(Foto: Reprodução) |
Problemas de família e educação não faltam. Só quero apontar três, que se apresentam em muitas famílias, especialmente nas urbanas. O primeiro é o lar. Por causa de nosso sistema socioeconômico, a criança vai à creche a partir de seis meses. Durante todo o tempo da educação escolar, a convivência com os pais é apenas “subsidiária”, e muitas vezes absorvida por tarefas como levar a criança à academia, ao balê etc. No dia a dia, no “comum da vida”, os pais estão ausentes. Têm de compensar isso com atitudes de mimo e superproteção nos momentos disponíveis.
A principal educadora não será mais a babá, pois quem pode pagar?, mas a tv e os brinquedos eletrônicos. Podem colocar-se pontos de interrogação. É preciso que os pais trabalhem ambos em tempo integral? A academia e o balê são necessários? Ou será que a escola fica devendo no quesito da educação física? É preciso ter dois carros novos, e não dos mais simples? Por outro lado, se o transporte público fosse melhor, talvez bastasse um só. As coisas estão interligadas. Quem sabe, vamos apoiar as ações que promovem o transporte publico à preferência do carro particular. E aquele telão, precisa? Para ver a Copa? Mas, se economizarmos, e um dos dois pode ficar em casa, quiçá fazendo digitação para firma ou costurando para ateliê – o que rende bem –, qual dos dois é que se vai “sacrificar”? Antigamente se diria: a mulher. Mas não é necessariamente assim.
Aproveito para mencionar a ideologia que vê a família como supérflua e aconselho, como antiofídico, a leitura de Orwell (“1984”) ou de Doris Lessing (“Canopus in Argos”)... ou de alguma reportagem sobre a Coreia do Norte ou a China de Mao. A sociedade não se faz só de estruturas. Precisa de material humano bem concebido e “caprichado” desde a primeira fase.
O segundo está ligado ao primeiro: é o “filho único”. Seu problema não é só aquele que Vinicius de Morais declama... A população urbana do Brasil não é muito procriadora, fica abaixo do índice 2, que manteria a população estável. Se a população das cidades cresce é sobretudo porque há gente fugindo do campo, o que não é um bom sinal. E, cá entre nós, com toda a simpatia pelo princípio da bolsa-família, não se deveria estudar de mais perto o efeito de atração que essa política provoca em detrimento do trabalho no campo?
Novamente problemas interligados. Mas voltemos à questão que nos ocupa: o filho único da família urbana. “Como é que teus pais com dez filhos conseguiam educá-los?” Simples: os filhos se educavam uns aos outros. Nem sempre com métodos politicamente corretos. E não havia academia ou balê. O grande problema do filho único é socioafetivo. Sobrecarga de afetividade (que sufoco!) e daí incapacidade de solidão. Por outro lado, mimado por uma afetividade pouco diversificada, tendência a ficar no casulo, dificuldade de socialização – e ainda há quem quer promover o ensino em casa em vez da escola! Admito, por causa do caos socioeducativo, na escola aparece companhia que não é muito aconselhável, sobretudo, mas não só, nas periferias tomadas pelo tráfico de drogas.
A aventura de criar boas amizades, laços sociais... Ultimamente, essa aventura se reduz ao smartphone e o skype. Alternativa: já que não dá para ter dez filhos (seria um colapso ecológico!), vamos organizar redes entre as famílias (aí o smartphone pode ser útil) para oferecer aos jovens amplas possibilidades de socialização sadia e de engajamento na vida sociocultural. Tanto os escoteiros quanto os “alternativos” nos lembram de coisa interessante nesse sentido.
Problema número três: a educação escolar. O Ministério se chama “da Educação”, mas na realidade se limita à organização do sistema escolar público, principalmente o universitário, sendo que o Fundamental e Médio são confiados ao Município e ao Estado. Mas em todos os níveis percebe-se que a educação escolar não é o que poderia e deveria ser. Não preciso repetir, mais uma vez, os problemas: móveis demolidos, professores/as quebrados, programas esvaziados... E muita maquiagem, tanto na cara dos docentes como nas notas dos alunos.
Preciso é procurar soluções. É claro que não se pode esperar tudo das instâncias políticas. Nem todo mundo que entra e sobe na política faz isso com intenção de servir o povo. E mesmo os “idealistas” percebem logo quantos empecilhos os impedem de realizar seus projetos. A participação ativa da sociedade no ensino é indispensável. Está na Lei de Diretrizes e Bases do Ensino Nacional. E há também as escolas particulares. Cuidado: deve-se distinguir bem quais pretendem oferecer educação e quais só querem manter seu sistema comercial, de preferência com bastante lucro. De toda maneira, está na hora de uma ampla ação consciente neste campo.
*Johan Konings nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colegio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Foi professor de exegese bíblica na Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre (1972-82) e na do Rio de Janeiro (1984). Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (jesuítas) e, desde 1986, atua como professor de exegese bíblica na FAJE - Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte, onde recebeu o título de Professor Emérito em 2011. Participou da fundação da Escola Superior Dom Helder Câmara.
Nenhum comentário:
Postar um comentário