6 de março de 2015
Por Carlos Ávila
“A verdade da poesia”, de Michael Hamburger, é um desses livros que todo poeta (ou candidato a) deveria ler. Desconhecido no Brasil, Hamburger (1924/2007) é um alemão que se mudou com sua família para a Inglaterra, nos anos 1930, e permaneceu neste país até a sua morte. Foi poeta, tradutor, professor e crítico literário; salvo engano nosso esse é o seu primeiro e único livro traduzido no Brasil (saiu em 2007 pela Cosac Naify, vertido para o português – com cuidado e precisão – por Alípio Correia de Franca Neto).
O subtítulo do livro dá uma ideia imediata do percurso desenvolvido pelo autor: “tensões na poesia modernista desde Baudelaire”. A partir da obra daquele que é considerado o inaugurador da poesia moderna, Hamburger faz um profundo estudo de toda a poética do século 20, incluindo criadores de diversos países, línguas e tradições. Alia à análise dos textos as relações mais amplas entre lírica e sociedade, nas suas várias vertentes.
Como observa Viviana Bosi, certeiramente, na sua orelha, “as duas grandes guerras e as transformações tecnológicas refluem para dentro dos versos como experiências axiais, alterando a direção das inovações das vanguardas e marcando fundamentalmente a criação literária”.
“O que torna moderna a poesia moderna?” – questiona Hamburger, logo na primeira frase de seu livro, lançado em 1968 (ele recebeu um “pós-escrito” do autor na reedição de 1982, que essa tradução brasileira traz no final; ali o autor explica a razão de apresentar seu texto mais uma vez sem alterações).
Aquela interrogação inicial serve de mote para o detalhado e exaustivo exame da poesia do século 20 empreendido por Hamburger. Seu método é, tanto quanto possível, “direto” – via análise de poemas sem uso de uma ou mais terminologias específicas. A partir dos próprios textos o ensaísta vai tecendo uma intrincada teia de relações e interpretações para situar e dar conta da “condição de crise” da poesia e da linguagem contemporâneas, incluindo aspectos de sua produção e recepção.
Hamburger, no seu “pós-escrito”, afirma que “A verdade da poesia” é obra de um não especialista; mais ainda, de um anti-especialista. Pode-se discordar aqui e ali dele, mas é inegável a potência e a atualidade de seu ensaio.
Segundo Hamburger, o que “ameaça a sobrevivência da poesia é o que ameaça a sobrevivência da própria civilização, de qualquer tipo de verdade, de qualquer tipo de atividade significativa – nossas especializações fragmentadoras e fragmentadas, burocráticas, técnicas, econômicas e políticas”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário