sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Discernimento inaciano, um caminho humano e espiritual pela maturidade psicossocial

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Santo Inácio comunica um caminho pedagógico, humano e espiritual para treinar a liberdade.
Estátua de Inácio de Loyola ferido em Pamplona.
Estátua de Inácio de Loyola ferido em Pamplona. (Reprodução/ Periodista Digital).

(A. Ortega, Loyola&News) Como é sabido, Santo Inácio de Loyola é um dos mestres e testemunhas da espiritualidade, com esse legado significativo que ele nos deixou: seus Exercícios Espirituais (EE).

Nele nos propõe um método profundo e um verdadeiro (caminho) de discernimento. Tal como os estudos e pesquisas atuais nos ensinam, a espiritualidade e a visão de mundo inacianas estão à frente de seu tempo. Sendo pioneira do que, mais tarde, as ciências sociais ou humanas desenvolveriam com suas perspectivas críticas. Como, por exemplo, a psicologia e suas correntes, como a psicanálise.

A partir de sua própria experiência, como nos diz em sua Autobiografia (A), Inácio nos transmite os EE como um método de discernimento, apresentando-se como um profundo conhecedor da pessoa. Ele nos mostra os desejos, afetos, paixões, aspirações e motivações que marcam a pessoas, a busca de sentido para a vida e a transcendência do ser humano.

Santo Inácio afirma: "pressuponho que há em mim três pensamentos. A saber: o meu próprio, que provém simplesmente de minha liberdade e querer; e outros dois, que vêm de fora: um proveniente do bom espírito e outro do mau" (EE 32). Desta forma, Inácio está nos mostrando que o ser humano é constituido e afetado por determinadas realidades ou dinamismos. Como são a liberdade e a vontade pessoal (ver EE 2-3), que se realizam no bem ou no mal, na justiça ou na injustiça, na graça ou no pecado, na vida ou na morte. E essas realidades e dinamismos que nos afetam ou nos movem são aqueles que devemos contemplar, discernir e examinar ou valorizar para um desenvolvimento humano, psicossocial e integral.

Como percebemos, Santo Inácio comunica um caminho pedagógico, humano e espiritual para treinar a liberdade. E isso nos leva a um discernimento crítico para o bem, a uma existência de amor e libertadora do mal e da injustiça. É isso o que ele nos apresenta no Princípio e Fundamento (ver EE 23).

Santo Inácio e o dom da vida

O dom da vida, que para a fé é Deus mesmo, move o ser humano a discernir e escolher tudo aquilo que o liberta das idolatrias das coisas, da riqueza e do poder. A pessoa, então, realiza todo um discernimento, para a promoção e libertação integral desses ídolos que se colocam no lugar da realização humana e espiritual; que a impedem de ser livre para servir, amar e estar em comunhão fraterna com os outros, com o universo, a natureza, e com o próprio Deus.

Santo Inácio nos chama a toda essa contemplação e discernimento para alcançar o amor com sua práxis (ver EE 230-237). Deus é amor e ele nos dá sua Graça por esta comunhão de vida, bens e de serviço em prol do bem mais universal. Como nos transmite Santo Inácio, em sua experiência vital no Cardoner (A 31), significa contemplar e discernir todo o real com um olhar renovado, lúcido, razoável, crítico e transcendente.

Uma realidade global, diversa, inter-relacionada, dinâmica e aberta à transcendência. É ser honrados com o real que, como o próprio Deus em Jesus, exerce o olhar misericordioso e compassivo que carrega com a realidade. Assumindo em solidariedade o sofrimento, o mal, a morte e a injustiça sofridos pela humanidade e pelo mundo. A partir desta espiritualidade de encarnação da misericórdia e solidariedade, como Deus nos revela, vai-se efetuando a libertação de toda essa dor, pecado, mal, morte e injustiça.

Como T. Adorno nos mostrou, essa com-paixão pela dor nos leva à verdade. O pensamento que não é decapitado leva à transcendência, e a luz do conhecimento é toda essa libertação plena (ver Minima Moralia, 250). O desenvolvimento de todo esse discernimento e consciência crítica, moral e espiritual diante do mal e da injustiça que nos afeta, transcende-nos perante o Jesus Crucificado (EE 53) e, como I. Ellacuría nos ensina, aos crucificados da Terra. É o carregar com a realidade, com uma sabedoria ética, para baixar da cruz os povos crucificados.

À luz da fé no Crucificado e da razão, com suas mediações como as ciências sociais, o sinal permanente dos tempos, que sempre deve ser discernido e historizado, são os povos crucificados pelo mal e pela injustiça. O que significa assumir o controle de toda essa realidade, com uma inteligência social e histórica pela justiça com os pobres da terra.

Esta contemplação na ação do amor ao serviço da fé e da justiça com os pobres, nas comunidades humanas e eclesiais de solidariedade, nos traz de volta à mística do encontro e comunhão com Jesus Pobre e Crucificado (ES 116). Assim como, de forma decisiva, Santo Inácio o experimenta na Storta (AA 96). Portanto, o verdadeiro discernimento do bom espírito e do bem mais universal, para uma vida livre de humildade e amor que nos liberta do mal e da injustiça, é realizada na opção por esta cruz e pelos pobres com uma vida de pobreza solidária (Carta de Santo Inácio à Comunidade de Pádua).

Humanismo e bem comum

Como aparece na meditação de duas bandeiras (EE 136-142) e nos modos de humildade (EE 167-168), desde o seguimento de Cristo Pobre e Crucificado, é uma vida humilde e pobre que nos liberta dos ídolos da riqueza, poder e privilégios. O que nos leva a uma existência de realização, felicidade e desenvolvimento integral, de humanizar a vida, plena e eterna.

Desde seu próprio campo e especificidade, a mesma psicologia nos ensina esse caminho de maturidade humana e espiritual. Através de uma vida de amor e trabalho em liberdade, a serviço do bem mais universal, que transforma toda a existência e o mundo. O desenvolvimento psicossocial e a maturação (humano e místico-cristã) são alcançados neste amor e comunhão com os outros, com o coração da matéria-cosmos (T. de Chardin) e com Deus que nos chama a existir em solidariedade. Ou seja, a partilha de vida, de bens e de compromisso solidário com a justiça para a libertação dos pobres da terra.

Contra todos esses ídolos da riqueza-ambição, poder e violência. O ser humano e espiritual equilibrado, adulto e maduro é aquele que une de forma fecunda e inseparável a mística e a profecia. A comunhão fraterna de amor com Deus e com os outros transcende a anúncio da fé e da justiça, levando-nos à denúncia do mal e da injustiça e às lutas libertadoras das causas dos pobres em oposição a toda dominação ou opressão.

Buscar e encontrar a Deus em todas as coisas que, como Santo Inácio em sua maturidade (A 99-100), traduz uma mística da vida cotidiana e da alegria no mundo (K. Rahner). Estreitamente ligada à caridade política transformadora, para o bem comum mais extenso e intenso e para a esperança.

É um verdadeiro humanismo uma espiritualidade que discerne o bem: promover tudo o que dá vida, dignidade e justiça aos pobres; permitindo que as pessoas, os povos e os pobres sejam os protagonistas do seu desenvolvimento, promoção e libertação integral. Trata-se de buscar sempre o bem mais universal e a maior (magis) glória de Deus na civilização do amor, do trabalho e da pobreza.

 O bem comum mundial, o trabalho digno para toda pessoa, com direitos como um salário justo, uma economia ética ao serviço das necessidades da vida e dos povos. Em um desenvolvimento humano, ecológico, libertador e integral com uma vida austera, sóbria e sustentável. Diante da civilização do capital e da riqueza com os deuses falsos do lucro, do dinheiro, da possessão de bens, da riqueza do ganho (a qualquer custo) e de ter que alienar e escravizar todos os dons de pessoas fraternas, atenciosas, felizes e livres. Por todas estas razões, entende-se que, no momento, o Papa Francisco nos chama a todo esse discernimento humano, espiritual e libertador em uma cordial harmonia com a espiritualidade inaciana.

Periodista Digital - Tradução: Ramón Lara

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