domingo, 17 de abril de 2016

Eu sou o Bom Pastor

Em meio aos ruídos e à onda de ódio e violências, o verdadeiro pastor faz ouvir a sua voz.
Rezemos hoje, com toda a Igreja, pelas vocações sacerdotais e religiosas.
Rezemos hoje, com toda a Igreja, pelas vocações sacerdotais e religiosas.
Por Marcel Domergue*
Referências bíblicas
1ª leitura: “Sabei que vamos dirigir-nos aos pagãos” (Atos 13,14.43-52)
Salmo: Sl. 99(100) - R/ Sabei que o Senhor, só ele, é Deus; nós somos o seu povo e seu rebanho.
2ª leitura: “O Cordeiro será o seu pastor e os conduzirá às fontes de água da vida” (Apocalipse 7,9.14-17)
Evangelho: “Às minhas ovelhas, dou-lhes a vida eterna” (João 10,27-30)
Voz do pastor, palavra do Pai
Deixemo-nos levar aos tempos passados, seguindo a imagem do pastor antigo, herdeiro das grandes figuras do Gênesis e do Êxodo: Abraão, Isaac, Jacó, Moisés. Condutores de rebanhos e condutores de povos. O pastor vai à frente e o rebanho o segue. Por que tanta docilidade? Porque as "ovelhas" reconhecem a voz do pastor. Significa que identificam o pastor como sendo a Palavra que as faz existir e que, sendo lógica consigo mesma, prosseguirá fazendo com que existam.
O Salmo 23 fala em verdes pastagens e em águas tranquilas, para estancar a sede; fala, portanto, do alimento que permite a vida. O evangelho diz tratar-se da "vida eterna". A voz do pastor é a voz do Pai, uma vez que ambos são um: a Voz geratriz que, em Gênesis 1, ordena que os seres existam e eles passam a existir. Significa que Este que nos funda continua a nos fazer existir, conduzindo-nos à última verdade do nosso ser.
Quem escuta a sua voz - a voz que nos revela ser esta verdade o amor, a natureza mesma de Deus - não morrerá mais, pois, pelo amor, ela ou ele entra no próprio Deus. A voz do pastor fala seguidamente dentro de nós e nós não a sentimos como uma voz estranha, pois foi dela que nascemos. O pastor conhece as suas ovelhas, mas também, como diz o versículo 14 (fora da leitura), as ovelhas O conhecem. Em Cristo, estamos em nossa casa.
A dança das imagens
É preciso fazê-las dançar, pois as imagens bíblicas não são definições. Elas sugerem... Elas viajam... Por que os nossos textos falam somente em ovelhas, femininas, e em cordeiros, infantis, mas jamais em carneiros? É, sem dúvida, porque o carneiro evoca a combatividade, a violência, enquanto as ovelhas e os cordeiros simbolizam a doçura, a vulnerabilidade e, até mesmo, a inocência. Todos os lobos da terra os devoram, e, no entanto, eles não fazem mal a ninguém. Já o pastor conhece algumas mutações importantes.
No versículo 3, fora da leitura, é ele quem faz as ovelhas saírem: uma imagem do Êxodo, do acesso à liberdade, do caminho para o alimento e para a vida. Mas, no versículo 7, este mesmo que faz sair torna-se aquele através do qual se sai: o pastor torna-se a porta. Na segunda leitura, o pastor, o que conduz, torna-se o cordeiro, o que é conduzido. Ou, mais ainda, o que se imola. Estas coisas todas só são compreensíveis à luz da Paixão e da Ressurreição do Cristo. Aí, de fato, os contrários se trocam: o primeiro torna-se o último, o justo conhece o destino do culpado, a vida assume o rosto da morte.
De fato, o Cristo nos abre as portas da morte, mas por Ele é que é preciso passar; é preciso segui-lo em sua Páscoa. Ele, de fato, é a vida e o caminho para a vida. Ele é a nossa última verdade. Ainda uma imagem a mais, e uma imagem desconcertante: temos de lavar as nossas vestes no sangue do Cordeiro (2ª leitura). Curioso sabão este! Mas esta imagem nos fala nada mais do que de nossa entrada na Páscoa do Cristo.
"Ninguém vai arrancá-las de minha mão"
A mão do Cristo é também a mão do Pai, pois Eles são Um só. Isto significa que nada no mundo nos pode impedir de seguir o Cristo. Por quê? Porque o pior dos mundos que possamos conhecer, ele já os atravessou. Por toda parte e das formas as mais diversas, cruzes se levantam. Mas o que quer que tenhamos de sofrer, encontraremos sempre ali o Cristo crucificado.
Ele morreu da mesma morte que nós e por isso cada uma das nossas mortes torna-se a sua, terminando na vida eterna e na glória. Concordo que, diante do que a vida nos oferece a suportar, alguns irão pensar: mas, e as nossas insuficiências, as nossas traições, as nossas covardias, em resumo, o pecado? Pois é aí que nos espera o mais desconcertante: a Cruz do Cristo é a culminância da perversidade humana, a superabundância do pecado. E isto é o que Cristo usa para fazer-nos entrar na vida.
Aí, o nosso mal perde o seu aguilhão mortal. A morte perece em sua própria vitória. Morte, sim, mas a morte da morte, a autodestruição do mal. Portanto, não tenhamos medo de nada. Eis-nos aqui diante da vida, diante de Deus, com as mãos vazias, sem títulos por fazer valer, sem méritos, sem justiça... Mas, se aceitamos esperar na paz, Ele é que encherá as nossas mãos.
"Pois, estou convencido de que nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem os poderes, nem a altura nem a profundeza, nem qualquer outra criatura poderá nos separar do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus" (Romanos 8,38-39). No amor, tudo, até mesmo o pior, é usado para o nosso bem (ver Romanos 8,28).

Sítio Croire, 15-04-2016.
*Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês.

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