sexta-feira, 4 de abril de 2014

Um país de verdade

Enquanto a Educação chafurda, gastamos a bagatela de 30 bilhões de reais para sediar a Copa.

Por Max Velati*

Se não me engano foi Mark Twain quem disse que existem três tipos de mentiras: as pequenas, as grandes e a estatística. A coluna Rota de Fuga de hoje está carregada de estatísticas e eu ficaria muito feliz se estes dados fossem mentira. Infelizmente, basta olhar ao redor para ver que os números que apresento expressam com absoluta precisão a nossa realidade. 

Esta semana ganhou destaque na mídia o desempenho vergonhoso dos alunos brasileiros no “Pisa”, uma avaliação internacional de estudantes de países membros e convidados do OCDE, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Entre membros permanentes do OCDE e convidados, foram 44 países e o Brasil, disputando como convidado, ficou com o 38° lugar. 
Diferente dos anos anteriores, desta vez os testes não foram de leitura, matemática e ciências. Os alunos foram desafiados com problemas de lógica e raciocínio e apenas 1,8% dos alunos brasileiros foi capaz de resolver problemas complexos. Na média fizemos 428 pontos, bem abaixo do padrão de 500 pontos definido pela OCDE. O teste mostrou que 2 em cada 3 alunos brasileiros não conseguiram interpretar situações que exigiam apenas deduções diretas da informação dada e também não foram capazes de entender percentuais e gráficos.

Nossos alunos tiveram um fraco desempenho e não foi apenas falta de sorte. Considerando os mesmos países avaliados pelo OCDE, o professor brasileiro da rede pública recebe como salário menos da metade do que é pago aos professores de outros países. Enquanto a média estrangeira é de cerca de 41,7 mil dólares anuais, o nosso professor recebe 15,4 mil por ano. Nas escolas privadas a situação não é muito diferente. O professor ganha 16,3 mil dólares por ano e com isso apresenta-se para os pais um mistério intrigante, pois pagamos mensalidades altíssimas.

Outro índice que mostra o nosso fraco desempenho como nação é o IDH, o Índice de Desenvolvimento Humano. Nesta avaliação internacional são examinados aspectos fundamentais, tais como vida longa e saudável, acesso ao conhecimento e padrão de vida decente. Há anos o Brasil está estagnado na 85° posição, empatado este ano com a Jamaica e vencendo por duas posições a Armênia. Se quiser uma comparação com um vizinho, o Chile é o 40° na lista.

Na semana passada escrevi nesta coluna sobre a insensatez dos governantes, uma “loucura política” que leva quem está no poder a tomar o pior caminho, fazer a pior escolha a despeito dos bons conselhos, do bom senso e das evidências. Diante de distorções tão claras e tão evidentes escolhemos o pior caminho. Mesmo com sintomas tão patentes de um país doente, precisando de cuidados urgentes na educação, na saúde e na segurança, decidimos que as nossas verdadeiras prioridades são outras. 

Bobagem preparar melhor os nossos alunos e professores. Segurança pública não é essencial. As rodovias ainda aguentam mais umas décadas. Saneamento básico não é tão básico assim. O importante mesmo, o essencial para o desenvolvimento de um país... é o futebol. Queremos aqui neste solo esta festa alegre, colorida e cheia de emoções. Para sediar esta celebração narcotizante, para montar este circo esportivo, está plenamente justificado gastarmos a bagatela de 30 bilhões de reais. 

Um país de verdade se faz com grama e concreto.
*Max Velati trabalhou muitos anos em Publicidade, Jornalismo e publicou sob pseudônimos uma dezena de livros sobre Filosofia e História para o público juvenil. Atualmente, além da literatura, é chargista de Economia da Folha de São Paulo.

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