Investigação espera que empresas brasileiras e estrangeiras devolvam os valores.
Protestos contra o cartel chega às ruas. (Foto: Arquivo) |
Por Afonso Benites*
O Ministério Público de São Paulo está tentando fazer com que um grupo de sete empresas brasileiras e internacionais admitam que lesaram os cofres públicos paulistas em até 875 milhões de reais. A suspeita do promotor Marcelo Milani, que conduz a investigação, é de que essas companhias se uniram em um cartel para obter dez contratos públicos de reforma e modernização de 98 trens que circulam na rede do Metrô da cidade de São Paulo.
Os acordos foram firmados entre 2008 e 2010 durante a gestão do então governador José Serra (PSDB), uma das principais lideranças da oposição ao PT no Brasil e que já perdeu duas eleições presidenciais.
A ofensiva da Promotoria do Patrimônio Público ocorre no momento em que a diretoria do Metrô decidiu acatar uma recomendação e suspender por 90 dias todos os contratos de reforma que ainda estão em andamento.
Nos próximos três meses o promotor quer ouvir os representantes das empresas brasileiras Tejofran, Iesa e MPE Montagem e Projetos especiais, além das estrangeiras Alstom (francesa), Siemens (alemã), Bombardier (canadense) e Temoinsa (espanhola) para tentar identificar as irregularidades e descobrir qual foi o prejuízo exato. “Precisamos calcular o quanto exatamente já foi pago para essas empresas e quanto ainda será pelos trens que estão sendo reformados”, afirmou Milani.
Conforme o promotor, os conglomerados formados por essas empresas já reformaram 36 trens das linhas 1-azul e 3-vermelha. Outros dez veículos estão sendo reformados e há ainda 42 à espera da modernização. Caso as empresas admitam a formação do cartel, o promotor diz que vai firmar um Termo de Ajustamento de Conduta no qual cada companhia se comprometerá a devolver os recursos a mais que receberam. Agora, se elas não admitirem a culpa, o promotor ameaça mover um processo judicial no qual vai pedir inclusive a dissolução de todas essas companhias no Brasil.
Trem fantasma
No contrato inicial, conforme Milani, houve uma divisão da prestação dos serviços em quatro lotes. Não houve disputa no processo licitatório. Cada conglomerado (formado por até três das empresas citadas) ficou com um lote. E é justamente por isso que surgiu a suspeita da formação do cartel. Documentos obtidos pela promotoria demonstram executivos das empresas tratando dos valores que cobrariam do governo para a reforma dos veículos.
De acordo com o promotor, os trens que já foram modernizados apresentaram falhas ao ter implantado um novo sistema no qual o veículo poderia ser guiado à distância, sem a presença de um maquinista. “Os próprios diretores do Metrô disseram que esse trem sumia do painel na central de operações. Eles não eram mais encontrados no sistema e acabaram dando a ele o apelido de trem fantasma”, afirmou. Esse erro vem sendo corrigido, diz ele.
Outro problema é o que Milani chamou de aumento injustificado no valor do contrato inicial. Saltou de cerca de 1,66 bilhão de reais para 2,5 bilhões de reais. É daí que foi feito o cálculo genérico do tamanho do rombo aos cofres públicos. Em nota, o Metrô contestou essa informação e disse que a quantia exata do contrato é de 1,7 bilhão de reais. Além disso, a companhia afirmou que a suspensão dos contratos foi uma forma de colaborar com as investigações do Ministério Público e de exigir o ressarcimento de eventuais prejuízos ao erário.
Questionado se há indícios de participação de alguma autoridade na irregularidade, Milani disse que nada veio à tona até o momento. Essa investigação dura quase dois anos e, ao menos por enquanto, não foi constatado o pagamento de propina a políticos ou dirigentes de órgãos públicos para facilitar a realização do esquema.
* Afonso Benites é colaborador em São Paulo do El País, onde esta reportagem foi originalmente publicada.
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