sábado, 12 de março de 2016

Júpiter

Cibele é a deusa da natureza e dos ciclos vitais (vida, morte e renascimento). Saturno é o deus do tempo e, por isso, muito associado à melancolia. Da relação de ambos, nasce Júpiter, cujo equivalente grego é Zeus, por quem seu pai se sente ameaçado de perder o trono. Talvez aquele que se torna pai de uma nova geração de deuses, regente de uma nova ordem, possa nos dizer algo sobre nossa relação com a vida.

Parece que nossa relação com o tempo tem algo que nos inquieta. Somos projetado para um futuro incerto e que sempre vem. Não é possível parar o tempo ou antecipá-lo e a dúvida do que pode haver gera um mal-estar. Essa angústia fundamental se funda no desejo de realização pessoal e, ao mesmo tempo, impossibilidade de controle da vida. Ao mesmo tempo que o futuro chega, o presente passa, e não se pode segurar as experiências felizes ou expurgar o que não deu certo. Ficamos preso no átimo do presente, estreitados entre passado e futuro. O tempo pode ser um pai opressor. Saturno é severo.

Quem nos ajuda a fugir da angústia do tempo é a natureza, nossa mãe. Mas aqui não se fala de uma visão festiva hippie chic and cool, que superabunda discursos atuais, impregnados de uma pretensa estética de simplicidade e suposto valor ecológico. O retorno à natureza é assunção dos ciclos vitais, a aceitação da vida, o assumir da própria carnalidade. Júpiter deixa as alturas e encontra seu refúgio na Terra. Ele continua filho do tempo, mas, ao assumir-se animal – pois é ocultado de seu pai na figura de um touro –, consegue amadurecer até vencer quem o perseguia. Vence a angústia quem habita em si, assume a própria vida e natureza, com todos os elementos que a compõe.

As nostalgias de um passado idílico, as utopias de um futuro cibernético, as excessivas espiritualizações que projetam o indivíduo às alturas, as abstrações e fugas do mundo pelos entorpecentes etc., tudo isso é desabitar da natureza. Reintegrar a natureza é aceitar também a possibilidade da morte, da dor, do perecimento. A natureza é mãe? Sim, mas ela educa com rigidez e não só com beijos. Habitar o mundo e a existência é condição inevitável para vencer a força do tempo, ainda que isso implique em reconhecer-se seu filho.

 
Show e álbum Júpiter
 
O cantor Silva lançou recentemente o álbum Júpiter. Em suas palavras, o título do trabalho representa “Uma proposta alternativa contra esses dias tão estranhos de hoje, em que ainda precisamos conviver com tanta mesmice representada por preconceito, intolerância e todo tipo de violência”. Suas canções falam de amor e eis o primeiro problema. O amor idílico pode ser mais uma fuga da realidade. O conceito do álbum é interessante pelo dar-se conta do tédio provocado pelo tempo, mas ainda não tem a coragem de ser, por assim dizer, mais dionisíaco. Afinal de contas, o retorno a proteção de Cibele não é evocada na sua potencia.

Diferente de seus outros trabalhos, com uma aura composta de elementos um pouco mais sombrios,Júpiter é mais fácil e flerta em demasia com a MPB mais banal e romântica. Não que o trabalho não tenha seu valor musical, mas é mais comercial que Claridão (2012) e Vista pro mar (2014), álbuns, ditos, cult. Silva continua com elementos tecnopops e arranjos minimalistas, trazendo desta vez elementos de R&B. Pode ser ouvido por streaming no Spotify ou ao vivo em BH, no dia 18 de Março, na casa noturna A autêntica.
 
Show – Júpiter com o cantor Silva
Dia – 18 de Março
Hora – A partir das 21h
Local – A autêntica (Rua Alagoas, 1172, Savassi)

Gilmar P. da Silva SJMestrado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, com pesquisa em Signo e Significação nas Mídias, Cultura e Ambientes Midiáticos. Graduação em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Possui Graduação em Filosofia (Bacharelado e Licenciatura) pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora. Experiência na área de Filosofia, com ênfase na filosofia kierkegaardiana. 

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