ZENIT entrevista o Pe. Eugênio Maria La Barbera, sacerdote italiano, fundador da Fraternidade Monástica dos Discípulos de Jesus, FMDJ
Uma conversa sem pingos nos “ís”, sem censura, aberta e franca. Isso foi o que nos proporcionou o sacerdote italiano, Pe. Eugênio Maria La Barbera, em uma longa mas valiosa entrevista concedida a ZENIT. O tema? Seu trabalho apostólico no Brasil, as curas, os milagres, a Renovação Carismática Católica, liturgia, dom de línguas, a política no país…
Pe. Eugênio foi sacerdote do PIME (Pontifício Instituto das Missões) e atualmente é fundador da Fraternidade Monástica dos Discípulos de Jesus, FMDJ, em processo de aprovação pontifícia.
Acompanhe a íntegra da entrevista abaixo:
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ZENIT: Você é um sacerdote religioso? Vive em comunidade? Qual a sua permissão eclesiástica para atuar na diocese à qual está incardinado? Fale um pouco sobre o seu trabalho apostólico.
Pe. Eugenio – Eu era um sacerdote do PIME (Pontifício Instituto das Missões), um Instituto que não era religioso, não tendo os votos. Saí do PIME quando tive um chamado em Medjugorje, onde Nossa Senhora, que aparece sob o título de Rainha da Paz, me chamou através da vidente Viska, para fundar uma comunidade onde se rezasse. Depois de ter refletido muito e ter consultado o meu diretor espiritual, Monsenhor Waldemar, o bispo diocesano e até o Papa João Paulo II, pensei em fundar uma comunidade monástica – Fraternidade Monástica dos Discípulos de Jesus, FMDJ – onde hoje nós temos 02 mosteiros: o ramo masculino, Mosteiro “Regina Pacis” (Rainha da Paz) e o ramo feminino, o Mosteiro da Visitação.
Estamos na Diocese de Santo Amaro e fomos reconhecidos pelo bispo diocesano da época, Dom Fernando Antônio Figueiredo, ofm – agora bispo emérito.
Atualmente a Diocese de Santo Amaro tem como bispo Dom José Negri, do PIME, que já esteve duas vezes em nossa comunidade para visitar nossos mosteiros.
Os sacerdotes do mosteiro ainda estão incardinados na Diocese de Santo Amaro, mas já foi pedido à Santa Sé o reconhecimento da nossa Fraternidade como Priorado Sui Iuris.
O nosso trabalho apostólico tem como prioridade a oração, a vida contemplativa, sem excluir as necessidades práticas de todos os dias, já que vivemos no meio de uma grande comunidade carente; como já disse acredito muito na oração, já que com a oração podemos mudar o mundo.
Vivendo há mais de 20 anos na periferia de Santo Amaro, em São Paulo – nos preocupamos com as pessoas carentes que vivem ao nosso redor, e é por isso que toda 3 ª feira abrimos os portões do Mosteiro, a partir das 14h30, para oferecer o sopão. Antes o alimento era oferecido somente às crianças, mas hoje, devido à crise econômica pela qual o Brasil está passando, são também as famílias que recebem o alimento, famílias de qualquer religião, naturalmente. Somos ecumênicos e acreditamos na unidade – aqui cito um exemplo – um pastor da redondeza nos procurou e pediu a nossa ajuda para ocupar-se de drogados, nós o ajudamos com muita alegria. Ultimamente também ajudamos uma casa de idosos, dando o necessário para poderem sobreviver, porque não têm ajuda suficiente dos órgãos públicos.
Como apostolado, realizamos também, mensalmente, para os leigos e leigas, um retiro pregado por um dos nossos sacerdotes. A Casa de Retiro acolhe também aquelas pessoas que queiram passar um dia, três dias ou uma semana de silêncio, dirigidas por um dos nossos padres.
“Como apostolado, realizamos também, mensalmente, para os leigos e leigas, um retiro pregado por um dos nossos sacerdotes. A Casa de Retiro acolhe também aquelas pessoas que queiram passar um dia, três dias ou uma semana de silêncio, dirigidas por um dos nossos padres”
Pessoalmente, atendo o chamado a pregar retiros e exercícios espirituais para sacerdotes, religiosos, religiosas e para leigos. Algo que também enriquece o meu sacerdócio e o meu SER MISSIONÁRIO.
ZENIT: A sua formação eclesiástica parece ser bastante completa, com estudos em excelentes universidades eclesiásticas. Desde quando você descobriu a sua vocação carismática?
Pe. Eugenio: Penso que a minha formação eclesiástica foi bastante completa, sobretudo pelo zelo e empenho do Padre Gaetano Favaro, um homem excelente que foi professor, reitor do seminário e também meu padre espiritual.
Tive a oportunidade de estudar em Roma, na Gregoriana como também no Theresianum. Esses cursos me ajudaram na construção espiritual da nossa Fraternidade Monástica.
Creio que não exista uma vocação carismática. A Igreja toda é carismática desde o princípio. A Renovação Carismática não é ou não deveria ser um movimento como tantos outros, pois não tem fundador. É uma corrente de Graça que entrou na Igreja depois do apelo do Papa João XXIII, que pediu uma renovada efusão do Espírito Santo. Comecei a me interessar pela Renovação Carismática quando o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns me nomeou Diretor da RCC. Tal nomeação foi confirmada pelo novo Bispo de Santo Amaro, depois da divisão da Arquidiocese. Durante um retiro pregado pelo padre Emiliano Tardif, aceitei o que, na Renovação, se chama de “Batismo no Espírito Santo“. Foi no dia 19 de julho de 1982. Percebi que até aquele dia eu era como um motorista dirigindo o meu carro, ou seja, minha vida, virando para a esquerda ou para a direita, segundo a minha vontade. Mas naquele momento, me parecia também, sentir o cansaço das minhas mãos que queriam dirigir a minha vida. A inutilidade de todos aqueles esforços em dirigir a minha vida para a direita ou para a esquerda. Então, me lembro muito bem que disse: “Ok, Senhor! Eu te dou as rédeas da minha vida. Deste momento em diante elas são tuas. Conduza-a como Tu quiseres! ” E foi importantíssima aquela decisão. Talvez tenha sido a decisão mais importante da minha vida. Até mais importante é do que a minha ordenação sacerdotal. Comecei, com novo ardor, a pregar centenas de retiros no Brasil e pelo mundo, percebendo que as minhas palavras eram confirmadas por inúmeras curas espirituais e físicas. Por isso, ainda hoje, com a permissão escrita do Bispo Diocesano, que reconhece o meu carisma de cura, celebro uma vez por mês a Missa para os enfermos em nosso Mosteiro.
“Ainda hoje, com a permissão escrita do Bispo Diocesano, que reconhece o meu carisma de cura, celebro uma vez por mês a Missa para os enfermos em nosso Mosteiro”
ZENIT: Na sua opinião, como separar os verdadeiros dons do Espírito Santo das falcatruas que possam existir?
Pe. Eugenio: “Amai-vos uns aos outros. Como eu vos tenho amado, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”.
O Espírito Santo é Amor, quando se fala através do Espírito Santo, as pessoas entendem e creem. É necessário ter discernimento para saber quando é o Espírito Santo ou quando é uma opinião humana. Somos todos pecadores e dentro da Igreja sempre haverá homens que irão se aproveitar do nome da Igreja para fazer “carreira”. Isso também existiu entre os discípulos de Jesus e se repete e se repetirá até o último dia. “Veio-lhes então o pensamento de qual deles seria o maior”.
“É necessário ter discernimento para saber quando é o Espírito Santo ou quando é uma opinião humana”
Quando falamos sobre os carismas, sabemos que são dons para o bem comum. Os carismas que recebemos gratuitamente não são para nosso benefício ou vanglória. Os carismas são diferentes dos frutos do Espírito. A doutrina Apostólica dos frutos do Espírito se baseia sobre o pensamento de Jesus, não o contradiz. Lembram-se o que disse Jesus daquela árvore que não produziu frutos? Disse: “Toda árvore que não produzir bom fruto será cortada e lançada ao fogo”. E esta árvore, poderia ser cada um de nós que, há muito ou pouco tempo, vive dentro da Igreja Católica. Digo isso porque aqui e acolá, dentro da Igreja, como em várias Congregações religiosas nas quais fui convidado a pregar e até em minha comunidade, se notam incertezas, confusões que nós, Ministros da Palavra, temos o dever de apontar. Porque se nós não as apontamos, essas confusões podem circular entre nós como erva daninha, como gangrena e podem infectar o corpo inteiro.
Paulo, nas cartas pastorais, chama essas pessoas que perturbam e criam confusões “como aqueles que se introduzem nas casas e conseguem cativar mulherzinhas carregadas de pecados, sempre aprendendo, mas sem jamais poder atingir o conhecimento da verdade” (2 Tim. 3,6).
ZENIT: No seu caso, você já foi acusado de embusteiro ou algo parecido? Qual a sua resposta?
Pe. Eugenio: “Se o mundo vos odeia, sabei que me odiou a mim antes que a vós”. Esta é a minha resposta! Não fico me defendendo, caminho pela minha estrada em comunhão com Deus, com os irmãos e com Dom José Negri, que é o meu Bispo Diocesano. Certamente erros foram cometidos e tento sempre corrigir-me para caminhar na estrada da Santidade que a Rainha da Paz nos ensina daquela longínqua terra de Medjugorje e em todas aparições da Virgem Maria.
ZENIT: Os milagres acontecem, as pessoas podem ser curadas – tudo isso é evangélico. Nesse sentido, por que é tão difícil para as pessoas aceitarem a existência do milagre hoje?
Pe. Eugenio: Eu não sei se são milagres os que acontecem comigo. Prefiro a definição de São João – são sinais de Deus para o povo de Deus. Sim já vi pessoas curadas de câncer, de cegueira, das pernas, e outras curas das quais as pessoas dão testemunho mostrando os laudos médicos. Não sei dizer por que o Senhor cura determinadas pessoas e outras não. Já disse em outros veículos de comunicação, que essa é uma das perguntas que farei a Jesus quando me encontrar ELE no paraíso.
ZENIT: Qual a finalidade do milagre? A pessoa que só busca o milagre pelo milagre sempre recebe o dom maior da conversão?
Pe. Eugenio: A cura maior é a cura do espírito; quando eu atendo pessoas na confissão, que há mais de 20, 30 ou 50 anos não se confessam e depois de uma missa de cura me procuram para se confessar, este é o maior milagre que eu vejo, porque se iniciou um processo de conversão. Estas pessoas se tornam, depois da absolvição, como uma página branca na qual Deus pode novamente escrever o que bem quiser, se tornam como as crianças que viviam ao redor de Jesus!
“A cura maior é a cura do espírito; quando eu atendo pessoas na confissão”
ZENIT: Quanto tempo você dedica para a confissão auricular? Ou seja, quanto tempo você dedica para confessar os fieis?
Pe. Eugenio: Em nosso mosteiro chegam pessoas todos os dias para se confessar. O atendimento de confissão durante a semana é sempre depois da missa das 18h00 enquanto se reza o terço. Há padres para atender as confissões.
No sábado confessamos (todos os padres disponíveis) a partir das 15h00 até 16h30, antes da missa vespertina. Eu estou sempre à disposição para confessar as pessoas, desde que haja tempo permitindo. Dedico a quinta-feira à tarde para o atendimento de confissões no mosteiro. Posso afirmar que atendo muitos jovens; isso significa que os jovens estão precisando de padres que os atenda.
O problema é que hoje não há padres para atender as confissões e esse é um problema mundial.
O importante para mim é ser padre, ser feliz por ser padre, não ter vergonha de ser padre e assim as pessoas se aproximam e se confessam.
“O importante para mim é ser padre, ser feliz por ser padre, não ter vergonha de ser padre”
ZENIT: Você se confessa? Tem diretor espiritual?
Pe. Eugenio: Eu me confesso. Depois da minha conversão em Medjugorje eu me confessava toda semana. Agora me confesso a cada 15 dias.
Nesses 38 anos de sacerdócio eu tive 02 confessores, o padre Gilberto Defina, que já faleceu, e agora Monsenhor Waldemar que está atualmente com mais de 90 anos. Sempre tive na minha vida, desde o seminário, o meu confessor que normalmente era também padre espiritual.
ZENIT: Algo que se nota, em certas ocasiões, é que ao redor de um sacerdote que celebra missa de cura, pode acontecer o fenômeno da corrupção, da recepção de dinheiro e donativos provenientes de fontes obscuras etc. – há um caso recentemente investigado na “Lava Jato” de um sacerdote em Brasília. Como você se defende desse tipo de acusações e de ocasiões de corrupção no seu apostolado?
Pe. Eugenio: Eu não passo por essas situações. Desde o início do meu sacerdócio missionário, nunca, e escrevo novamente, nunca toquei ou contei o dinheiro da espórtula. Havia sempre pessoas de confiança que contavam o dinheiro e o levava ao banco, cujo gerente da época era também o tesoureiro da paróquia.
Sempre trabalhei no meio dos mais necessitados, começando pela primeira experiência com os índios Terenas no Mato Grosso. Na extinta “favela do buraco quente” que naquela época era uma das mais perigosas favelas de São Paulo, não podia, certamente, pedir dinheiro aos que moravam lá, que, contudo, ofereciam o que podiam.
O Mosteiro tem sempre um ecônomo que lida com o dinheiro e todos os recursos recebidos são para a manutenção da estrutura física dos dois mosteiros, bem como da casa de retiro, da Igreja de Deus Pai e do salão “Mamma Margherita”, onde recebemos os mais carentes para a distribuição do sopão como já disse anteriormente, onde fazemos a catequese e outros trabalhos. Os recursos financeiros para aquisição do terreno onde estamos, para a construção da Igreja de Deus Pai e de toda a estrutura foram doados por mim a partir do recebimento da herança da minha família. Aqui não estou enaltecendo a minha oferta à Igreja e nem assumindo uma atitude soberba. É que desde que fundei a Fraternidade Monástica dos Discípulos de Jesus eu já escutei de tudo, então aproveito para esclarecer nessa entrevista o que é fato.
A respeito das Missas de Cura, como disse anteriormente, as ofertas vão diretamente para as mãos do ecônomo que presta contas à Comunidade.
Determinados escândalos, na minha maneira de ver, são muito complexos. Na maioria das vezes os vocacionados que ingressam no seminário são jovens muito pobres que podem ter a vocação para o sacerdócio ou não, e eles se acostumam a ter tudo, sem pagar nada, e nem poderiam. As famílias não têm possibilidade de ajudar. Eu me lembro que durante os anos de estudos nos Salesianos, viviam jovens que não podiam pagar a mensalidade, contudo ajudavam nos serviços à comunidade: servindo à mesa, lavando os pratos, limpando as salas e em outras atividades cotidianas e que não atrapalhavam em nada os seus estudos e nem era uma humilhação. Uma vez fiz esta proposta, mas foi vista como um abusar dos pobres…. Na minha época de seminário, durante as férias todos os seminaristas iam trabalhar como faxineiros nas fábricas etc. e nós pagávamos os livros e tudo o que fosse necessário. Foi uma experiência interessante e muito boa, porque as pessoas se encontravam conosco e nos admiravam e faziam amizade conosco. Era bom para nós e para a Igreja. Agradeço o PIME que me proporcionou essa experiência, pois assim aprendi como viver com muito e com pouco.
“Na minha época de seminário, durante as férias todos os seminaristas iam trabalhar como faxineiros nas fábricas etc. e nós pagávamos os livros e tudo o que fosse necessário”
A respeito do padre citado, de Brasília, ao que se sabe pela investigação, teria recebido de boa-fé os recursos, como contribuição para uma festa tradicional que se realiza anualmente em sua Paróquia, embora eu também observe que não somente padres, mas até bispos muitas vezes gostam de ter dinheiro e de “aparecer”. Normalmente são aqueles que enchem a boca de pobreza. “Parlano bene e razzolano male”, se diria na Itália! Contudo, isso aconteceu também com Judas, que era discípulo de Jesus e acontece com os governantes de ontem, de hoje e na sociedade em geral.
ZENIT: Sobre o dom de línguas: qual a sua opinião? Às vezes se presencia, hoje em dia até em canais de TV com inspiração carismática, certos pregadores, sacerdotes, que dizem literalmente para as pessoas enrolarem a língua, soltarem a voz, falarem coisas estranhas, a fim de que “o Espírito Santo atue e lhes dê o dom”. Isso é correto, na sua opinião? Não é fingir um dom do Espírito?
Pe. Eugenio: O dom de línguas existe porque fala Paulo. “Aquele que fala em línguas não fala aos homens, senão a Deus: ninguém o entende, pois fala coisas misteriosas, sob a ação do Espírito”. As maneiras como se exerce este carisma poderia ser revisto hoje. Eu pertenço à primeira “turma” da Renovação Carismática Católica (RCC), época em que pertencer à Renovação era objeto de crítica. Nunca vi na TV pessoas carismáticas que dizem aos outros para enrolar a língua. Não tenho conhecimento desse fato.
Na minha opinião não se pode fingir um dom de Deus.
Lembro-me de um acontecimento – quando diretor da RCC – estávamos no pátio de Castel Gandolfo, cantando em línguas, na espera de João Paulo II. O Papa estava descendo a escada que conduzia ao pátio, acompanhado pelo Cardeal Ratzinger. O microfone do Papa estava ligado e escutamos o Papa dizendo ao Cardeal Ratzinger: Eminência não se espante, porque estão cantando em línguas, é obra do Espírito Santo, acredite! Não escutamos o que respondeu o Cardeal Ratzinger.
“Na minha opinião não se pode fingir um dom de Deus”.
ZENIT: As principais curas não são aquelas da alma, ou seja, aquelas que nascem de um acompanhamento espiritual, de uma direção espiritual, de uma frequência nos sacramentos? Por que, então, frisar na cura e libertação das pessoas? Cura de quê? Libertação de que ou de quem?
Pe. Eugenio: Sim a cura da alma acontece quando ela é direcionada espiritualmente por um santo sacerdote. É a minha experiência pessoal. Mas também devemos proclamar a cura física através dos testemunhos, para que as pessoas vejam a ação de Deus. Recentemente celebrei em Cuiabá e proclamei que muitos coxos, paralíticos e pessoas com muletas podiam se aproximar do altar, e assim aconteceu! A libertação, claro, é do pecado, eu nunca chamei a missa de cura e libertação; esta talvez seja uma colocação típica do Brasil. Eu a chamo Missa dos enfermos, mas popularmente é conhecida como Missa de Cura.
Por muito tempo, com a permissão do bispo, exerci o apostolado do exorcismo e é claro que vi pessoas sendo libertas do demônio através do exorcismo da Igreja. Muitas pessoas são libertas também durante a confissão. A cura é sempre algo de espiritual e acontece quando Deus toca em uma alma. Foi aquilo que disse anteriormente – uma pessoa participa de uma missa de cura e, depois de muitos anos sem se confessar, resolve fazê-lo – essa pessoa foi tocada pelo Espírito Santo e não pelo padre Eugenio. Infelizmente, dentro da Igreja há vários tipos de missa aprovadas ou não pelos bispos – que se assemelham mais a um show do que a uma função sacra. Penso que na Igreja, cada um assuma a sua responsabilidade pelos seus atos e que quem exerce o ministério de serviço no episcopado se preocupe para que não aconteçam coisas que desagradem ao Senhor e que escandalizem o povo de Deus!
ZENIT: Não será que a renovação carismática frise mais o lado da conversão inicial e deixe de lado o processo de continuidade através dos meios ordinários da Igreja, que Cristo nos deixou, como os sacramentos, a oração?
Pe. Eugenio: Existe um fenômeno alarmante dentro da Igreja Católica. Muitos fiéis católicos vão aonde existe um pregador de fama, de sucesso, seja ele católico, evangélico ou protestante, abandonando o conteúdo da verdade que desde sempre o Magistério da Igreja nos convida a seguir. Quantas palavras humanas pregamos, quantas frivolidades. Fala-se, durante a pregação, da última novela, de artistas, de programas de televisão, de time de futebol… e se perde de vista a verdade que é Cristo Jesus Senhor.
No início da Igreja a fé se transmitiu assim: Cristo morreu, Cristo Ressuscitou, Cristo é o Senhor! E, escutando estas palavras, vocês se lembram do que aconteceu no dia de Pentecostes? Aquelas três mil pessoas sentiram transpassar o coração e disseram: “O que devemos fazer, irmãos? “Arrependei-vos”, respondeu Pedro, e nasceu a Igreja primitiva. Esta, eu creio, é, e deve ser a contribuição da Renovação Carismática para a Igreja deste novo milênio. O ter descoberto Jesus Senhor. Não como um todo para dizer, Senhor, Senhor e cair na condenação dos homens, dos males dos homens; mas saber anunciar o Kerigma, que consiste em fazer descobrir e experimentar Cristo Ressuscitado, do qual depois virá todo o resto. Somente depois, falaremos dos deveres para com a família, dos deveres no trabalho, da catequese, da ética, da moral, da justiça, dos sacramentos, de tudo, mas antes devemos levar as pessoas ao contato direto com Cristo Jesus Senhor, se não, seríamos como aqueles fariseus que colocavam nas costas das pessoas cargas insuportáveis, porque elas não tinham estrutura para carregá-las. Seria como colocar uma série de vagões novinhos, sem colocar na frente o motor para puxar estes vagões. É Jesus Senhor o motor de tudo! Eu creio que nós da RCC temos esta pequena tarefa dentro da Igreja. Não dizer, Senhor, Senhor, mas aquela tarefa de injetar dentro da Igreja esta carga elétrica que vem do descobrimento de que Jesus é o Senhor.
ZENIT: Sobre a liturgia. Muitas pessoas frequentam as suas missas de cura? A missa de cura em si não desrespeita a liturgia aprovada pela Igreja, ao colocar palavras onde não se deve, ao realizar orações onde não está contemplado? Nesse sentido, não seria melhor, em vez de uma missa de cura, realizar a missa e logo após a celebração litúrgica, então sim, realizar as orações de cura e libertação?
“Há padres inclusive que se dizem da Renovação Carismática e querem ganhar dinheiro, então criam a sua própria liturgia – um show”
Pe. Eugenio: Hoje o perigo maior não é que a liturgia seja desrespeitada assim como aprovada pela Igreja, mas que seja banalizada pelos cristãos, pelos religiosos e pelos sacerdotes, banalizadas, isto é, tratada como coisa ordinária que se pode levar de um lado para outro, na frente da qual se pode passar levianamente sem uma genuflexão, sem um ato de adoração. Eu celebro a Santa Missa conforme o Missal Romano, fazendo aquelas aberturas que o mesmo Missal me permite. Lembro-me que durante uma aula de liturgia, quando seminarista, que um outro seminarista disse ao professor de liturgia que o Papa João XXIII não tinha levantado as mãos até os ombros, o professor com toda segurança declarou que o Papa cometeu um pecado mortal…. Hoje nós rimos destas coisas, mas antigamente aconteciam. Certamente se poderia celebrar a Santa Missa e depois fazer uma oração de cura. Pessoalmente creio que a presença de Jesus Eucarístico é muito importante. Tem razão em me fazer esse questionamento porque há padres inclusive que se dizem da Renovação Carismática e querem ganhar dinheiro, então criam a sua própria liturgia – um show. Temos vários padres que parecem não viver em uma Igreja, mas num circo. Não podemos fazer nada em relação a eles, porque são aceitos pelos seus bispos diocesanos. Ainda uma vez, me permito sublinhar que, se tantos escândalos acontecem na Igreja, são devido à falta de cura pastoral dos bispos.
Na Itália se diz “Tale padre, tale figlio”… A bom entendedor meia palavra basta……
“Hoje o perigo maior não é que a liturgia seja desrespeitada assim como aprovada pela Igreja, mas que seja banalizada pelos cristãos, pelos religiosos e pelos sacerdotes”
ZENIT: Você dedica tempo para formar as pessoas que frequentam as suas missas?
Pe. Eugenio: Dedico o tempo que me permite a homilia. Mas, naturalmente, antes dedico tempo e oração na preparação da homilia. Ao meu modo de ver há duas formas de preparar uma pregação ou qualquer anúncio de fé oral e escrito. Eu posso primeiro sentar-me na escrivaninha e escolher eu mesmo a palavra que quero que seja anunciada ou tema a desenvolver, baseando-me nos meus conhecimentos, minhas preferências etc., e depois, uma vez preparado o discurso, me ajoelho para pedir apressadamente a Deus que abençoe o que escrevi e dê eficácia às minhas palavras, uma Ave-Maria, talvez. Já é algo bom, mas não é a via profética. É necessário fazer o contrário. Primeiro, colocar-se de joelhos e perguntar a Deus qual é a palavra que quer dizer; e depois, sentar-se à escrivaninha e fazer uso dos próprios conhecimentos para dar corpo a essa palavra. Isto muda tudo, porque assim procedendo, não é Deus que deve fazer sua a minha palavra, mas sou eu que faço minha a Palavra de Deus! É preciso partir da certeza de fé que, em cada circunstância, o Senhor ressuscitado tem no coração uma palavra sua que deseja fazer chegar a seu povo, em cada circunstância! O Ressuscitado não escreveu somente 07 cartas a 07 Igrejas da Ásia Menor e depois basta. Continua escrevendo cartas, uma carta para cada Igreja, e para cada circunstância. E todas começam da mesma maneira: Assim fala o Ressuscitado, assim fala o Amém, assim fala o Primeiro e o Último. É esta Palavra que transforma as pessoas e é aquela que é preciso descobrir. E o Espírito não deixa de revelá-la ao seu ministro, se humildemente e com insistência a pede.
ZENIT: Como você lida com o problema da inveja, às vezes, tão comum em comunidades de fieis?
Pe. Eugenio: A sua pergunta me fez tornar a mente o que aconteceu a Paulo e Silas. História esta que se conta nos atos dos Apóstolos. Não é inveja, mas desejo de lucro, mas sempre algo que procura dores e provações. Estavam eles cumprindo a ordem de Jesus de anunciar o Evangelho, de proclamar a Boa Nova até os confins da terra. Mas, por um problema de cunho econômico de um casal que tinha uma escrava com um espírito de adivinhação e que Paulo exorciza, se levantam seus amos contra Paulo e Silas e os levam à prisão. Que fazem? Primeiros os desnudam, tiram as roupas e depois os açoitam com varas, lhes infligem muitos golpes e os lançam na prisão, privando-os de sua liberdade e dizendo ao carcereiro que os vigiasse com muito cuidado. E o carcereiro os lançou na parte mais interna da prisão e não somente isso, prendeu seus pés no cepo. E aí Paulo e Silas vão passar toda a noite. Nus, com aquele frio inclemente e na escuridão total, porque estão na parte mais interna da prisão. Atados, encadeados, sem liberdade, julgados injustamente. Aí estão Paulo e Silas. Sofrendo, sem dúvida alguma. Alguém pode imaginar o contrário? Porém, que atitude tinham? Diz-nos os Atos dos Apóstolos, que cantavam louvores a Deus. Qual seria a minha atitude nessa circunstância? Bom, em primeiro lugar, à frente de situações bem mais leves, fiquei aborrecido com o Senhor. Eu teria dito: Senhor, o que está acontecendo? Estou pregando a Tua Palavra e veja o que acontece. Tu me prometeste o cento por um nesta vida e, ao contrário, me açoitaram. Senhor, por obedecer à Tua Palavra estou em uma prisão. Onde está a Tua proteção? Tu prometeste que cuidaria de mim, que estaria comigo, Tu me disseste, Senhor, que ia me proteger dos meus inimigos e olha: açoitado, ferido, meio nu, encarcerado, nas trevas, acorrentado, onde está a Tua proteção, Senhor? Paulo e Silas não eram como eu. Paulo e Silas levantam seus braços, levantam seus corações, levantam suas almas e começavam um louvor, um agradecimento, um hino de glória ao Senhor. E cantam, não ficam somente na oração, estão felizes, estão tão contentes que dentro deles sobe um cântico, uma canção nova e celebram a grandeza de Deus com um hino, talvez com um salmo que entoam com música. Seus olhos, suas atenções não estão centradas neles, estão centrados no poder de Deus. E que oração entoam? Uma oração de louvor! Uma oração de bênção, de celebração da glória do Senhor. Esta é a oração eficaz. Estou ainda longe de tal oração e peço ainda aos leitores para que rezem pela minha conversão.
ZENIT: Você tem acompanhado a situação política do Brasil? Como missionário estrangeiro que você é, qual a sua opinião de tudo o que tem acontecido?
Pe. Eugenio: A política não vai bem em nenhum lugar do mundo. Por isso que o Papa Francisco pediu aos leigos para se interessarem por política. A Política é uma vocação. Don Sturzo e De Gasperi criaram uma Itália democrática e sadia, honesta e trabalhadora. Eram homens de profunda oração. Se a política não é sustentada pela oração, o nosso ativismo social corre o risco de ser uma boa obra que se justifica por si só, enquanto os nossos recursos interiores se extinguem, as fontes de amor secam e devagarzinho nos tornamos iguais à Besta. A oração muda o mundo e o horizonte do possível com Deus. Criar um espaço de relativa liberdade em um mundo congelado por uma necessidade secularizada. Torna operante um novo campo de força, que anteriormente só existia em potência.
Zenit
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