sexta-feira, 12 de agosto de 2016

PAULO VI, O “PAPA ESQUECIDO” QUE INSPIRA BERGOGLIO

Paulo VI - 1
Paulo VI - 1

Alberto Chiara – 06/08/2016
Em 06 de agosto de 1978 morreu Giovanni Battista Montini. Memória do Pontífice, a quem tanto deve a época de reforma que estamos vivendo. Não por acaso foi ele que , encerrando  Vaticano II,  falou de uma Igreja “samaritana”, “serva da humanidade”, mais inclinada a “remédios encorajantes” do que a “diagnósticos deprimentes”, a “mensagens de confiança” do que “a presságios funestos”.


A vizinha Via Ápia estava cheio de pessoas desinformadas, se possível ainda mais sedentas de férias porque naqueles dias sentiam, como nunca, o peso das preocupações.  A tão ansiada recuperação da economia não tinha sido do tamanho esperado (não por acaso tinha sido em pouco tempo classificada como “melhorazinha”; pouca coisa, em suma).
Quanto ao mais, desânimo e medo predominavam:
o terrorismo das Brigadas Vermelhas;
o sequestro e o assassinato de Aldo Moro;
uma devastadora crise político- institucional fruto do escândalo Lockheed, que culminou com a renúncia do então Presidente da República,Giovanni Leone (15 de Junho), ao qual sucedeu, em 9 de Julho, Sandro Pertini.
Paulo Vi - 2
O dia 06 de agosto de 1978 era um domingo. Em Castel Gandolfo, a residência de verão dos papas, o relógio marcava 21:40 horas. Giovanni Battista Montini, Paulo VI, o 262o sucessor de Pedro, morreu como tinha desejado: longe dos holofotes e das vigílias do povo que tinham acompanhado a agonia de Angelo Roncalli, João XXIII, e anos mais tarde as últimas horas de Karol Wojtyla, João Paulo II.

Paulo Vi - 2
 “Ele tinha pedido a Deus que lhe concedesse um adeus solitário”, anotou há tempos ‘Avvenire’, o diário católico italiano: “Foi atendido”. Não só. Paulo VI morreu num dia especial, carregado de significado simbólico, o dia da Transfiguração: uma festa que ele amava a ponto de tê-la escolhido, em 1964, para publicar a sua primeira encíclica, a “Ecclesiam Suam”.
Estranho destino, o de Paulo VI. Foi primeiro criticado, depois contestado, por fim simplesmente esquecido, posto de lado sem a menor cerimônia, tachado com qualificativos particularmente mordazes: “o Papa da dúvida”, “Hamlet”, “Paulo Triste”.
Revendo hoje a sua figura com o rigor dos historiadores, Paulo VI revela-se totalmente diferente.
Foi o primeiro Papa do século XX a atravessar os confins da Itália.
Depois de 2000 anos, fez com que Pedro voltasse à Terra Santa.
Viajou para a África, para a América, para a Oceania e Austrália, para a Ásia, até quase às portas da China.
Foi o primeiro Pontífice a fazer um discurso nas Nações Unidas em Nova Iorque (falou na segunda-feira, dia 4 de outubro de 1965, com aquele “Nunca mais a guerra”, que muitos recordam em francês, a língua com a qual ele lançou o apelo angustiado: “Jamais plus les uns contre les autres, jamais, plus jamais”).
Giovanni Battista Montini foi até o primeiro Papa vítima de um atentado, mostrado ao vivo pela TV.
Aconteceu nas Filipinas, em Manila, em novembro de 1970: Paulo VI escapou de uma facada do artista boliviano Benjamin Mendoza, que assim mesmo o feriu, somente graças à agilidade do seu secretário, Don Pasquale Macchi, que empurrou para o lado o agressor.
Paulo VI
“levou para o mundo” a Igreja que saiu do Concílio.
Dialogou com a modernidade sem fugir dela e sem a condenar a priori.
Enfrentou com as armas nuas do Evangelho a Guerra do Vietnã.
Hoje não é a festa litúrgica de Paulo VI. Essa é celebrada em 26 de setembro, o dia em que nasceu. No entanto é oportuno lembrar hoje quem foi e o que fez Giovanni Battista Montini, porque agora estamos vivendo um tempo eclesial que deve muito ao Papa que veio de Brescia.  Incluindo a ênfase na misericórdia, que dá cor ao Ano Santo que está em pleno andamento.
Sim, porque entre os inspiradores de Jorge Mario Bergoglio está certamente este seu predecessor. O Papa Francisco não faz segredo disso. Mais do que palavras, porém, como sempre, contam os fatos.
E então
a Igreja em saída,
a Igreja sinodal, ou seja, aquela do caminhar juntos,
a Igreja que perscruta os sinais dos tempos,
sem falso otimismo mas sem fechar-se,
mais companheira de viagem do que fria preceptora,
esta Igreja que hoje respiramos todos os dias, tem em si muito de Paulo VI.
Não por acaso foi ele que, no discurso com que encerrou o Concílio Vaticano II, em 07 de dezembro de 1965, falou de uma Igreja “samaritana”, “serva da humanidade”, mais inclinada a “remédios encorajantes” do que ” diagnósticos deprimentes”, a “mensagens de confiança” do que a“presságios funestos”.
Uma gratidão pensada, foi a que  Bergoglio expressou em voz alta em 19 de outubro de 2014, ao proclamar Montini bem-aventurado.
“A respeito deste grande Papa,” – disse Francisco – “deste corajoso cristão, deste apóstolo incansável, não podemos, diante de Deus, dizer senão uma palavra tão simples como sincera e importante: muito obrigado!  Obrigado, nosso querido e amado Papa Paulo VI! Obrigado pelo teu humilde e profético testemunho de amor a Cristo e à sua Igreja!
  Nas suas anotações pessoais, o grande timoneiro do Concílio, após o encerramento da assembleia conciliar, escreveu: ‘Talvez o Senhor me tenha chamado e me mantenha neste serviço não tanto porque eu tenha alguma aptidão para isso, ou para que eu governe e salve a Igreja das suas dificuldades presentes, mas para que eu sofra alguma coisa pela Igreja, e fique claro que é Ele, e não outros, que a guia e a salva’ “.
“Neste humildade brilha a grandeza do Bem-aventurado Papa Paulo VI” – continuou Bergoglio – e são reflexões que não deixam de ser atuais: enquanto se delineava uma sociedade secular e hostil, soube conduzir com perspicaz sabedoria – e, por vezes na solidão – o leme da barca de Pedro, sem nunca perder a alegria e a confiança no Senhor.
Paulo VI soube dar realmente a Deus o que é de Deus, dedicando inteiramente a própria vida ao compromisso sagrado, solene e gravíssimo: o de continuar no tempo e dilatar sobre a terra a missão de Cristo, amando a Igreja e guiando a Igreja, para que fosse ‘ao mesmo tempo mãe amorosa de todos os homens e dispenseira de salvação’ “.

Alberto Chiara

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