segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Espera-se um resultado inesperado

Cenário politico europeu está a transformar-se, país a país, numa nova direção.
Por José Couto Nogueira*
Tal como acontece noutras democracias europeias – e nos Estados Unidos — também em Espanha o eleitorado se tem dividido nas últimas décadas em dois partidos principais, que o tempo e o espartilho da União Europeia aproximou. No caso espanhol, o Partido Popular (PP) de centro-direita, e o Partido Socialista (PSOE) de centro-esquerda. Mas na próxima eleição legislativa, em 20 de Dezembro
Não se pode dizer que este seja o cenário padrão de todos regimes democráticos parlamentares; em países tão completamente diferentes como a Dinamarca ou o Brasil, a Alemanha ou o Chile, funcionam coligações bastante heterogéneas, unidas pelas necessidades da altura. Mas o sistema multi-partidário em que realmente só dois tem representatividade e cujo modelo foi a Grã Bretanha (até ao aparecimento do Partido Liberal na década de 1980) estabeleceu-se por tradição em muitos outros, como é o caso da Espanha.
Este cenário beatífico, em que dois quase iguais se revezam nas rédeas e nas benesses do poder, está a ser abalado pela crise do chamado “modelo democrático ocidental”, provocada pelo domínio da economia sobre a política – dizem uns – ou pelo cansaço dos cidadãos com um sistema decrépito e corrupto – dizem outros.
No caso da Espanha, a mudança deu-se com o aparecimento do Podemos, um partido que, logo de início, em 2014, se apresentou como uma proposta anti-partidos. Fundado por um professor universitário de esquerda, Pablo Iglésias, apoiando-se nos inúmeros movimentos de protesto, os “indignados” que surgiram por todo o país em 2011, reclamando contra o agravamento das desigualdades provocado pela crise económica internacional e pela falta de resposta adequada quer do PP, quer do PSOE.
Nascido oficialmente em Janeiro, logo em Maio o Podemos conseguiu uns extraordinários 8 por cento nas eleições para o Parlamento Europeu.  Nos primeiros vinte dias de existência somou cem mil filiados e atualmente já é o segundo partido espanhol, à frente do PSOE, com 350 mil membros.
Os analistas consideram que o Podemos é um partido de esquerda, uma vez que o núcleo de fundadores vai de trotskistas a marxistas regionais (Catalunha, País Basco) mas Iglésias tem tentado fugir a esse rótulo. Uma afirmação típica: “Não há esquerda nem direita, há os que estão por cima e os que estão por baixo.”
Mas, mesmo recusando rótulos, o partido tem de se colocar no incontornável espaço político, e a sua posição é de esquerda contemporânea, ou seja: ausência de vocabulário marxista (mas não de praxis), propostas anti-europeistas, anti-globalização económica e liberalização dos costumes (pró-aborto, pró-casamento homossexual, descriminalização da maconha) e identificação com o Siryza grego e o Bloco de Esquerda português.
Na sexta-feira passada o jornal de referencia “El País”, organizou um debate inédito com os líderes dos quatro principais partidos: o PSE, Podemos,  Cidadãos (outro partido recém-nascido, menos radical do que o Podemos) e PP. O Secretario Geral do PP, Mariano Rajoy, numa arrogância que lhe poderá custar caro, recusou-se a comparecer.  O PP, que está no poder, tem vindo a perder popularidade muito rapidamente, mas mesmo assim quis enviar para o debate Soraya Sáenz de Santamaria, vice-primeira ministra, mas o “El País” recusou. O debate foi aceso, com duras confrontações, mas sempre cortez.
Contudo, o ineditismo foi alem do fato de ser um debate a quatro; também, pela primeira vez, não passou na televisão nem, evidentemente, foi publicado em papel; podia ser visto apenas na página da Internet do jornal, em “live streaming”. Os internautas puderam avaliar as propostas de Pedro Sanchez (PSOE), Iglésias e Alberto Rivera (Cidadãos) ficando vazio o podium onde deveria estar Rajoy.
Na inevitável sondagem que se seguiu ao debate, 47 por cento gostou mais de Iglésias, com Rivera em segundo e Sanchez em terceiro.
O PSOE, durante anos o grande partido espanhol, que relançou a democracia no pós-franquismo, corre o risco de se “pasokisar” – uma referencia ao partido socialista grego, o Pasok, que praticamente desapareceu do mapa. O eleitorado está igualmente dividido entre PP, PSOE e Podemos. Tradicionalmente em Espanha não há grandes coligações, pelo que tudo pode acontecer. Qualquer que seja o resultado, seria impossível de prever há apenas um ano ou dois.
Uma coisa é certa: o cenário politico europeu está a transformar-se, país a país, numa nova direcção. O que não é mau, se aceitarmos como válido e positivo o que disse Barak Obama (a propósito duma situação completamente diferente, mas de aplicação universal): “Quando algo não resulta ao fim de muitos anos, é porque precisa de ser mudado.”

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