quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O Rio de Janeiro não merece vaia

Abre a porta e a janela e vem ver o sol nascer. O Rio só merece aplausos.

Por Ricardo Soares*

Abre a porta e a janela e vem ver o sol nascer. Melhor se for no Rio de Janeiro. Mais uma vez evoco a cidade solar para não me ensimesmar dentro de um dia nublado que se forma dentro de mim. Pulverizo nuvens ouvindo um grupo vocal cantando “Wave” lindamente. Jobim e essa música são a cara do Rio. Como o sanduíche do Cervantes ou o negrone da Fiorentina ou até paixões mais frugais como andar descalço sobre as lendárias areias de Copacabana.

Voltando do Rio de Janeiro , dentro do avião , ouço um menino perguntar ao seu pai : “ Tel- Aviv fica no Japão ?”. Imerso na sempre presente idiotia celular, manipulando seus dados enquanto o filho cresce, o sujeito não soube ou não quis responder. Talvez pense que Tel- Aviv seja uma marca de camiseta pólo ou uma grife russa de relógios. Ao ver a cena sempre penso que idiotas não deveriam ser pais e que idiotas não deviam passar férias no Rio de Janeiro. Que maldade a minha.

O Rio é tão lindo e tão Rio que até do cemitério São João Batista ele fica bonito. Em março perdi um colega querido e no seu sepultamento fiquei observando as árvores ganhando galhos e troncos e subindo as encostas; a natureza a embelezar os túmulos. Lá de longe, de cima, vi uma iguana humana a perscrutar entre os vivos, senhora de maus bofes que até se humanizava no meio de tanta beleza. Até a hipocrisia fica mais leve no Rio. A iguana humana em vida prejudicara o morto. Mas lá estava em seu velório para aquecer seu sangue frio com o calor dos vivos cariocas.

Levanta-te e caminha que o Rio foi feito pra ser visto a pé. Andando sempre apesar do perigo. Parando no Amarelinho, na Adega Perola , no trapiche da Gamboa, engolindo o chopp mais gelado, degustando a feijoada mais completa entre o morro Dois Irmãos, Chapéu Mangueira ou em qualquer entorno de comunidade onde a idade não tem importância. Deixe-se levar pelo batuque caricato do samba para turistas. Desarme-se de preconceitos e aceite o preço que te cobram por uma canga fajuta na beira da praia. O Rio meus amigos não merece vaia. Merece sempre aplausos. Abre a porta e a janela e vem ver o sol se por.
* Ricardo Soares é diretor de TV, escritor, roteirista e jornalista. Titular do blog Todo Prosa (www.todoprosa.blogspot.com) e autor, entre outros, dos livros Cinevertigem, Valentão e Falta de Ar. Atualmente diretor de Conteúdo e programação da EBC- Empresa Brasil de Comunicação.

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