Nas últimas décadas, 35% das áreas de manguezais foram perdidas (Foto: Divulgação) |
Marcus Eduardo de Oliveira
Não pairam dúvidas sobre a capacidade inigualável da economia capitalista globalizada em criar riqueza, expandir o crédito, estimular os avanços tecnológicos e assegurar o crescimento físico das economias de mercado, enaltecendo, com isso, o dogma do progresso, consubstanciando, equivocadamente, diga-se de passagem, a vida humana numa atividade cumulativa.
É correto afirmar que, ao menos nesses quatro pontos, a economia capitalista conseguiu nos últimos 50 anos dar provas incontestes de sua supremacia, principalmente em “produzir” riqueza e propagar o crescimento econômico.
Contudo, o que essa mesma economia capitalista não soube fazer com proeminência, nesse mesmo intervalo de tempo, foi conciliar crescimento econômico com preservação ambiental, muito menos soube priorizar o combate à pobreza e à miséria, em lugar de promover, em caráter majoritário, a criação de riqueza, razão pela qual há atualmente 14% (quase 1 bilhão entre 7 bilhões de pessoas) da população mundial passando fome diuturnamente, ocupando os bolsões de pobreza.
Se, por um lado, a economia mundial cresceu exponencialmente em termos de mais produção material, entulhando o mundo com diversas mercadorias, saindo de um PIB global de US$ 5 trilhões (em 1950) para US$ 50 trilhões (em 2000), por outro, a destruição ecossistêmica não encontra precedentes na história do mundo, muito menos os índices de desigualdades socioeconômicas que se avolumaram, criando como aludimos muito mais pobres e miseráveis do que “novos” ricos, ainda que a criação de riqueza, é importante salientar, seja um ponto preponderante da economia capitalista globalizada.
Especificamente em relação à destruição ecológica, a economia tradicional (paradigma neoclássico), desde seu surgimento, principiado pela revolução marginalista (a partir de 1870), tem sido potencialmente nefasta no modo como faz a economia crescer, pouco se importando para com os custos e a dilapidação do patrimônio natural ecológico decorrente desse processo, até mesmo porque, se tem algo mais que a economia convencional fez (e ainda faz) com eficiências ímpares, é subordinar toda a biodiversidade ao instinto produtor-dilapidador da atividade econômica. Razão pela qual faz a economia crescer (materialmente), porém, destruindo (ambientalmente).
São diversos os estudos e análises que corroboram em particular esse argumento. Apenas nas últimas décadas, de acordo com o Millennium Ecosystem Assessment (Avaliação Ecossistêmica do Milênio), 20% dos recifes de corais do planeta foram destruidos, e outros 20% completamente degradados. Apenas em 30 anos (de 1950 a 1980) mais terras foram convertidas em lavouras do que em 150 anos (de 1700 a 1850).
Além disso, 35% das áreas de manguezais foram perdidas nas mesmas últimas décadas. Atualmente, 25% dos estoques de peixes marinhos comercialmente explorados estão sobreexplorados.
Stephen Pacala, ecologista da Universidade Princeton, aponta que as 500 milhões de pessoas mais ricas do mundo (aproximadamente 7% da população mundial) são atualmente responsáveis por 50% das emissões globais de dióxido de carbono, enquanto os 3 bilhões mais pobres são responsáveis por apenas 6%.
Por conta da pressão econômica em sempre produzir cada vez mais, há, como resultado, um considerável esgotamento dos serviços ecossistêmicos de provisão (lavoura, criação, pesca de captura, madeira, lenha, recursos energéticos, água, produtos bioquímicos e outros), bem como dos serviços reguladores (qualidade do ar, controle de erosão, purificação da água e tratamento de resíduos, entre outros).
Somente a partir de 1959, houve 60% de aumento na concentração de CO2 na atmosfera. Não obstante a esse estrago ambiental, nos últimos anos a desigualdade social deu saltos quantitativos insuportáveis. Atualmente, 1,1 bilhão de pessoas sobrevivem com uma renda menor que US$ 1 por dia; quase 900 milhões de habitantes do planeta sofrem de subnutrição (consumo abaixo de 1900 kcal/pessoa/dia), e 2,6 bilhões não têm qualquer acesso a saneamento básico, não deixando de mencionar ainda a existência de 1 bilhão de pessoas que não contam com acesso à água potável.
Do outro lado dessa “moeda” chamada desigualdade, a riqueza grassa sorrateiramente a passos largos. Em 2012, o Credit Suisse Group (banco de investimentos sediado em Zurique) emitiu relatório intitulado Global Wealth Report 2012, apontando que a riqueza global foi estimada US$ 223 trilhões (dados de 2012). Possuindo entre cem mil e 1 milhão de dólares encontravam-se exatamente 344 milhões de adultos (equivalente a 7,5% do total de pessoas na maioridade no mundo). A pergunta que emerge das observações acima parece então ser uma só: até quando suportaremos a distorção de um modelo econômico capaz de criar riqueza destruindo a natureza?
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. prof.marcuseduardo@bol.com.br
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