terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

A banalização da ignorância

A TV anestesia, ficamos passivos a ver o lamentável espetáculo da degradação humana.



Tragédia na escola de Realengo, Rio, 2011: a barbárie atinge o ápice. (Foto: Arquivo)
Por Ricardo Soares*

Não tenho a menor pretensão para a análise fecunda e nem me pretendo aqui original, visto que dizer que estamos a viver na era do "grande irmão", com câmeras espalhadas em todos os cantos, não é nenhuma novidade. Tanto que o conceito desvirtuado do "Big Brother" transformou-se em lixo planetário televisivo e a maioria da humanidade acredita mesmo que o termo  tem a ver com essa joça de programa e não com o conceito implantado dentro do livro 1984 de George Orwell.

Preâmbulo à parte, a reflexão me escapa pela quantidade diária com que os programas de lixo jornalistico na tv usam e abusam das tais câmeras de segurança usadas em edifícios residenciais, postos de gasolina, comércio ,bancos. Todos os dias a flagrar o que de mais desprezível pode fazer o ser humano. Esfaquear, atirar, espancar, machucar, agredir, predar, roubar. Reparem só na avalanche diária de imagens horrendas que essas câmeras jogam nas nossas vidas. Imagens amplificadas pela sanha irresponsável e gananciosa das grandes redes de tv que buscam apenas a audiência e não a pacificação ou apaziguamento de corações e mentes. O "deus-negócio" acima de tudo. Às favas com os escrúpulos, a ética, o bom senso, o respeito ao próximo.

A barbárie atingiu seu ápice (ou não, sempre podemos nos superar em matéria de degradação) com a divulgação macabra e irresponsável dos detalhes da tragédia daquela escola em Realengo em 2011. Imagens que provocaram impacto até em quem está habituado por força da profissão a lidar com a tragédia . Testemunhei muito disso na lida de repórter e não quis ver nada naquela ocasião. Seria incoerente demais , macabro demais,triste demais pois sei bem o que se passou ali naquela escola. Todos sabemos.

O mais triste de tudo é que todos os dias esse espetáculo de banalização da violência nos anestesia e ficamos passivos a ver o lamentável espetáculo de nossa decadência humana. Como se estivessemos num videogame onde mais um morto, um espancado e um ferido não fossem reais. A virtualidade excessiva empanou nosso senso de realidade. E impressionante como o excesso de vigilância que todas essas câmeras invasivas nos proporcionam não coibe mais qualquer espécie de violência. Muitos marginais, mesmo vendo as câmeras, não se dão ao trabalho de destrui-las e muito menos de ocultar os rostos. O excesso de vigilância, isso sim, banalizou a ignorância e agora não são poucos os que acham que praticar delitos diante das câmeras é, de certa forma, ganhar cinco minutinhos de triste fama diante dessa multidão de telespectadores que todos os dias adoece de descrença diante da telinha.

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