terça-feira, 29 de agosto de 2017

Lula, um improvável novo Príncipe*, esta a unir o Brasil


por Sergio Medeiros

Lula não explicita claramente qual seu objetivo, mas ele é ou deveria ser de tal forma visível, que se poderia dizer, de uma clareza solar.

Quando ele se propõe em sua caravana a reaglutinar o setor oposicionista para preservar o que resta de soberania ao país, resta claro que este não será composto exclusivamente pela chamada esquerda, mas sim de todos que, neste momento, de alguma forma compartilham uma visão que privilegia a proteção social e o respeito ao patrimônio público.

Assim, apesar de atrair as críticas e vitupérios de setores que se dizem “mais à esquerda”, mas que representam menos de 2% do Congresso Nacional, apesar disso,  ele se dedica, dia a dia, a compor suas tropas, e no campo onde se dá a batalha primordial, no campo político e popular.

Para tanto, fez desta caravana uma demonstração de força, um imenso apelo popular que transmite confiança extrema em seu condutor maior e traduz uma fé inabalável em sua capacidade e em sua dedicação ao povo pobre e trabalhador deste país.

De outro lado, todos já puderam ver as manobras do atual grupo no poder, e dos que foram cooptados nestes movimentos.

Alicerçado em sólido apoio popular, Lula ensaia e concretiza gestos de aproximação com alguns representantes políticos que se uniram a estes setores ou mesmo que apoiaram o golpe, sejam  iludidos pelo canto da sereia, seja pelo medo do discurso destruidor da mídia ou mesmo pela procura de uma fatia do poder.

Este setor, na atual conjuntura, esta vendo que cavou sua própria sepultura, e espera, muito mais que deseja, uma alternativa para sair de suas novas posições.

Ao estender a mão ao PSB, busca trazê-los a sua proposta original, ao aceitar a adesão de nomes como Renan Calheiros, entende que nem todos os interesses estão abrangidos pelos atuais ocupantes e dirigentes do governo urdido pelo golpe, havendo espaço para a distensão e reagrupamento de forças por grupos de interesse que tenham por objeto a proteção do patrimônio nacional frente ao capital especulativo e espoliador estrangeiro.

Entretanto, em meio a este cenário, tem alguns analistas que – talvez nem tão inexplicavelmente - se esquecem do sentimento de urgência que tomaram os rumos da política, com o saque e a destruição ampla e irrestrita de todo espaço público e da legislação protetiva social e trabalhista.

Lula repete, até a exaustão, que o que importa não é mais somente a liberdade ou prisão dele, mas sim que exista uma efetiva contraposição ao poder destrutivo ora instalado.

Com isso ele busca brecar esta brutal ataque ao Estado, ataque este que sem sombra de dúvidas, destina-se a tornar inviável qualquer nova tentativa de torná-lo novamente vinculado ao bem estar da população em geral.

É que, sem a Petrobrás (vendida aos pedaços), sem a Eletrobras, com a Reforma Trabalhista, com o setor público – educação saúde e assistência social - engessado pela emenda do teto, pela terceirização, pela venda do setor produtivo estatal, pelo desmonte da indústria nacional, ele, Lula, vê de forma límpida que logo ali na frente não haverá nada a ser disputado em 2018, nenhum projeto viável, nenhum país possível.

A luta pelas diretas já (neste novo movimento), pelo seu componente massivo, para ter ao menos uma chance de êxito, necessitaria de uma força popular tão avassaladora que nem mesmo na transição do governo militar – na época das diretas já – foi obtido.

Naquela oportunidade, um famigerado Tancredo Neves se uniu para fraudá-lo, e este movimento, com todo seu apelo popular, não logrou se concretizar realidade.

Agora, ao contrário, houve até mesmo um refluxo neste sentido, fruto da perplexidade de todo um povo enganado pela mídia e confuso ao extremo, que imerso em uma profunda crise econômica que sepulta as perspectivas de qualquer futuro, passou a ver em seu meio, o nascimento de um sentimento de revolta, ainda disperso, mas muitas vezes traduzido em puro ódio e manipulação.

Assim, a grande mídia e o governo corruptamente instalado aproveitam a confusão existente – por eles criada -  e estão a consolidar seu projeto de poder.

E, no atual estágio, somente da junção de dois setores essenciais à cidadania é que poderemos, em parte, barrar este movimento.

A saber, o primeiro componente é o movimento encabeçado por Luís Inácio Lula da Silva, que busca unir e integrar em torno de suas ideias de emancipação popular todos os sentimentos, não só os de insatisfação e revolta com o desemprego e a miséria, mas, principalmente os anseios pela busca da criação de um lugar, de um país, onde haja justiça e bem estar social. Deste modo, aos poucos, e a custa de trabalho e muito suor, direciona este sentimento de revolta para a construção de algo útil, o transforma num movimento organizado e com inegável peso político, apto a influir nos desdobramentos da vida nacional em direção ao bem comum.

O outro componente tem aspecto pouco agradável, pois em seu bojo carrega a gênese de todos os males, mas também a possibilidade de redefinição de rumos, que a continuarem nesta direção fatalmente nos levarão ao abismo final, e, ainda que indigno – é no parlamento brasileiro que se trava a outra parte da batalha.

E, é nesse outro campo que resta a batalha a ser vencida, a das ruas e sentimentos já traz a marca da vitória nos sorrisos e abraços a Lula.

A parte incompreendida do aceno de Lula a certos setores do Congresso Nacional, esta centrada na necessária manutenção do pouco que resta da estrutura patrimonial e econômica do outrora Estado social.   

E, não se enganem, não será por nenhum mérito que estes parlamentares (muitos apoiaram o golpe) estariam agora a agir deste modo, eles se movem pela sobrevivência política e pela busca de um real espaço de poder –que apesar de prometido, jamais lhes foi ou será entregue pelos atuais ocupantes do governo -, e que a caravana de Lula, por seu caráter massivo de arrastar multidões, lhes impõe como o único rumo a ser tomada para terem chances de uma nova eleição.

Trata-se de uma história antiga, venderam a alma ao diabo, que, como de costume não cumpriu o acordo e, ao invés de pagamento, lhes exige, além da sua a entrega de todas as almas.

Então, por favor, entendam, Lula não esta estendendo a mão a políticos golpistas e corruptos, Lula, apesar do desgaste de tal gesto, esta estendendo a mão ao Brasil, ao povo brasileiro, para que, em 2018 ainda seja possível a reconstrução de algo parecido com um país que tenha um mínimo de justiça social.

 *O Príncipe de Maquiavel poderia ser estudado ( ...)  ... como uma criação da fantasia concreta que atua sobre um povo disperso e pulverizado para despertar e organizar sua vontade coletiva. O caráter utópico do Príncipe consiste no fato de que o “príncipe” não existia na realidade histórica, não se apresentava ao povo italiano com características de imediaticidade objetiva, mas era uma pura abstração doutrinária, o símbolo do líder, do condottiero ideal; mas os elementos passionais, míticos, contidos em todo o pequeno livro, com movimento dramático de grande efeito, sintetizam-se e tornam-se vivos na conclusão, na invocação de um príncipe “realmente existente”.  Em todo o livro, Maquiavel mostra como deve ser o Príncipe para levar um povo à fundação do novo Estado, e o desenvolvimento é conduzido com rigor lógico, com relevo científico: na conclusão, o próprio Maquiavel faz-se povo, confunde-se com o povo, mas não um povo “genericamente” entendido, mas com o povo que Maquiavel convenceu com seu desenvolvimento anterior, do qual ele se torna e se sente consciência e expressão, com o qual ele sente-se identificado:... (Gramsci, 2001: 1555-56, Q. 13. Maquiavel, a Política e o Estado Moderno).

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