domingo, 17 de março de 2019

A Transfiguração: escutar Jesus

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Reflexão sobre o Evangelho do II Domingo da Quaresma - Lc 9,28-36
Afresco da Transfiguração de Jesus em estilo bizantino em teto de Igreja Ortodoxa.
Afresco da Transfiguração de Jesus em estilo bizantino em teto de Igreja Ortodoxa. (Reprodução/ Pixabay)
Por José Antonio Pagola*

Os cristãos de todos os tempos foram atraídos pela cena tradicionalmente chamada “a transfiguração do Senhor”. No entanto, para os que pertencemos à cultura moderna, não é fácil penetrarmos no significado de uma história, escrita com imagens e recursos literários, típicos de uma “teofania” ou revelação de Deus.

No entanto, o evangelista Lucas introduziu detalhes que nos permitem descobrir com mais realismo a mensagem de um episódio que muitos hoje acham estranho e inverossímil. Desde o início indica que Jesus sobe com seus discípulos mais próximos ao topo de uma montanha simplesmente “para rezar”, não para contemplar uma transfiguração.

Tudo acontece durante a oração de Jesus: “Enquanto ele estava a orar, a aparência de seu rosto mudou”. Jesus, profundamente recolhido, acolhe a presença de seu Pai e seu rosto muda. Os discípulos percebem algo da sua identidade mais profunda e oculta. Algo que eles não conseguem entender na vida cotidiana de cada dia.

Na vida dos seguidores de Jesus não faltam momentos de clareza e certeza, de alegria e de luz. Ignoramos o que aconteceu no topo daquela montanha, mas sabemos que na oração e no silêncio é possível vislumbrar, a partir da fé, algo da identidade oculta de Jesus. Essa oração é fonte de um conhecimento que não é possível obter dos livros.

Lucas diz que os discípulos mal entenderam, pois “caíam de sono” e só “quando acordaram” captaram algo. Pedro só sabe que ali se está muito bem e que essa experiência nunca deveria terminar. Lucas diz que “não sabia o que dizia”.

Por isso a cena culmina com uma voz e um mandato solene. Os discípulos estão envoltos numa nuvem. Assustam-se, pois tudo aquilo os supera. No entanto, dessa nuvem sai uma voz: “Este é o meu Filho, o escolhido. Escutai-O”. Ouvir deverá ser a primeira atitude dos discípulos.

Os cristãos de hoje precisam urgentemente “interiorizar” a nossa religião se quisermos reavivar a nossa fé. Não basta ouvir o Evangelho de forma distraída, rotineira e gasta, sem qualquer desejo de escutar. Não basta tampouco ouvir de forma inteligente, apenas preocupado em entender.

Precisamos ouvir Jesus vivo no mais íntimo do nosso ser. Todos, pregadores e pessoas fiéis, teólogos e leitores, precisamos escutar sua Boa Nova de Deus, não desde fora, mas desde dentro. Deixe que suas palavras desçam das nossas cabeças até ao coração. A nossa fé seria mais forte, mais alegre, mais contagiante.

IHU

*José António Pagola é padre e tem dedicado a sua vida aos estudos bíblicos, nomeadamente à investigação sobre o Jesus histórico. Nascido em 1937, é licenciado em Teologia pela Universidade Gregoriana de Roma (1962), licenciado em Sagradas Escrituras pelo Instituto Bíblico de Roma (1965), e diplomado em Ciências Bíblicas pela École Biblique de Jerusalém (1966). Professor no seminário de San Sebastián (Espanha) e na Faculdade de Teologia do Norte de Espanha (sede de Vitória), foi também reitor do seminário diocesano de San Sebastián e vigário-geral da diocese de San Sebastián.

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