É um Woody Allen mais sombrio e bergmaniano o que se apresenta aqui.
Apesar do negativismo, ele não deixa de entusiasmar alguns de seus alunos, especialmente Jill Pollard (Emma Stone).
Por Neusa Barbosa
A poucos meses do 80º aniversário (que acontece em dezembro), Woody Allen volta ao seu lado dostoievskiano, colocando uma situação de crime e castigo no centro de seu novo filme, “Homem Irracional” – que não é uma comédia e sim um suspense dramático.
Colocando em primeiro plano seus constantes questionamentos sobre o (pouco) sentido da vida, o diretor-roteirista elege como protagonista um professor de filosofia desiludido com tudo, Abe Lucas (Joaquin Phoenix). Ele não acredita mais no valor da própria especialidade, nem que seu trabalho pode fazer qualquer diferença na vida de seus alunos. Ele perdeu o entusiasmo pelo amor, o sexo, o engajamento social e político e a experiência sensorial com as drogas. Ele já tentou tudo, agora lhe sobrou o niilismo mais extremado.
Ainda assim, ele não contempla o suicídio. No momento em que a história começa, Abe está se dirigindo a um novo emprego, no campus de uma universidade perto de Newport. Verdade que não deixa de estar flertando com o perigo, ao dirigir e beber ao mesmo tempo. Chega ao novo posto visivelmente embriagado mas, ainda assim, consegue disfarçar e assume o cargo.
Apesar do negativismo, ele não deixa de entusiasmar alguns de seus alunos, especialmente a melhor deles, Jill Pollard (Emma Stone). A moça, que é inteligente e luminosa, vai se apaixonando por este cético irremediável – que, apesar de sentir-se atraído, resiste ao envolvimento com ela, que tem um namorado, Roy (Jamie Blackey). Pragmático, Abe prefere ceder à insistência de uma colega, a professora Rita (Parker Posey), casada e insatisfeita.
O tédio residual destas vidas é abalado pelo acaso – um fator constantemente invocado de várias maneiras nas histórias de Woody Allen. Assim, uma conversa entreouvida sem querer numa lanchonete, por Abe e Jill, dá ao professor uma ideia terrível, mas que tem por objetivo ajudar a mulher desconhecida, cujas queixas os dois ouviram.
O plano de Abe envolve o assassinato de uma pessoa para ele desconhecida, que supostamente está prejudicando seriamente a vida da mulher cujas queixas ele ouviu. A obsessão que ele desenvolve em torno dessa ideia torna-se o epicentro da história, desencadeando situações cada vez mais tensas.
Nesse ponto, Woody Allen joga com os sentimentos do espectador à medida que se desenrolam as atitudes de Abe – como aconteceu, também, em filmes anteriores do diretor que lidaram com temáticas semelhantes, caso de “Crimes e Pecados” (89) e dos recentes “O Sonho de Cassandra” (2007) e “Ponto Final: Match Point” (2005).
É um Woody Allen mais sombrio e bergmaniano o que se apresenta aqui, menos engraçado também. Mas, ainda assim, especialmente ao lidar com as intervenções do acaso sobre os mais rígidos planejamentos humanos, muito, muito irônico – e impregnado por um tremendo humor negro.
Reuters
Nenhum comentário:
Postar um comentário