sexta-feira, 14 de outubro de 2016

A pena que vale

domtotal.com
Viver tendo em vista a morte é balizador de escolhas.
Lázaro Ramos e Taís Araújo estarão em cartaz com peça em BH.
Por Gilmar Pereira

Aceitar que você é finito, que você vai acabar e, com você, seu mundo é uma tarefa para a vida. Soa estranha essa história de viver tendo em vista a morte. Contudo, o fim é um grande balizador de escolhas.

Quando se tem em mente a efemeridade que é viver, as opções são tomadas na base do “vale a pena?”. Quem entende que o tempo é curto, não quererá perde-lo com o que não importa. E é aqui que reside o cerne da questão: o que é importante para você?

Há uma máxima bíblica que diz: “onde está seu coração, aí está seu tesouro”. Como se sabe, o coração, como sede dos afetos, designa a pessoa em sua totalidade. Tem valor, portanto, aquilo em que você se aplica, aquilo com o que você se gasta, não somente aquilo de que gosta.

Por isso, não basta gostar de alguém, há de lhe dedicar tempo de qualidade para estar junto. Conforme se diz, “tempo é sempre questão de prioridade”. Quando não se tem tempo para algo é porque outra coisa lhe ocupa, sendo mais urgente, mesmo que não se tenha por ela tanta afinidade assim.

Surge, desse modo, um conflito. Por exemplo, trabalhar e estudar é preciso, mas isso toma o tempo que poderia ser gasto com os amigos e com as pessoas a quem se ama. Nesse caso, entra em jogo a necessidade de sobrevivência, pois pelo estudo se pode obter um bom trabalho e, por este, o sustento da vida. Às vezes se deixa aquilo que se ama em favor de algo cujo apelo é mais urgente.

O perigo está em deixar que a preocupação com a sobrevivência e bem-estar tome toda a vida e não sobre espaço para amar, para gastar tempo com aquilo que dá sentido à vida, para viver de verdade. Com frequência, observamos pessoas trocando o viver por garantir muitíssimo mais que as estruturas necessárias para a subsistência da vida. É como aquele pai que trabalha tanto para dar uma vida digna ao filho que, por chegar demasiado cansado, acaba não lhe dando carinho e ausentando-se dos outros aspectos da paternidade. Inverter a lógica é fácil. Machistas ciumentos também o fazem ao agredir “por amor”. Trata-se da contradição resumida na sentença “faço-te mal, para o seu bem”.

São de admirar as pessoas que viveram por uma causa, que foram capazes de se anular em favor do que realmente acreditaram. A coerência entre vida e coração é daquelas coisas que dão firmeza ao ser, que trazem satisfação e consciência reta. Viver pelo que vale a pena, faz a vida valer.

O topo da montanha

Das pessoas que viveram por uma causa e que, por isso, são exemplos à humanidade, consta o nome de Martin Luther King (1929-1968). Lembrado por seus discursos, sua grandiosidade está tanto nas palavras como em suas ações. Em época como a nossa, na qual torturadores são homenageados na câmara dos deputados, carecemos de referenciais melhores para nos inspirar.

Lázaro Ramos e Taís Araújo estão em cartaz com uma comédia dramática, da americana Katori Hall, remetendo aos últimos momentos da vida de Luther King. A história se passa na véspera de sua morte, quando o ativista político, após proferir um discurso em Memphis, teria chegado ao hotel Lorraine, onde teria conhecido uma pragmática camareira. Na peça, a camareira Camae está em seu primeiro dia de trabalho. Repleta de segredos, o que garante um ar de mistério, ela confronta ironicamente o pastor, lembrando-o de que é humano como qualquer outra pessoa. A peça conjuga emoção e humor e faz ecoar hoje as palavras do pastor no discurso “I’ve Been to the Mountaintop”.

A exibição de O Topo da Montanha será nos dias 15 e 16 de outubro, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1537 - Centro). As entradas que variam entre 50 e 120 reais (inteiras) estão sendo vendidas no site ingresso.com.


Gilmar Pereira
Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, graduado em Filosofia pelo CES-JF, graduando em Teologia pela FAJE. Apaixonado por arte, cultura, filosofia, religião, psicologia, comunicação, ciências sociais... enfim, um "cara de humanas".

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