terça-feira, 11 de setembro de 2018

A Caminho de Marte II

Durante muitas décadas a raça humana tem alimentado a vontade de ir a Marte.


Matt Damon no filme 'Perdido em Marte' e concepção artística de um veículo tripulado para missão no espaço.
Matt Damon no filme 'Perdido em Marte' e concepção artística de um veículo tripulado para missão no espaço. (Reprodução)
Por Sergio Vieira*

Quem nunca ficou olhando para a fotografia de um lugar e pensou um dia eu vou lá? Muitas vezes, de tanto pensar em ir, começamos de fato a planejar a viagem. E, com frequência, são muitas as coisas envolvidas neste planejamento: custos, melhor caminho a seguir, datas de ida e volta, clima e condições meteorológicas durante a viagem dentre varias outras coisas. Agora imagine se o destino desta tão esperada viagem estiver a 80 milhões de quilômetros?
Durante muitas décadas a raça humana tem alimentado a vontade de ir a Marte. E o dia da partida esta ficando cada vez mais próximo, pois as tecnologias necessárias para superar todas as dificuldades e problemas que se impõe em um empreendimento desta dimensão estão cada vez mais desenvolvidas. 
No dia em que a viagem do primeiro voo tripulado para Marte se iniciar teremos de comemorar a vitória conjunta das ciências básicas (física, química, biologia e matemática) e da engenharia, que terá cumprido sua missão básica que é resolver problemas e superar desafios. E não são poucos estes problemas e desafios. Neste sentido procuraremos mostrar alguns deles e as soluções já encontradas e/ou os caminhos que estão sendo seguidos para se chegar a elas.
I – Distância
Marte está muito longe da Terra, e este é o fator que agrava vários dos outros fatores que dificultam a viagem tais como o combustível, a alimentação, a falta de gravidade e a exposição a radiações ionizantes.
Uma maneira de reduzir o tempo de viagem a Marte é fazer o lançamento quando o percurso for mais curto, utilizando-se da posição relativa dos dois planetas em suas órbitas em torno do Sol. Esta aproximação de Marte acontece a cada dois anos e meio. Em julho deste ano Marte esteve na posição favorável. Estima-se que quando ele retornar a esta posição em 2030 seja feito o lançamento.



























Mesmo nesta posição favorável Marte estará a aproximadamente 80 milhões de quilômetros e ela não poderá ser percorrida em linha reta, mas sim em uma diagonal encurvada. Neste trajeto a distancia irá aumentar (diminuir?) consideravelmente e  o tempo de viagem de ida seria de 6 meses, contando com uma ajuda da gravidade da Terra para dar um empurrão na nave e reduzir o consumo de combustível. O tempo de volta seria um pouco maior pois como a gravidade de Marte é menor que a da Terra o empurrão seria menor.
II – Ausência de gravidade
Uma viagem tão longa no espaço apresenta um grande problema a ser resolvido que é a ausência de gravidade. O corpo humano não reage bem à ausência de peso. Ocorrem perda muscular e perda óssea, além de várias alterações fisiológicas. Até mesmo tarefas básicas como beber agua, tomar banho, dormir e ir ao banheiro ficam complicadas com a ausência de peso.
Uma solução para este problema seria criar uma gravidade artificial utilizando a o efeito da inércia. Devido à rotação em torno de um eixo central, os corpos na periferia sentiriam uma força que simularia a gravidade.
Quanto mais próximo da periferia do sistema que gira maior o efeito da inércia e da consequente força gravitacional aparente. (http://www.xr.pro.br/fc/GRAVIDADE.HTML)
Para se criar uma nave que possua este sistema existem vários empecilhos de ordem técnica:
  • O tamanho da estrutura girante: para simular a gravidade de Marte seria necessário uma estrutura com diâmetro de 800 metros e que girasse a uma taxa de 0,92 rotações por minuto. Rotações muita altas podem ser desconfortáveis e quanto menor o diâmetro maior deve ser esta taxa.
  • A fonte de energia: após se atingir a taxa de rotação a mesma continuaria por inercia, mas ao se chegar ao destino seria necessário parar a estrutura e este processo pode demandar muito tempo.
  •  Viagem para Marte: montar tal estrutura na Terra e lança-la é inviável. Os esforços a que seria submetida durante o lançamento a destruiriam. Ela teria de ser montada em órbita, o que é muito difícil e muito caro. Além disto o sistema de rotação só pode ser ativado longe de corpos celestes uma vez que a atração gravitacional deles fariam a espaçonave se comportar como um pião.
A NASA tem trabalhado em soluções intermediarias que aperfeiçoam o sistema de atividades físicas que os astronautas que ficam longo tempo na Estação Espacial Internacional têm de seguir. Este tipo de atividade e os equipamentos utilizados podem ser vistos no documentário Destino Marte do Discovery Channel.
III – Radiação
Durante os quase 12 meses de viagem (ida e volta) os astronautas estarão sujeitos a uma grande dose de radiação uma vez que não teremos a proteção da atmosfera da Terra.
A sonda Exomars Trace Gas Orbiter (TGO), que foi enviada para fazer um estudo minucioso da atmosfera de Marte através, dentre outras coisas, da busca por traços de gases que podem se originar da decomposição de matéria orgânica ou de atividades geológicas, mostrou que durante o voo a Marte o corpo humano irá ser exposto a uma dosagem de radiação ionizante próxima do índice letal. Esta radiação é causada em grande parte por raios cósmicos e não por radiação solar. Isso significa que os astronautas seriam expostos ao perigo, mesmo que o voo fosse feito em um período de baixa atividade solar, asseguram os cientistas. De acordo com especialistas, os astronautas que vivem a bordo da Estação Espacial Internacional durante 6 meses recebem menos do que 50% do que receberiam em uma viagem apenas de ida para Marte.
Para escapar de tal perigo uma parte da nave deve ser feita com uma blindagem especial para proteger a tripulação. Mesmo assim esta proteção não seria tão eficiente quanto a proteção fornecida pela atmosfera e campo magnético terrestre. Para se ter uma ideia, salas protegidas de radiação são feitas de chumbo, bário e concreto com considerável espessura.  Durante a viagem sensores especiais iriam detectar o aumento da incidência da radiação avisando a tripulação para se abrigar em um compartimento especial semelhantes a estas salas.
III – Alimentação
Em uma viagem de mais de um ano entre ida, volta e tempo no planeta a subsistência (comida e agua) é um ponto chave para o qual já possuímos várias soluções. A experiência obtida em várias décadas de exploração espacial principalmente em órbita da Terra levou ao desenvolvimento de tecnologia na fabricação de alimentos e reciclagem de água que pode sustentar uma pequena tripulação nesta viagem. Para se ter uma ideia do ponto atingido, até a urina dos astronautas é reciclada para ser bebida.
O principal ponto é que esta comida deve ser saborosa e visualmente atrativa, servindo como uma ligação dos astronautas com a Terra e fazendo com que eles tenham vontade de comer. Já se trabalham, por exemplo, com impressoras 3D para imprimir alimentos com fibras proteicas que lembrem os pratos feitos na Terra.
Pizza comestível sendo impressa. (https://3dprintinguk.com/pizza-printing-food-thats-world/ )
Não se pode pular refeições, uma vez que a perda de massa muscuar e óssea é critica na baixa gravidade. Já em Marte, a situação pode ficar um pouco mais tranquila. Naves não tripuladas terão levado alimento e sondas robôs terão retirado água dos depósitos de gelo que existem lá. Quanto ao oxigênio, ele é retirado da água ao se quebrar suas moléculas. Além disto, é importante ressaltar que se espera que sejam produzidos alimentos em Marte, usando técnicas de cultura que já se encontram bem avançadas.
IV – Retorno
O ultimo, mas não menos importante, problema a se resolver é a viagem de retorno. A nave não levará da Terra o combustível para a viagem de volta, pois não haverá espaço suficiente. Deve-se criar uma maneira de reabastece-la. A solução é sintetizar o combustível usando-se os gases da atmosfera de Marte. Este “posto de combustível” seria construído por naves robô que usariam o gás carbônico da atmosfera numa reação com hidrogênio obtido da eletrolise da agua obtida em Marte para criar oxigênio e metanol. Este combustível seria usado para o impulso inicial e desaceleração ao se aproximar da Terra, pois na reentrada em nossa atmosfera a velocidade deve ser reduzida para que o atrito não destrua a nave.
Um ultimo ponto a ser considerado para “encerrar”(será?) este pequeno texto é que ainda existem muitos desafio para a engenharia e as ciências básicas resolverem até o lançamento desta primeira nave tripulada, esperado para 2030.
Para saber mais sobre este assunto:
Destino Marte – Discovery na Escola - https://www.youtube.com/watch?v=TLeigjcyZ08
* Professor da EMGE (Escola de Engenharia de Minas Gerais)

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