segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Degradação ambiental está diretamente relacionada com as finanças, diz estudo

domtotal.com
Muitas multinacionais recebem 100% de capital estrangeiro através de suas próprias filiais situadas em paraísos fiscais, afirma o pesquisador.
Cabeças de gado em um assentamento ilegal da Floresta Nacional Jamanxim no estado do Pará, 29 de novembro de 2009.
Cabeças de gado em um assentamento ilegal da Floresta Nacional Jamanxim no 
estado do Pará, 29 de novembro de 2009. (AFP)

É um fato que a exploração dos recursos naturais está diretamente relacionada com a deterioração do meio ambiente, mas um grupo de pesquisadores suecos denuncia que o capital escondido em paraísos fiscais financia as empresas que operam na Amazônia brasileira e as pesqueiras.

"O capital financeiro está moldando os ecossistemas em todo o mundo", afirma Víctor Galaz, subdiretor do Centro de Resiliência de Estocolmo, na apresentação, nesta sexta-feira (30) em Santiago, de um estudo realizado por um grupo de pesquisadores da Universidade de Estocolmo.

Entre outubro de 2000 e agosto de 2011, 68% do capital externo que chegou a nove companhias do setor da soja e da carne bovina que operam na Amazônia brasileira foi transferido através de algum ou vários paraísos fiscais, principalmente das Bahamas, Ilhas Cayman, Antilhas holandesas e Panamá, aponta o estudo. No total, 18 bilhões dos 27 bilhões de dólares que receberam neste período.

"Isto representa até 90-100% do capital estrangeiro para algumas companhias pesquisadas", diz o estudo, em que participaram, além de Galaz, Beatrice Crona, Alice Dauriach, Jean-Baptiste Jouffray, Henrik Österblom e Jan Fichtner.

Mas nem todo o capital vem de fora. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) injetou cerca de 3 bilhões de dólares só em 2010.

Muitas multinacionais recebem 100% de capital estrangeiro através de suas próprias filiais situadas em paraísos fiscais, afirma o pesquisador.

O que ocorreu com estas nove empresas pôde ser estabelecido porque o Brasil era o único país que transparentava este tipo de operações através do Banco Central, desde 2000, mas a normativa foi abolida em agosto de 2011.

Os dados incluíam empréstimos de entidades estrangeiras, transações de leasing/aluguel e transações relacionadas com o comércio financeiro, como o adiantamento do pagamento das exportações e as transações financeiras para a importação.

No caso das empresas pesqueiras, embora só 4% dos navios de pesca registrados tenham bandeira de algum país paraíso fiscal, 70% dos navios que estão ou estiveram implicados em pesca ilegal tem bandeira de algum paraíso fiscal, afirma o estudo intitulado "Paraísos fiscais e degradação ambiental global".

O risco é que, quando se explora um sistema além de certo ponto, todo o ecossistema mundial é afetado, alertam os especialistas. "Há um limite para o desmatamento e o aquecimento porque existe o risco de que, caso se supere esse limite, parte da Amazônia se tornará uma savana", alerta Galaz.

Risco sistêmico

Por isso, "quando alertamos sobre a presença do setor financeiro (na exploração florestal), não é só para proteger a biodiversidade, o valor ecológico dessa floresta, mas para proteger a integridade do sistema climático. Se não se tem isso em conta, estamos ignorando um risco sistêmico na forma como estamos investindo", afirma.

"O acesso ao capital importa" e a maior quantidade de capital no mundo "não é verde, é cinza ou preto", afirma Galaz no país de seus ancestrais.

Embora as implicações políticas, econômicas e sociais relacionadas com estas jurisdições financeiras secretas sejam conhecidas, seu papel de apoio a atividades com consequências potencialmente negativas para o meio ambiente foram até agora amplamente ignoradas, lembra o estudo.

Boa parte do papel que estes paraísos fiscais jogam na economia mundial foi revelada nos chamados 'Papéis do paraíso' e 'Papéis de Panamá', que mostraram o modus operandi destas jurisdições financeiras secretas para escapar à transparência e eludir o pagamento de impostos, que poderia atingir 200 bilhões de dólares por ano.

Por isso, conclui Galaz, se os governos combatessem os paraísos fiscais, o meio ambiente também se beneficiaria, assim como de uma maior transparência sobre os fluxos de capital.

"O nível de secretismo financeiro é impressionante. É uma batalha constante ter informação financeira sobre investimentos", lamenta.


AFP

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