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O mundo vai mal, mas o futebol vai bem. Mesmo em crise, o futebol vai bem.
Cada ser humano deste planeta deveria ser tratado como uma estrela do futebol.
Por Max Velati*
O vídeo está circulando pelo Facebook e fazendo sucesso, mas não tanto quanto deveria. Nos estúdios de uma emissora de TV portuguesa, uma jornalista entrevista Dr. Pedro Santana Lopes, ex-primeiro ministro de Portugal. O assunto é política e o ex-ministro está desfiando os problemas do Partido Social Democrata. Subitamente, a jornalista interrompe a entrevista. Explica que um repórter está no Aeroporto da Portela onde acaba de chegar num jato particular o técnico de futebol João Mourinho. As câmeras cortam para o saguão do aeroporto e um entusiasmado repórter narra a chegada do técnico português que faz sucesso no futebol inglês à frente do Manchester United.
Voltamos ao estúdio.
A jornalista diz que o técnico agora vai descansar e retoma então a entrevista pedindo que o ex-ministro conclua o que estava dizendo. Neste instante o Dr. Pedro Santana Lopes entra para a história da TV portuguesa e se torna a fonte de inspiração para a coluna desta semana.
“O técnico João Mourinho é mais importante do que todos nós” diz com ironia. Diante da jornalista completamente perdida, desconcertada, ele diz que não vai continuar a entrevista. Explica que foi convidado pela emissora e compareceu ao estúdio ao custo de sacrifícios pessoais. Foi para falar de política e temas importantes, mas foi bruscamente interrompido porque um técnico de futebol chegou de viagem. O ressentido Dr. Pedro Santana Lopes pede desculpas e encerra a entrevista deixando no ar a frase que vai me perseguir por um bom tempo: “As pessoas precisam aprender” diz ele.
O mundo vai mal, mas o futebol vai bem. Mesmo em crise, o futebol vai bem. Na verdade, tão bem que deveria servir de modelo para as nossas aspirações. Cada ser humano deste planeta deveria ser tratado como uma estrela do futebol. Legiões de médicos, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas e assessores deveriam estar à disposição do cidadão comum. Professores universitários deveriam recebem todas as regalias dispensadas a um bom ponta esquerda, por exemplo. Cada cidadão deveria ser remunerado e premiado por cada conquista importante, mesmo que estas vitórias fizessem parte das obrigações do ofício que escolheu. Nossa medida de conforto, segurança e bem-estar deveria ser avaliada e concedida pelo conforto, segurança e bem-estar de um jogador de futebol. Para dar uma ideia precisa do que isso significa, os jogadores vitoriosos nas Olimpíadas vão receber individualmente meio milhão de reais. Os demais atletas vão ser premiados com 35 mil reais.
O ex-ministro disse com ironia o que é uma grande verdade. O técnico de futebol é mais importante do que todos nós. Os jogadores de futebol também são mais importantes do que todos nós. Eles têm prestígio, dinheiro, poder. Nós não temos nada disso e perto deles nossa presença no planeta é um acidente insignificante. Nem mesmo um ex-ministro de um país da Europa tem importância se um jato particular estiver pousando com um técnico de futebol em uma das poltronas. Quem somos nós perto do homem que decide como 11 marmanjos ricos devem se comportar ao redor de uma bola de couro. Afinal, o que é uma crise mundial comparada aos problemas técnicos como um tendão repuxando, um calcanhar dolorido ou um estiramento da coxa.
Mesmo não sendo importante, o ex-ministro tem toda a razão: as pessoas precisam aprender.
*Max Velati trabalhou muitos anos em Publicidade, Jornalismo e publicou sob pseudônimos uma dezena de livros sobre Filosofia e História para o público juvenil. Atualmente, além da literatura, é professor de esgrima e chargista de Economia da Folha de S. Paulo. Publica no Dom Total toda sexta feira.
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