terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Cidades sustentáveis demandam participação

A conclusão é do pesquisador Ériton Geraldo Vieira, que desenvolveu dissertação sobre o tema.
Contribuir efetivamente para uma mudança no modo de desenvolvimento das cidades é a proposta do pesquisador Ériton Geraldo Vieira*, da Dom Helder Câmara. Por dois anos, ele dedicou-se ao estudo do tema, em busca de mecanismos sustentáveis capazes de melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e instigá-los a participar do processo de formulação de políticas públicas. Os resultados foram reunidos na dissertação ‘O Direito à Cidade Sustentável no Estado Democrático de Direito’, que garantiu ao pesquisador o título de mestre em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável.
“São propostos vários mecanismos para a construção de cidades sustentáveis no Brasil e no mundo. Verificou-se que a maioria dos cidadãos brasileiros desconhecem os instrumentos legais referentes à política de desenvolvimento urbano, principalmente no que se refere à legislação do município que os mesmos habitam”, afirma Ériton.
Para desenvolver o trabalho, ele empregou o método dialético [com abordagem qualitativa, através de pesquisa exploratória] e contou com a orientação da professora Maraluce Maria Custódio. Também participaram da banca, como examinadores, André de Paiva Toledo, da Dom Helder Câmara, e Francisco de Castilho Prates, da Universidade Federal de Minas Gerais.  
“Gostei muito do trabalho, foi bem desenvolvido. O tema permite múltiplas abordagens e Ériton foi feliz nos recortes. A leitura correu bastante agradável”, avalia Francisco. Após a defesa, o mestrando concedeu a seguinte entrevista ao portal Dom Total. Confira:
O que motivou a sua escolha pelo tema ‘cidade sustentável’?
Procurou-se trabalhar ideias que contribuem efetivamente para uma mudança no modo de desenvolvimento das cidades em busca de mecanismos sustentáveis que tragam uma melhoria na qualidade de vida dos cidadãos e ao mesmo tempo instigue os mesmos a participarem nos instrumentos de políticas públicas dos municípios em que vivem. São propostos vários mecanismos para a construção de cidades sustentáveis no Brasil e no mundo.
Verificou-se que a maioria dos cidadãos brasileiros desconhecem os instrumentos legais referentes à política de desenvolvimento urbano, principalmente no que se refere à legislação do município que os mesmos habitam.
Do mesmo modo, percebeu-se um baixo teor de participação nos instrumentos disponíveis para participação popular referente às políticas públicas dos municípios.
E ainda, verificou-se que os próprios cursos de Direito, nas mais diversas instituições de ensino, não trabalham com o Direito Urbanístico, o que faz com que os profissionais da área estejam desinformados e incapacitados de buscarem uma melhoria nas políticas públicas dos municípios brasileiros.
A relevância e repercussão do tema também são percebidas por sua relação direta junto aos princípios básicos do Estado Democrático de Direito, em que a legitimidade do poder estatal emana do povo, pelo exercício da democracia, pautada na legislação tanto interna quanto a nível internacional. Dessa forma, é imprescindível que se faça presente a participação popular para a instrumentalização dos mecanismos que compõe as cidades ambientalmente sustentáveis no Estado Democrático de Direito. É uma decisão que condiz com os princípios democráticos do Estado de Direito, com a Constituição da República e com projeto de um país onde haja espaço para todas as pessoas. 
Com isso, o resultado desse projeto permitirá a implantação de avanços significativos ao oferecer a possibilidade de se investigar um marco no desenvolvimento das cidades do país atrelado a necessidade de um modelo de sustentabilidade onde haja a garantia de tutela de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e respeito aos direitos humanos. Também se espera contribuir para a discussão sobre a efetivação de práticas de planejamento urbano nos municípios, que sejam concomitantemente, democráticas, inclusivas e participativas.
Assim, a pesquisa possuiu importância pela discussão proposta, uma vez que o processo de urbanização das cidades no Brasil tem refletido um fenômeno social complexo, abrangendo uma variedade de implicações jurídicas, sociológicas e ambientais referente à forma como o desenvolvimento das cidades vem ocorrendo, buscando-se refletir sobre o modo de condução, construção e transformação do espaço em que se realizam as principais atividades (moradia, trabalho, comércio, serviços públicos e lazer) dos cidadãos: a cidade.
O tema é bastante amplo. Qual foi o objetivo delimitado para a dissertação?
O objetivo principal da investigação foi analisar os diferentes institutos de políticas públicas urbanísticas que proporcionam a sustentabilidade das cidades, conforme o modelo de planejamento urbano contemporâneo, que inclui a gestão democrática como ponto fundamental, de forma a sustentar a concepção de que a efetivação do Direito à Cidade Sustentável, associado ao exercício da cidadania, pode oferecer dignidade à vida das pessoas no espaço urbano que se caracteriza, sobretudo, por ser um espaço social, político, econômico, cultural e filosófico, onde são desenvolvidas as potencialidades humanas.
Do mesmo modo, pretende-se verificar em que sentido as políticas públicas desenvolvidas nas cidades são inclusivas dos interesses presentes na sociedade brasileira na medida em que há um inevitável complexo de impactos socioambientais para o alcance do desenvolvimento econômico do país, de modo a estabelecer um novo modelo de Cidades Sustentáveis amparado nas diretrizes do Estado Democrático de Direito. E por fim, pretende-se demonstrar a insustentabilidade do sistema de planejamento urbano gerido pelo Poder Público Municipal que desconsidera a participação da sociedade civil na elaboração e implantação de políticas públicas urbanas que interferem diretamente na qualidade de vida das pessoas e do planeta.
E como a pesquisa foi desenvolvida?
No que diz respeito às questões metodológicas, empregou-se o método dialético, com uma abordagem qualitativa, através de pesquisa exploratória, que proporcionou o aprofundamento do tema. O ponto de partida para o método dialético na pesquisa é a análise crítica do Direito à Cidade e da participação popular na elaboração e gestão de políticas públicas urbanas. A abordagem qualitativa é realizada através de análise bibliográfica, documental (com dados primários e secundários), e observação direta da atuação do Poder Público em relação à participação da comunidade. Com a pesquisa bibliográfica também foram analisados os fatos que resultaram no modelo atual de urbanização. E a pesquisa exploratória, por sua vez, proporcionou maior familiaridade com o problema e aprimorou as ideias através de outros estudos sobre o tema em foco que foi compreendido com maior precisão.
Observa-se que o Direito à Cidade foi objeto de estudos clássicos, como por exemplo, do referencial teórico da presente pesquisa, Henri Lefèbvre, desde 1968. O autor alertava para a forma como a cidade vinha sendo degradada, passando de local de uso, para se tornar lugar de troca. Assim, o espaço social que definia a vida urbana transformou-se em um espaço racional econômico e financeiro que se revela, por exemplo, no modo como o problema da moradia é encarado. Nesse passo, Lefebvre pleiteava, como numa espécie de declaração, o Direito à Cidade, ou seja, à vida urbana como condição do humanismo e de renovação da democracia. Deste referencial teórico surge uma proposta de avaliação do direito a Cidade e do planejamento urbano do ponto de vista da democracia participativa.
Dessa maneira, é perceptível o quanto o tema do Direito à Cidade e Lefebvre encontram-se atuais neste início do século XXI, uma vez que os problemas observados no espaço urbano e colocados pelo autor ainda estão muito presentes, notadamente em países como o Brasil.
A população na atualidade é eminentemente urbana, tornando-se de fundamental importância que as cidades realizem o seu planejamento urbano mediante leis e instrumentos que organizem a utilização dos espaços e propriedades públicas e privadas segundo parâmetros sustentáveis.
Como o direito à cidade sustentável é tratado pela legislação brasileira?
Foi realizado um estudo sobre a política urbana na Constituição Federal de 1988 e nos diferentes institutos jus-urbanísticos em vigor no ordenamento jurídico pátrio, conferindo especial ênfase à Lei Federal 10.257, autodenominada Estatuto da Cidade e ao Plano Diretor Municipal, observando-se a necessidade das administrações públicas atentarem para os dispositivos contidos nos referidos mecanismos legais bem como criarem órgãos gestores que possam entrelaçar com os cidadãos, que podem auxiliar na tomada de decisões a fim de propor um desenvolvimento ordenado das cidades brasileiras e das reais necessidades da população, contribuindo para a descentralização do poder do Estado sobre o rumo da cidade e a transparência das decisões dos problemas urbanos.
Ao final da pesquisa, quais as principais conclusões obtidas?
Concluiu-se que as Cidades Sustentáveis ascendem da situação de meros espaços territoriais, para local de formação de identidades e de exercício da cidadania, e dessa forma, para que as cidades possam se tornar justas e sustentáveis é necessário incorporar a participação da sociedade civil na elaboração e gestão do planejamento urbano no intuito de concretizar uma gama de direitos fundamentais, tais como a moradia, educação, saúde, o lazer, o trabalho, o direito de ir e vir (acessibilidade), a igualdade, o meio ambiente, entre outros.
Vive-se o Direito à Cidade Sustentável cotidianamente, na moradia, no percurso para o trabalho, no ambiente de estudos, nos passeios e encontros familiares, nas práticas comerciais, no ar que se respira, na alimentação, na produção de resíduos, no acesso a bens e serviços públicos; enfim, são vários os motivos pelos quais se sustenta o presente estudo, tamanha a sua importância para a coletividade.
Muitos são os sonhos em busca de um ambiente sadio e equilibrado voltado para construção de Cidades Sustentáveis. Mas também são muitos os problemas que, reconhecidos pela complexidade e dinamicidade das cidades, não permitem parar de sonhar. O caminho para o alcance desse sonho depende de cooperação e solidariedade.
Todos precisam trabalhar em conjunto com o Poder Público, para se ter o que buscar, o interesse comum.
Por fim, como avalia as contribuições de sua orientadora? E o mestrado oferecido pela Dom Helder Câmara?
Minha orientadora foi peça fundamental na elaboração do trabalho auxiliando-me em todos os pontos da pesquisa. Contribuiu de forma magnífica para definição do tema da dissertação dentro do campo de estudos coberto pela área de concentração que cursei, de forma que o objeto do trabalho de pesquisa abarcasse temas não corriqueiros, ou seja, que ele representasse esforços próprios na abordagem do objeto com alguma elaboração diferente daquela que existe na literatura da área. Temas de fronteira entre o Direito e outras áreas do conhecimento são bem vistos e incentivados, como foi realizado na dissertação, em que é possível verificar uma interdisciplinaridade com a Arquitetura, Geografia, Urbanismo, História e outras áreas correlatas.
A Escola Superior Dom Helder Câmara ofereceu todo suporte para realização da dissertação.
O Mestrado contribuiu para meu aperfeiçoamento e desenvolvimento intelectual, proporcionando uma formação humanística contínua e, além disso, tive a oportunidade de convívio e interação com outros profissionais das diversas áreas, possibilitando a ampliação de horizontes culturais e também o relacionamento interpessoal.
Aprimorei o desenvolvimento na pesquisa jurídica e aprofundei a atualização dos conhecimentos para atuação de forma prática e eficaz em órgãos e entidades do setor público e privado, bem como em consultorias e assessorias jurídicas na área do Direito Ambiental em sintonia com as exigências do mercado de trabalho.

*Ériton Geraldo Vieira é mestre em Direito pela Escola Superior Dom Helder Câmara (2015). Bolsista pela FAPEMIG. Especialista em Direito Público pelo Instituto de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2013). Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil pelo Centro Universitário Estácio de Sá de Belo Horizonte (2015). Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2011). Advogado.

Redação Dom Total

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