terça-feira, 22 de setembro de 2015

Vídeos de 1990 geram polêmica após arrastões: 'Rio não mudou', diz diretor

'Os pobres vão à praia' foi exibido há mais de 2 décadas na TV Manchete.
Reportagem é compartilhada em redes sociais e fomenta discussões.

Gabriel BarreiraDo G1 Rio

'Os pobres vão à praia' foi compartilhado milhares de vezes após arrastões, 20 anos depois de ser exibido na TV Manchete (Foto: Reprodução/Comalt)'Os pobres vão à praia' foi compartilhado milhares de vezes após arrastões, 20 anos depois de ser exibido na TV Manchete (Foto: Reprodução/Comalt)
Pulando pela janela do ônibus, surfando na porta, batucando na lataria, dezenas de pessoas embarcam do subúrbio do Rio rumo a orla da área nobre na base do "calote". As cenas são de episódios do programa Documento Especial, que foram compartilhadas milhares de vezes nos últimos dias após um final de semana de arrastões. Não fosse a imagem pixelada, odocumentário gravado há mais de 20 anos poderia parecer de hoje.
Não pode tirar o pessoal do Méier (...) e levar à praia em Copacabana porque não posso conviver com uma pessoa que não tem o mínimo de educação"
Jovem entrevistada pelo programa
Documento Especial, na década de 90
No episódio "Os pobres vão à praia"prevalecem opiniões de banhistas da Zona Sul que atacam os "forasteiros". "Sub-raça", diz uma das entrevistadas diante de uma frase que passeia pela tela e avisa: "Cenas de preconceito explícito". A suposta autora da fala, 25 anos depois, se pronunciou em uma rede social e se disse arrependida, dizendo que era alienada (veja abaixo). Na internet, as imagens do passado são comparadas a tumultos recentes, com recolhimento de menores emônibus e a atuação de justiceiros.
Nelson Hoineff era diretor do programa "Documento Especial", no qual a reportagem foi exibida no início da década de 90, na extinta TV Manchete. Ele diz que não imaginava o tom premonitório do minidocumentário, mas "sabia que estava fazendo história". O programa, segundo ele, "mostrava um Brasil que não se via na televisão" e que, em certos aspectos, é o mesmo de décadas atrás.
"A gente vê que o Rio não mudou nada. Fizemos programas sobre arrastão, sobre a guerra social, sobre todos esses fenômenos que acontecem, a luta do tráfico, a corrupção dentro da polícia. Algumas pessoas acham que isso começou hoje, mas isso está há dezenas de anos e o documentário é o testemunho disso", afirma.
A caixa de e-mails da produtora autora da reportagem, diz Nelson, lotou. Ele pretende ressucitar os episódios para que, televisionados, discutam questões cíclicas da sociedade — da segurança pública à prostituição.
Cena do episódio Os Pobres Vão À Praia, de 1990 (Foto: Reprodução/Comalt)Cena do episódio Os Pobres Vão À Praia, de
1990 (Foto: Reprodução/Comalt)
Entrevistada diz que era 'alienada'
Identificando-se como uma das entrevistadas do programa, uma advogada usou as redes sociais para se retratar. No vídeo, ela chega a dizer que o público da praia era uma "sub-raça".
Em um longo texto recente, diz que era "alienada" e que tem orgulho de ter evoluído. "É importante jogar na cara da sociedade o que ela não quer dizer" (veja o desabafo na imagem ao final desta reportagem).
Apesar da autocrítica, ela diz que o vídeo foi editado para "parecer pior do que é". Na reportagem, a jovem (que teria 18 anos na época, e hoje, 47) apoiava a cobrança de ingresso para entrada na praia. "Não pode tirar o pessoal do Méier, do mangue e levar à praia em Copacabana porque eu não posso conviver com uma pessoa que não tem o mínimo de educação. (...) É sujeira você pegar uma pessoa que mora em Ipanema, uma pessoa bem vestida, legal, que tem educação e colocá-la na praia no meio de um monte de gente que não tem educação, que vá dizer grosseria, que vai comer farofa com galinha. Vai matar as pessoas de nojo".
Outro entrevistado concorda. "Não sou contra pobre, nem nada. Mas venho para a praia no Pepê (na Barra da Tijuca) porque estou junto dos meus". O G1 tentou contato com a autora dos comentários, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
Mulher que se identifica como entrevistada diz que 'evoluiu' e era 'alienada' (Foto: Reprodução/Facebook)Mulher que se identifica como entrevistada diz que 'evoluiu' e era 'alienada' (Foto: Reprodução/Facebook
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