sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Ação e omissão humanas

Por Dom Genival Saraiva*


O ser humano, direta ou indiretamente, está ligado aos acontecimentos que fazem parte dos registros da história. Em alguns, sua ação ou sua omissão é visivelmente identificada; em outros, como um fenômeno da natureza, situado num determinado tempo e lugar, parece que inexiste essa marca; de fato, pode não ser identificada, de imediato, uma relação de causa e efeito, mas, de qualquer maneira, nele haverá um traço da condição humana, ao menos no plano de suas consequências. Um olhar sobre essa realidade é oportuno por estar a Igreja Católica chegando ao término de mais um “Ano Litúrgico”, com a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo. O mistério de Cristo, vivido pela comunidade cristã, com a linguagem de cada tempo litúrgico, encerra a dimensão terrestre e temporal da existência do ser humano e contém o germe da eternidade. Em razão da imortalidade e da ressurreição, a pessoa humana se diferencia de qualquer criatura de Deus; ela é diferente dos anjos que são imortais, mas não ressuscitam porque são espírito; é diferente dos seres animais que têm corpo, porém não são imortais e, consequentemente, não participam do dom da ressurreição.

Por muitíssimas formas, registram-se fatos de natureza social, espiritual e evangelizadora que testemunham a benfazeja ação humana. Registram-se, igualmente, omissões humanas que causam grandes males a pessoas e populações. Na realidade, por sua ação, a pessoa pode fazer o bem ou o mal, enquanto sua omissão, consciente ou inconscientemente, causa o mal, em maior ou menor extensão. A Igreja, em sua catequese e liturgia, ensina que alguém pode pecar “por pensamentos e palavras, atos e omissões”. Uma avaliação e, sobretudo, um exame de consciência revelam isso, de forma efetiva. 
A França e o Brasil se tornaram cenário de atos criminosos - os atentados em Paris, e de omissões criminosas - o rompimento de barragens em Mariana - MG. Estes atos causaram mortes, deixaram sequelas psicológicas, sociais e materiais que vão além de seus limites geográficos. Os atentados em Paris foram praticados por mentes doentias, desde a concepção de seu plano que contou, obviamente, com um maior número de participantes, à sua execução cujo número e identificação estão sendo objeto de investigação nas instâncias competentes.  Portanto, a gravidade dos atentados de Paris é maior por se tratar de ato intencionalmente perpetrado. 
Por sua vez, o rompimento de barragens no Município de Mariana - MG não é obra do acaso. Na leitura desse fato, não há como não se estabelecer uma relação de causa e efeito. Com certeza, o ponto de partida chega à identificação de omissão administrativa dos proprietários e de negligência ou imperícia técnica dos responsáveis pelo monitoramento das barragens, na forma prevista. O sofrimento humano, neste caso, tem um rosto múltiplo, causado pelas mortes, hospitalizações, perda de moradias e outros bens; os prejuízos sociais são muito grandes porque atingem o mundo do trabalho, na administração privada e pública; as consequências ambientais, nos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, são incalculáveis, uma vez que “a natureza não dá saltos”, como ensina a filosofia e constata a ciência; dessa forma, mesmo que houvesse intervenções imediatas e de qualidade, o fator tempo, longo tempo, tem que ser considerado.  
O fundamentalismo religioso constitui sempre um perigo para a convivência pacífica, a intransigência política é incompatível com a vida democrática e o lucro do capitalismo, conquistado a qualquer preço, causa males duradouros na economia humana e no meio ambiente.
CNBB 23-11-2015
*Dom Genival Saraiva é bispo Emérito de Palmares (PE).

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