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Foto: Mari Hart |
Trocamos os armários. Com isso, todas as minhas coisas ficaram fora de cabides e gavetas. Uma bagunça sem prazo pra voltar pro lugar. Sacolas de roupa num canto, caixas com itens de festa que sobraram e uma infinidade de objetos pra serem jogados fora ou doados. Eu simplesmente não conseguia mexer naquelas coisas. Não conseguia por falta de tempo e desânimo também. Tentei, nessa manhã, colocar as coisas que estavam espalhadas nas prateleiras do meu quarto no lugar.
Guardei o cofrinho do mais velho.
Artur subiu na cadeira de rodinhas e tive que ir lá socorrer.
Guardei o nebulizador.
Artur quis mamar.
Guardei uma papelada.
Olhei na Internet minha conta do banco. Um cartão que não solicitei pra ser cancelado.
Droga. Mais uma coisa.
Limpei o nariz escorrendo do menino.
Ligação pro banco. Dá-lhe musiquinha.
Artur no meu pé me chamando.
Peraí, filho. Vai lá com vovó um pouquinho.
Paro. Dou colo.
Ligação vai pro beleléu.
Ligo de novo. Consigo. Cancelo o cartão.
Cocô. Limpo, lavo as mãos, beijo.
Ligo pro pediatra pra tentar uma consulta pra hoje ainda.
"Mamãe, mamãe!" - Ele me chama pra ver o ônibus vermelho.
Ligo o computador. Oba! Venda na loja.
Tento digitar umas notas de alunos e não consigo.
Artur quer desenhar comigo. Deito na cama com ele e desenho um macaco e um cachorro.
Fica feliz, ri e desenha umas bolinhas.
Arrumo mais umas coisinhas:
um biquíni que não cabe mais, uma canga velha, um baby doll rasgado- tudo pro lixo.
Quer colo.
Chamo ele de mamão e de banana e finjo que tô mordendo o pescocinho.
Gargalhadas. Colo. Cheiro bom de cangote de neném.
E assim a manhã voa. Nada muito arrumado, quase nada pro lugar, um sentimento de fracasso que ainda tá aqui. Nem arrumar umas sacolas eu consigo! Imagina voltar pro mestrado... Finjo que não ligo simplesmente porque não posso deitar na minha cama e curtir minha chateação sozinha e em silêncio. Lembro que tenho que ir ao médico, ao cartório, à dentista, à escola de Caio. Parece que as coisas se acumulam na minha vida e eu não dou conta. Parece, não. Não dou conta. Mesmo. E sempre tem alguém pra apontar o dedo e dizer o quanto sou preguiçosa, desorganizada e que não faço as coisas porque não quero.
Afinal...
A culpa é minha. Quem mandou amamentar? Dar mamadeira é mais prático.
A culpa é minha. Quem mandou não deixar na frente da TV?
A culpa é minha. Quem mandou não querer dar papinha industrializada?
A culpa é minha. Quem mandou dar colo? Agora, aguenta.
A culpa é minha. Quem mandou não contratar uma babá ou deixar na creche?
E eu sigo em frente nesse dia nublado só porque tenho dois branquelos que precisam de mim, da minha energia, da minha dedicação e dos meus abraços.
Se eu não cuido, todo mundo nota.
Se eu cuido, ninguém nota.
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