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Jornada tem como tema: 'Não amemos com palavras, mas com obras'
Os pobres são os protagonistas da história da salvação.
Por Élio Gasda*
A Igreja realiza, de 12 a 19 de novembro, a primeira Jornada Mundial dos Pobres, com o tema: “Não amemos com palavras, mas com obras”. Os pobres são os protagonistas da história da salvação. Negar sua eminente dignidade na Igreja seria uma heresia. João Paulo II alertou: na fidelidade aos pobres a Igreja põe em cheque sua fidelidade a Cristo (Laborem exercens, n.8).
A missão principal da Igreja é a evangelização dos pobres. No entanto, em muitas situações, a evangelização tem sido praticada a partir da opção pelos ricos e seus interesses. Sua mensagem e estrutura têm sido configuradas a partir dos poderosos. A suntuosidade clerical imita o luxo da realeza medieval. Neste modelo, os ricos têm toda a preeminência. Igreja de ricos que pratica caridade assistencial aos pobres. Defensores da vida, ocupados em condenar o aborto, mas totalmente alheios às milhares de vidas humanas abortadas pelo flagelo da fome, da miséria, da violência, da opressão, do desemprego, do tráfico de pessoas, da escravidão. “A pobreza é fruto da injustiça social, da miséria moral, da avidez de poucos e da indiferença generalizada”!
Como é possível que uma fé que, desde o Antigo Testamento trazia uma carga profética a favor dos oprimidos e que em Jesus de Nazaré se converteu em manifestação explícita em favor dos pobres, possa ser reduzida a sustento ideológico dos ricos? Como uma mensagem subversiva foi transformada em respaldo divino da ordem estabelecida?
Em preparação ao Dia Mundial dos Pobres (19), o Papa Francisco, em Mensagem publicada para a ocasião, exorta: “Quem pretende amar como Jesus amou, deve assumir o seu exemplo, sobretudo no amor os pobres. Enquanto sobressai cada vez mais a riqueza descarada que se acumula nas mãos de poucos privilegiados, frequentemente acompanhada pela ilegalidade e a exploração ofensiva da dignidade humana, causa escândalo a extensão da pobreza a grandes setores da sociedade no mundo inteiro. Perante este cenário, não se pode permanecer inerte e, menos ainda, resignado”.
A imensa maioria da humanidade vive não só na pobreza, mas, também, na mais absoluta miséria. Essa situação, em grande parte, é provocada por um sistema julgado como pecado, porque nenhum outro mal é mais nocivo aos seres humanos. É a negação maior da vontade de Deus. “Eu, o Senhor, que sou o primeiro, estou com os últimos” (Is 41,4). Falsificar essa imagem de Deus é a pior das heresias.
Deus está em Jesus. Vendo como Jesus atuou saberemos o que agrada a Deus e o que Deus rejeita. A grande preocupação de Jesus era se as pessoas tinham fome, estavam doentes ou eram discriminadas. O capítulo 25 de Mateus é um ensinamento de fé. Seremos julgados pela maneira como reagimos diante de Deus presente no faminto, no sedento, no desnudo, no estrangeiro, no prisioneiro, no enfermo. O critério principal de salvação ou de condenação será aquilo que se faz ou que se deixa de fazer aos pobres (Mt 25,31-46).
Este Deus escandaliza. “Se alguém possui bens deste mundo e, vendo seu irmão passar necessidade, não o socorre, não pode estar nele o amor de Deus” (1Jo 3, 17). A riqueza é o maior obstáculo para comprometer-se com Jesus (Lc 6, 20-26). Impossível colocar outro senhor ao lado de Deus (Lc 15, 13; Mt 16, 24). A heresia consiste em ter a Deus como o senhor dos ricos, um Deus que legitima a acumulação da riqueza e que abandona os fracassados. “Os fariseus que amavam o dinheiro, riam-se de Jesus” (Lc 16, 14).
Pobre é todo aquele que carece de bens materiais fundamentais. Há ricos “porque” há pobres e há pobres “porque” há ricos. Se as pessoas estivessem em nível semelhante de subsistência, não haveria pobres. Pobre é todo indivíduo despossuído do que deveria ter por direito: dignidade, trabalho, liberdade, participação do destino comum dos bens da terra. Esses pobres são os preferidos de Deus. O problema dos pobres é problema de Jesus (Lc 4, 16-30). São os primeiros no Reino de Deus.
O que importa para Jesus é a vida do povo. Servir aos pobres é "um imperativo que nenhum cristão pode desconsiderar. Se queremos encontrar Cristo de verdade, devemos tocar seu corpo nos corpos dos pobres em sofrimento em resposta à comunhão sacramental concedida na Eucaristia", afirma Francisco. "O Corpo de Cristo, quebrado na sagrada liturgia, pode ser visto através da caridade e do compartilhamento, nos rostos e nas pessoas mais vulneráveis de nossos irmãos e irmãs" (Mensagem para Dia Mundial dos Pobres). Acolher o pobre é viver a essência do Evangelho.
*Élio Gasda é doutor em Teologia, professor e pesquisador na FAJE. Autor de: Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja (Paulinas, 2001); Cristianismo e economia (Paulinas, 2016).
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