O cardeal prefeito da Doutrina da fé, Gerhard Ludwig Müller, havia posto a questão no centro de sua intervenção publicada há alguns dias no Osservatore Romano: “Favorecer uma justa descentralização não significa que às conferências episcopais seja atribuído mais poder, mas somente que elas exercem a genuína responsabilidade que lhes compete com base no poder episcopal de magistério e de governo dos seus membros, sempre naturalmente em união com o primado do Papa e da igreja romana”.
Uma resposta indireta a estes setores (numerosos) da ecclesia universa que – para dizê-lo com o cardeal Reinhard Marx – sentem soprar “ar fresco” e estão prontos a fazer “um monte de trabalho teológico” também se juram não terem intenção de “criar uma nova igreja”.
Para evitar equívocos, o padre Lombardi sublinhou que as nuances léxicas entraram no confronto consistorial, entre quem desejava uma cúria “sinodal” e quem, ao invés, a queria mais “colegial” – Müller acentuava que “a igreja universal não nasce como soma das igrejas particulares, nem as igrejas particulares são meras sucursais da igreja universal”, e que, em todo caso, “o primado está sempre ligado à igreja de Roma” e “o Papa não exerce o primado senão junto à igreja romana”. Todos eles são conceitos que o cardeal prefeito daquilo que foi o Santo Ofício rebateu em Aula, entre os primeiros a tomar a palavra (durante a manhã foram somente doze), admoestando sobre o risco de transferir competências em campo doutrinal às igrejas particulares. Correr-se-ia o risco, fez entender, de um grande caos.
O problema é que, a abrir a porta àquela transferência tinha sido o Papa em pessoa na exortação apostólica Evangelii Gaudium, promulgada no outono de 2013. De fato, já no primeiro capítulo Francisco escrevia que “também o papado e as estruturas centrais da Igreja universal têm necessidade de escutar o apelo a uma conversão pastoral. O Concílio Vaticano II afirmou que, de modo análogo às antigas igrejas patriarcais, as conferências episcopais podem ‘podem trazer uma multíplice e fecunda contribuição, afim de que o sentido de colegialidade se realize concretamente’.
Mas, este auspício – acrescentava Bergoglio – não se realizou plenamente, porque ainda não se explicitou suficientemente um estatuto das conferências episcopais que as conceba como sujeitos de atribuições concretas, incluindo também aquela autêntica autoridade doutrinal. Uma excessiva centralização, ao invés de ajudar, complica a vida da igreja e sua dinâmica missionária”.
Isto escrevia Francisco naquele que ele mesmo definia, na introdução, o texto base de seu pontificado: “Sublinhou que o que pretendo exprimir tem um significado programático e de consequências importantes. Espero que todas as comunidades façam de modo a por em ato os meios necessários para avançar no caminho de uma conversão pastoral e missionária, que não pode deixar as coisas como estão”.
Il Foglio, 13-02-2015.
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