quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Não matarás!

A vida de cada ser humano é preciosa. Unamos, pois, nossos esforços para preservá-la.
Por Dom Murilo S.R. Krieger*
Poucos versículos da Bíblia são tão curtos, incisivos e claros como o que encontramos no livro do Êxodo: "Não matarás!" (Ex 20,13). Poderia até parecer que o 5º mandamento da Lei de Deus não necessitasse de complementos ou explicações, mas necessita.
Ao longo da história, variou muito a forma de transgressão a essa proibição. A primeira notícia de morte que temos na Bíblia é pobre em detalhes. Diz apenas que, tendo Abel aceitado o convite de seu irmão para irem ao campo, lá encontrou a morte: "Caim atirou-se sobre seu irmão e o matou" (Gn 4,8). A partir daí, a morte violenta, trágica ou em série começou a fazer parte da vida humana. Hoje, uma das expressões mais comuns dela é o que acontece no trânsito. Apesar da repetição praticamente diária de acidentes nas estradas, notícias e fotos envolvendo veículos quase sempre têm espaço nos meios de comunicação, por causa da curiosidade ou surpresa que geram.
"Não matarás!" A proibição não poderia ser mais direta. As mortes violentas nas estradas, a maioria decorrente de causas humanas, geram dados estatísticos e gráficos que são mostrados nos canais de televisão e nas páginas noticiosas dos jornais e na internet, em que são destacadas cenas marcadas pela imprudência ou brutalidade. Nesses noticiários comparam-se os dados relativos ao número de vítimas em diferentes cidades e países, em diferentes anos e décadas. As mortes no trânsito, de tão comuns, viraram apenas estatística. Estaremos perdendo a capacidade de nos surpreender e reagir?...
Nenhum dom é tão importante como o da vida. E é de vidas humanas que estamos tratando. Ou será que cada um de nós precisará passar pela experiência pessoal da perda de um ente querido num acidente qualquer, para então nos acordarmos e tomarmos consciência da gravidade do que está acontecendo?
Cada morte no trânsito é envolvida por muita dor. (Não quero entrar aqui nas  consequências econômicas desses eventos, que são um capítulo à parte.) Há uma esperança que desaparece. Há sofrimentos que poderiam ser evitados, ou melhor, deveriam ser evitados, porque em um significativo número de casos há, por parte de alguém, a prática de abuso da liberdade. "O homicídio involuntário não é moralmente imputável. Mas não está isento de falta grave quem, sem razões proporcionais, agiu de maneira a provocar a morte, ainda que sem a intenção de causá-la" (CIC 2290).
Não é da vontade de Deus que o ser humano seja dominado pela pressa e, menos ainda, seja vítima da imprudência de motoristas irresponsáveis. (Que outro nome dar àqueles que, por exemplo, dirigem alcoolizados?...). O Senhor da Vida nos dá, sim, a capacidade de, mesmo do mal, da dor e de erros, nossos ou de outros, tirarmos lições de vida e de amor. Não é de seu plano, contudo, que por excesso de confiança de alguns ou por abusos de outros, crianças fiquem chorando a morte de seus pais, pais fiquem sem seus filhos, irmãos percam a convivência de um irmão ou irmã. Quanta saudade que não precisaria existir!
A proximidade do Carnaval multiplicará o número de automóveis e motos em nossas estradas. A Polícia Rodoviária se desdobrará para evitar acidentes; novas placas de sinalização serão colocadas, para despertar a atenção dos motoristas; serão feitas advertências para que, antes de uma viagem, os carros sejam revistos. Tudo isso é importante. Porém, sem um compromisso feito pelos motoristas, de serem mais responsáveis, o número de acidentes e acidentados crescerá.
A vida de cada ser humano é preciosa. Unamos, pois, nossos esforços para preservá-la.
CNBB 01-02-2016.
*Dom Murilo S.R. Krieger: Arcebispo de Salvador (BA).

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