sábado, 1 de setembro de 2018

Fora do diálogo, não haverá religião

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O pressuposto para o diálogo é a postura de abertura para a escuta do outro.
O certo é que, de todo diálogo, saímos com a consciência mais expandida.
O certo é que, de todo diálogo, saímos com a consciência mais expandida. (Reprodução/ Pixabay)
Por Felipe Magalhães Francisco*

O título soa sensacionalista, bem sei. Mas, no mundo plural em que adentramos – de modo, ao que parece, definitivo –, essa é uma verdade: fora do diálogo, as religiões não subsistirão. No cenário atual em que vivemos, o pêndulo está pendido ao conservadorismo e ao reacionarismo, mas não permanecerá. Tal postura, no mínimo defensiva, é uma resposta reativa ao próprio do tempo em que experimentamos e que ainda não sabemos bem o que significa. Uma fala que talvez expresse bem esse cenário atual é o do filme O fabuloso destino de Amelie Poulain: “São tempos difíceis para os que sonham”. Um dos caminhos mais frutíferos para lidarmos com essa mudança de época é, justamente, uma postura dialogal com o mundo e as realidades cada vez mais plurais.

As religiões e tradições religiosas têm um papel fundamental nesse novo cenário. Como grandes influenciadoras do imaginário sociocultural das pessoas, elas podem desenvolver um papel transformador na propiciação de uma cultura que seja a do diálogo e a do encontro entre os diferentes. Os discursos de bondade, paz, amor e justiça, bastante comuns nas religiões, alcançam um lugar possível quando essas mesmas tradições se dispõem ao diálogo, na proposta da construção de um mundo novo possível. Diálogo, vale dizer, que seja entre elas próprias, e com as demais realidades sociais que compõem o universo da cultura.

O pressuposto para o diálogo é a postura de abertura para a escuta do outro. Escuta que necessita do abandono de toda e qualquer atitude defensiva. Dialogar para conhecer melhor o outro e, com isso, a nós mesmos. Convencionou-se, no senso comum, que o diálogo necessita que um dos interlocutores saia convencido pela posição do outro. Isso é uma falácia. No entanto, o verdadeiro diálogo nos coloca em risco. Num saudável risco, importa ressaltar: o risco de sairmos melhores. Algumas vezes, como fruto desse diálogo, pode mesmo ser que mudemos de ideia e posição. O certo é que, de todo diálogo, saímos com a consciência mais expandida. Esse é o verdadeiro risco.

Com o artigo de Daniel Couto, O diálogo como característica humanizante, somos chamados a refletir a respeito da importância da linguagem para a constituição humana, numa perspectiva antropológico-filosófica. A partir dessa perspectiva, o autor nos conclama à reflexão a respeito do diálogo, levando em conta seus pressupostos, chamando atenção, ainda, para os riscos do fundamentalismo, tão propícios nos tempos hodiernos.

O diálogo como futuro das religiões é o artigo proposto por Fabrício Veliq, no qual aborda a importância de uma postural dialogal e aberta das religiões, como pressuposto fundamental para a sobrevivência das tradições religiosas. Tal postura dialogal não significa uma ameaça para a questão identitária, mas abre à possibilidade de uma melhor depuração das tradições.

Numa perspectiva eminentemente cristã, César Thiago do Carmo Alves chama atenção, no artigo Cristianismo e o diálogo ao qual não se deve esquivar, para a história do cristianismo, levando em conta os apelos ao diálogo que, desde os primórdios, se apresentaram e que continuam se apresentando. Exemplificando temas incandescentes, próprios de nossa contemporaneidade, o autor chama a atenção para a postura dialogal do cristianismo, que não deve deixar de ser responsável, na leitura que faz da realidade e dos temas que dela emergem.

Boa leitura!

*Felipe Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). E-mail: felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.

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